terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Praxes e Universidades


As praxes são um tema recorrente neste blogue. Volto ao assunto de tempo a tempo, porque sempre as condenei e porque a indiferença com que o problema se agravava publicamente há vários anos não augurava nada de bom. Esta semana, as praxes são «o» tema de debate público: sucedem à adopção gay e ofuscaram o desinvestimento na ciência.

Deve notar-se que não é possível interditar as praxes sem ferir direitos fundamentais: são actividades entre adultos, e que em muitos casos começam por ser consentidas. Mas também é verdade que o princípio da praxe (a saber: os mais velhos exercitarem alguma coação para humilhar os mais novos) está errado e deve ser combatido. Infelizmente, nesta situação o combate cultural e social parece estar a ser perdido: a praxe irradiou a partir dos anos 80 de Coimbra para todo o território nacional, e a peste é hoje particularmente virulenta e malsã em Escolas Agrárias e Universidades privadas.  

Em 2008, Mariano Gago tomou uma atitude correcta, ao responsabilizar as direcções das escolas de ensino superior. O resultado foi que muitas universidades proibiram a praxe dentro dos campi, uma decisão que na prática protege a imagem da Universidade mas não os alunos. Mariano Gago não foi suficientemente longe, o que (convenha-se) não admira: a praxe não é proibível. Não se pode proibir alunos adultos de saírem da Universidade e irem fazer disparates em grupo. Educá-los é parte do que a Universidade deveria fazer, e por paternalista que pareça talvez cada estudante que entra numa Universidade portuguesa deva receber um folheto governamental anti-praxe. Também porque as condenações judiciais são poucas, leves e tardias, e porque as Universidades que promovem cerimónias institucionais de boas vindas e de despedida não registam uma redução significativa da praxe.

Eu sei: pode ajudar-se a velhinha a atravessar a rua, não se pode obrigá-la. Não se faz ninguém ajoelhar, mas também não se vai levantar quem o faz de livre e espontânea vontade. A dignidade é um direito, não um dever. Não se proíbe o mau gosto nem os divertimentos parvos (como a tourada). Não se proíbem pessoas adultas de entrarem em grupos religiosos fundamentalistas, nem de estarem em relações perversas.

Todavia, a Universidade não é um espaço qualquer e os estudantes universitários têm responsabilidades sociais.

A medida mais radical que se pode tomar será sancionar disciplinarmente os estudantes que «abusam» da praxe. As suspensões e expulsões estão previstas nas escolas secundárias de onde vêm. Antes de chegar a esse género de medidas (que deveriam vir do governo), as Universidades podem e devem deixar de promover as comissões de praxe que convidam para eventos, e retirar-lhes as salas que lhes são muitas vezes graciosamente emprestadas. A menos que estejam satisfeitas com o espectáculo degradante que prossegue.

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