Eu também sei escrever textos à moda da Helena Matos(*)

• «1. A Igreja é boa se for conservadora. O Tribunal Constitucional é bom se for pelo governo. O Papa é bom se for neoliberal. Cavaco Silva nunca é liberal mas às vezes tem umas intermitências em que apoia os liberais e nesses fugazes momentos deixa de ser "Cavaco" para ser senhor Presidente da República. Mas só nesses!
• 2. A ‘troika' até às eleições de 2011 era má porque ia manter o governo em funções numa nova etapa sem desenvolvimento que graças a um choque austeritário colocaria Portugal na última linha das nações mais recuadas.
• 3. A ‘troika' a partir das eleições de 2011 é boa porque nos impõe uma austeridade que fomenta o desenvolvimento económico e social que o País aliás registará depois da sua partida. Assim o fim da intervenção da ‘troika' em Portugal deve ser referido como continuação e todo o liberal conservador acredita que após esse dia o Estado português não só pode como deve voltar a cortar em despesas sociais como fez desde 2011.
• 4. No passado as reformas não foram feitas porque os líderes políticos preferiram ganhar votos a salvar o País e os mercados. No presente as reformas podem ser feitas porque são feitas à bruta, com cortes direccionados e selectivos. No futuro já vamos a tempo de fazer as reformas porque no passado - que por sinal é o nosso presente - houve homens que tiveram coragem de dizer que só estavam a obedecer à tróica. Em resumo, o presente nunca é o tempo errado para fazer reformas (ou o que quer que seja, futuro passado ou pretérito futuro) mas quando o presente se torna passado é óbvio que estamos no futuro (como nos filmes). Se houve homens, claro! (Confesso que esta conversa sobre homens me parece um pouco guei para não dizer macaca!)
• 5. Quem pensa como os conservadores liberais são pessoas muito inteligentes, muito amigas dos pobres e naturalmente com certificado de anti-comunismo e de lídimos defensores da banca e da competitividade. Em certos graus de liberalismo conservador até se chega ao estatuto de pai da banca, da eurocracia ou do «monstro». Quem não concorda com os liberais conservadores são pessoas atrasadas, esquerdistas e analfabetas porque mesmo que saibam ler não retiram a devida mensagem do que lêem e naturalmente são estéreis em matéria de paternidades honoris causa.
• 6. A igualdade é um espinho cravado no coração dos liberais. Se formos todos igualmente miseráveis não há problema algum (desde que os ricos continuem ricos). Mas haver tantos pobres como ricos isso é uma afronta. Para alguns liberais mais conservadores a pobreza resolve-se com a caridade dos ricos que assim podem escolher quem continua pobre e quem fica remediado (ou, mais provavelmente ainda, mandar os pobres emigrar para outro lado). Outros liberais mais pragmáticos propõem um regime alternado: às segundas, quartas e sextas diz-se mal dos pobres que não querem trabalhar, às terças, quintas e sábados despedem-se uns tantos e baixam-se os salários aos outros. Aos domingos descansam, que o liberalismo agora anda beato.
• 7.Todos os dias o liberal tem de falar de dinheiro, acompanhando a palavra "dinheiro" de uma espécie de movimento dos músculos faciais como se estivesse a pronunciar a palavra "armas de destruição maciça" nos tempos de Bush (fazer esgar). Depois veio Obama, o homem que ia fazer uma espécie de sistema de saúde (pausa para fazer ar indignado) que por acaso até fez mas isso não interessa nada. Até à eleição de um presidente republicano, claro.
• 8. Se o povo não faz aquilo que os liberais mandam tal deve-se ao facto de o povo ser preguiçoso e já não conseguir mover-se ou de estar intoxicado de socialismo e não ir para o mercado por preconceito. Mas nunca, jamais, em tempo algum por discordar dos liberais conservadores, pois a essência do conservadorismo liberal radica na transmigração das almas: a alma do povo comunica com as mentes conservadoras liberais (e apenas com estas) e diz-lhes o que quer, sente e deseja. Quanto às outras almas, a sua natureza iliberal condena-as à partida ao inferno da bruteza, embora algumas consigam redimir-se, particularmente se tiverem sido maoístas pois nesse caso basta-lhes repetir o que na década de 70 do século passado diziam sobre a democracia e ficam automaticamente liberais conservadoras.
• 9. Estão momentaneamente autorizados a celebração do 25º de Abril e o abuso de impostos elevados que noutros tempos seriam coisa de gente muito socialista mas agora ficam assim a meio caminho entre a esquerda banqueira e a direita neoliberal que trocou a Mocidade Portuguesa pela JSD.
• 10. Discordar dos princípios atrás enunciados é sinal inequívoco de anti-liberalismo, atitude que em Portugal equivale a pecado bloguisticamente mortal. Amen. Shalom. Inchalá. Caldo verde com bananas.»

(*) E as crianças de doze anos também (desconfio).