sábado, 4 de outubro de 2008

Uma questão política

Tenho imensa vergonha de Portugal ter demorado 30 ou 40 anos a descriminalizar o aborto e ainda não ter querido discutir publicamente os crimes da Inquisição, da guerra colonial, do anti-semitismo e do racismo e xenofobia que envenenam a democracia e a vida das minorias no nosso triste país.

Os políticos, geralmente trogloditas sem coluna vertebral, deixam essas discussões para o foro privado, entre grupos de sociólogos obscuros que aparecem na televisão às duas da manhã, nos programas dos últimos jornalistas civilizados que ainda resistem à invasão neo-liberal.

E eu, que ontem vi um grupo de desgraçados sem mais nada que os próprios braços aplaudir a piedade lapuz da dona Sarah Palin (depois dela jurar na televisão defender os ricos e só os ricos), lembrei-me duma coisa que li uma vez, talvez do Saint Exupéry, sobre os miseráveis que só sobrevivem na miséria.

Desculpem-me a franqueza, mas acho que depois do dia 10 teremos de concordar todos com uma coisa: os homossexuais filiados ou eleitores do P'S' ganham o direito a serem desprezados e tratados como semi-cidadãos pela direita católica.

Identificados com os opressores, incapazes de compreenderem conceitos elementares como liberdade e tolerâcia, renunciando a lutar pelos próprios direitos, passam a merecer-me o mesmo respeito que os hipócritas do PP e da ICAR, que preferem passar a vida escondidos, miseráveis, culpados de um crime que não devia ser crime, promotores duma mentira abjecta, defensores passivos da brutalidade e da repressão dos babuinos da extrema-direita. A partir do dia 10 estou-me completa e absolutamente nas tintas para os direitos deles.

16 comentários :

Anónimo disse...

Essa gente é sadico-masoquista e,gostam.Ohoh,se gostam!São católicos,xoxiais desmocratas,xuxas,desmocratas crixtãos e depois,são enrabados a toda a força pelos portas,socrates,cavacos e toda a gama de vendedores da cobra,até pelo santana lopes esse expoente máximo do que é um ome de estado(letra pikinina,mas muito pikenina).Essa pessoas marcadas pelo estigma social normativo do sistema burguês,vão a correr votar no portas que ao q dizem é uma bicharoca do pior e beata ao mesmo tempo,lembrando aquela escória americana dos evangelistas q depois são apanhados a levar com ele,ou a comer meninas.Tou farto,farto desta gente-razão tinha Maquiavel:cada povo tem aquiloque merece!

Anónimo disse...

este post é ridículo!

Pedro Fontela disse...

Filipe Castro,

Aí pelos states deve óptimos exemplos disso nos logcabin republicans e outros grupos de minorias que aspiram à "ortodoxia" americana... chamar a atenção para os factos ajuda a dissuadir esses grupos?

Zeca Portuga disse...

Por acaso não deiza de ser interessante o paraleleismo entre a inquisição e o aborto em Portugal - é que, num simples ano de aborto livre, já mataram mais inocentes do que a inquisição - mais muito mais (talvez uma 20 vezes mais!)

João Vasco disse...

E o preservativo que o Papa critica, quantos indivíduos é que não vão nascer devido à decisão assassina de o usar?

Pior que isso é a decisão de ir para freira, que corresponde ao crime de ficar 2 anos sem ter filho várias vezes consecutivas.

A quantidade de "pessoas em potência" que estão a ser mortas nesses massacres e inacreditável.

João Vasco disse...

está, digo.

Anónimo disse...

Bom bom era liberalizar completamente o aborto até à véspera do nascimento. Afinal de contas, que direitos tem aquela coisa, aquele conjunto de células?

João Vasco disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
João Vasco disse...

O "conjunto de células" vai-se transformando GRADUALMENTE numa pessoa. Por isso é que não faz sentido comparar um ovo a um ser humano como se fossem a mesma coisa. Não é uma coisa que aconteça de um momento para o outro, muda lentamente de dia para dia.

A fronteira podia não estar nas 12 semanas, podiam ser mais ou menos 2, não existe uma fronteira clara. O homicídio só acontece depois do nascimento, claro, que torna a moldura penal mais clara. Mas abortar na 1ª semana, ou no dia seguinte é diferente de fazê-lo poucos dias antes do nascimento.

Uma pessoa é mais que um ADN.

Anónimo disse...

"não existe uma fronteira clara"

Então está a ver o problema de a definir, legalmente. Espero bem que daqui a muitos e muitos anos não se venha a "descobrir", tal como aconteceu com os negros na escravatura, que, afinal, ás 12 semanas já se é pessoa...
A mim só me transtorna a altivez de quem não admite que possa estar errado no que toca ao momento a partir do qual o embrião passa a ter direitos...

E, concerteza, uma pessoa é mais que ADN. Mas definir quando se é pessoa pode ser um exercício muito difícil... Um individuo comatoso é uma pessoa?

Perceba que a questão do aborto não está na dicotomia ICAR/pró-escolha. A grande questão do aborto está em definir, enquanto sociedade, a partir de que momento aquela vida tem direitos. E entristece-me muito que haja uma certa esquerda que acuse de fundamentalista quem acha que essa vida tem direitos mais cedo do que as 10 ou 12 semanas. Como você mesmo disse, a fronteira não é clara...

João Vasco disse...

Ah!

Estou esclarecido. O que o entristece é acreditar que eu (e "certa esquerda") penso que é um fundamentalista.

Eu pensei que fossem mesmo os cerca de 20 vezes mais inocentes do que os que a inquisição matou a que se referiu no primeiro comentário.

Uma coisa é dizer que o ovo, ou o embrião, "tem direitos". Outra coisa é equiparar a morte de um ovo ou embrião à de uma vítima da inquisição. Isto já me parece ridículo. Daí o meu sarcasmo.

Anónimo disse...

Tenha calma, por favor, que não fui eu que teci tais comparações, ok?

E não se vanglorie tanto, a certa esquerda refere-se a pessoas bem concretas que conheço que até são militantes activos no BE... Para mais, pouco me importa o que o senhor acha de mim. Simplesmente acho estranho que alguns que se apregoam bastiões da tolerância e liberdade de expressão e pensamento se recusem (e até insultem, como no meu caso) que uma pessoa possa achar que às 10 semanas já se tem alguns direitos.

Quanto à Inquisição e à ICAR propriamente dita, apenas lhe peço o seguinte exercício: assim como se afirma que o que se passou na URSS ou se passa agora na Coreia do Norte não deva ser confundido com os verdadeiros ideais do comunismo/socialismo, também lhe peço para considerar que, se calhar, a Inquisição não reflecte o que o cristianismo verdadeiramente pretende ser.
Em ambos os casos, um grupo de pessoas serviu-se de uma ideologia/religião para fazer uso da sua ganância e sede de poder.

João Vasco disse...

«assim como se afirma que o que se passou na URSS ou se passa agora na Coreia do Norte não deva ser confundido com os verdadeiros ideais do comunismo/socialismo»

Eu não afirmo isso.
A coisa é mais complexa, mas não é por acaso que esses regimes tendo os objectivos que tinham acabaram por ser o que foram.



«também lhe peço para considerar que, se calhar, a Inquisição não reflecte o que o cristianismo verdadeiramente pretende ser.»

Não fui eu que chamei a inquisição à conversa, mas discordo.

Acho que o cristianismo de HOJE rejeita a inquisição porque foi - em certa medida - influenciado por valores humanistas da sociedade actual, muitos dos quais foram sendo popularizados contra a vontade da igreja. Vários Papas escreveram a amaldioçar o livre pensamento!! Vários Papas escrevaram contra a democracia, contra a liberdade.

Por se fundamentar na Bíblia, o cristianismo sofre uma grande influência de valores anacrónicos, e por isso, mesmo que os valores se venham lentamente a adaptar aos das sociedades, são geralmente mais atrasados. Em malta os Padres estão contra o divórcio, cá em portugal contra o casamento homossexual, na índia a favor da censura do código da vinci. Em diferentes sociedades, em diferentes contextos histórico-culturais a igreja defendeu coisas diferentes, mas geralmente contra a liberdade.

A inquisição é um exemplo paradigmático, que convém nunca esquecer. Mas é apenas um.

As cruzadas, as indulgências, a luta contra qualquer tradução da bíblia, a manipulação política (as manobras maquiavélicas do vaticano ao longo da história, mandando assassinar líderes protestantes, provocando guerras), a conivência com o nazismo e o fascismo italiano, a caça às bruxas (aqui os protestantes foram ainda mais longe), a conversão forçada e violenta dos índios, e de tantos pagãos...


Não, nada disto foi por acaso.

Pode pintar-se uma bela teoria: Jesus deixou uma mensagem de amor, e ao longo da história muitos elementos da igreja não a entenderam, por serem corruptos ou estarem confusos, e assim faziam tudo ao contrário do que Jesus mandou. Até cruzadas em seu nome, Ele que só queria a Paz. Que irónico...

Eu acreditava nesta patetada. Até decidir ler a Bíblia e perceber que não era nada assim. Os Papas, teólogos e padres de antigamente não eram todos parvos e corruptos. A Bíblia é que pode ser interpretada de muitas maneiras. E para ver lá uma mensagem de Paz e Amor, só mesmo tendo como preconceito muitos valores humanistas actuais, popularizados contra a Igreja nos últimos séculos.

João Vasco disse...

Ok, sobre as comparações vi agora que foram escritas pelo "zeca portuga" e não por si. Confusão minha, peço desculpa.

Anónimo disse...

Concordo consigo, inúmeras vezes a religião foi usada como instrumento de poder. Mais curioso ainda é que essa instrumentalização foi tão mais conseguida quanto mais institucionalizada e perto do centro político esteve a Igreja. O que só mostra que o poder corrompe e a necessidade fundamental de um Estado Laico.

Da mesma forma, o controlo do destino de milhões deu azo a uma atitude de "uma morte é uma tragédia, um milhão de mortos é estatística", proferida, como de certo saberá, por Estaline. Esta atitude não é socialismo, não é comunismo. Também em nome do comunismo/socialismo, Che Guevara mandou matar pessoas sem direito a julgamento.

Sobre os Papas estamos conversados, nem eu nem você ligamos muito ao que eles dizem e disseram. São homens como nós, não lhes revejo nenhuma autoridade moral acima da minha consciência.

Se leu a Bíblia, então sabe que Jesus instituiu o sacerdócio directo, libertando os judeus da Lei de Moisés. Se leu a Bíblia sabe que Jesus disse para amarmos os nossos inimigos, se te baterem numa face oferece-lhes a outra. Se isto não é uma mensagem de amor e paz surgida muitos e muitos anos dos valores humanistas se difundirem na sociedade... Quanto à caça às bruxas dos protestantes, sempre que há uma sublevação ao poder vigente há excessos. Como exemplo, por cá, temos o PREC e as FP 25 Abril.

Sobre o Humanismo, não me vejo com autoridade no assunto para discuti-lo consigo, apenas conheço um pouco da reacção no Existencialismo e do Niilismo de Nietzsche.

Por fim, o grande erro da igreja, que conduziu a todos os malfadados males de que fala, foi um impulso muito humano de poder e megalomania. Por isso não gosto de confundir o que uma confissão religiosa faz com os conceitos que lhe estão na base. Seria como confundir um determinado partido político com a ideologia que ele apregoa: nem a ICAR ser tida como um só com os valores do cristianismo nem o PCP ou o BE podem ser vistos como o comunismo/socialismo em si.

João Vasco disse...

«Se leu a Bíblia sabe que Jesus disse para amarmos os nossos inimigos, se te baterem numa face oferece-lhes a outra. Se isto não é uma mensagem de amor e paz surgida muitos e muitos anos dos valores humanistas se difundirem na sociedade...»

Jesus disse muita coisa e o seu contrário. Disse "não cuideis que vos venho trazer a paz. Não vos trago a paz, mas a espada", entre outras coisas.

MAS também disse para dar a outra face. Esta é uma mensagem que parece ser uma mensagem de Paz. Enquanto fui cristão eu admirava esta mensagem como bondosa e sábia.
Hoje sei que era falta de espírito crítico. A mensagem de dar a outra face é uma má mensagem, e isso só é difícil de entender porque ninguém a leva a sério.

Tanto o "olho por olho" como o "dá a outra face" são más mensagens, porque ambas propõem uma solução para todas as situações. Ambas conduziriam a fesgraças se levadas a sério. Numa sociedade em que ninguém retalia, os agressores têm um enorme incentivo para agredir. A opressão será dominante.
Numa sociedade em que ninguém é capaz de perdoar, pequenos incidentes escalam e geram enormes conflitos. Não haverá paz.
A solução certa é esquecer o que está nesses livros "sagrados" e tentar encontrar as melhores soluções. Às vezes a retaliação é louvável, outras vezes é lamentável.

Ainda bem que alguma europa não deu a outra face quando o Hitler lançou o seu exército.

No geral (mas cada caso é um caso!), o ideal é responder às agressões com uma retaliação rápida e eficaz. Mas de forma proporcionada, e disposição de perdoar.


Quanto a "amar os inimigos", é uma simples contradição. Se os amo, não são inimigos.

E não vejo nada de moralmente errado em ter inimigos. Mas isto sou eu que tendo a avaliar moralmente as acções e não os sentimentos.