quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Liberalismo e videovigilância

Miguel Macedo é realmente um ministro especial: não apenas tem sido responsável pelas repressões mais violentas de manifestações desde os anos 80, como se assumiu como o grande promotor da videovigilância. Ontem, soube-se algo sobre a videovigilância que não afecta apenas o liberalismo político (direito dos cidadãos à privacidade), mas também o liberalismo económico (criação de «rendas» a partir de negócios privados, diminuindo efectivamente a margem de lucro do comércio).
Atente-se na pérola: «a instalação de câmaras de vigilância será obrigatória para todos os novos estabelecimentos como farmácias, gasolineiras, lojas de arte, ourivesarias e casas de jogo. Para os actuais estabelecimentos haverá um prazo de cinco anos para colocar as câmaras».
Note-se bem: não serão os proprietários de estações de serviço ou farmácias a decidirem, por eles próprios, se querem ou não ter videovigilância. Não têm autonomia para ponderar o risco de assalto e o custo da instalação e manutenção: não, népias, nada disso. O governo mandou, eles obedecem: pagam.
Sendo malicioso, lanço uma suspeita: de quem será a(s) empresa(s) beneficiária(s) desta lei? E será que algum assessor ou secretário de Estado sairá directamente do actual governo para uma dessas empresas? E será um acaso que hoje na TV se ouça a propósito de cada assalto: «não tinha câmara de videovigilância instalada...»?

10 comentários :

João da Nóbrega disse...

O PSD não é um partido liberal, é um partido social democrata. E estas medidas de paizinho a obrigar os filhos a ter todos os cuidados e mais alguns é perfeitamente coerente com a sua ideologia.

Esta medida é equivalente à maioria das regras que vêm da união europeia e esmagam completamente os pequenos empresários que não conseguem cumprir todas as regras imbecis. Aliás, se analisarmos bem, nem sequer conseguem saber quais as regras a cumprir.

Efectivamente quem já está instalado no mercado e consegui progressivamente ir obedecendo às regras impostas tem uma vantagem concorrencial esmagadora sobre quem se tentar instalar de raiz.

João Vasco disse...

O PSD não é um partido Social Democrata.
Já foi, no tempo de Sá Carneiro.

Concordo que também não é um partido Liberal.

É um partido conservador, e também um partido dos interesses (não é o único, está bem acompanhado neste ponto).

Luís Lavoura disse...

O Ricardo Alves tem em parte razão. No entanto, faço notar que, em caso de assalto a uma dessas lojas, quem é prejudicado é, não apenas o lojista, mas também os contribuintes em geral, que são quem paga a polícia para investigar esses roubos e os tribunais para os punir. O governo tem a obrigação de proteger os contribuintes, garantindo que o número de assaltos é tão baixo quanto possível e/ou que a investigação desses assaltos é tão barata quanto possível. É nesse quadro que a obrigatoriedade da instalação de câmaras de vigilância é (a meu ver) legítima.

A Fénix de Schroedinger disse...

Se é que já foi Social-Democrata, terá sido na fundação, diria eu.

Deve ser um exercício interessante encontrar um partido liberal que ao chegar ao poder não eleve o securitarismo acima da (suposta) ideologia.

Maquiavel disse...

A implementaçäo privada de um Estado policial!
É a mais imaginativa implementaçäo, estes gajos säo uns visionários!

O desGoverno quer implementar um Estado Social, com cämaras em toda a esquina, mas näo há graveto para esse "investimento público". Logo, decrete-se uma obrigatoriedade, e o pessoal é obrigado a fazê-lo!

Dois coelhos (...) de uma cajadada!

Maquiavel disse...

O PSD é um partido social democrata e você é uma pessoa inteligente.

Anónimo disse...

A eficácia da videovigilância está bastante documentada e o panorama geral não é muito positivo. Em geral, a videovigilância contribui mais para a sensação de segurança do que para evitar crimes. Evita alguns mas não tantos quanto seria de esperar. Basta fazer uma pesquisa rápida no blog do Schneier.

Uma vez fui assaltado à mão armada em plena luz do dia e o tipo que me roubou ficou filmado pela CCTV da faculdade. Isso não serviu para rigorosamente nada porque a identificação do suspeito é muito difícil.

E como é que teria sido possível identificá-lo? Seria necessário permitir à universidade que também filmasse a rua com maior resolução, o que também permitiria identificar todas as pessoas, matrículas, etc., que por lá passassem. A lei proíbe-o e ainda bem que o faz, mesmo que para desgosto dos seguranças que me mostraram as imagens. Que se lixe o meu telemóvel. Acho que alguns segundos de privacidade das centenas de anónimos que passam naquela rua todos os dias vale mais do que isso.

Maquiavel disse...

Se calhar a ideia é mesmo que esta videovigilância obrigatória seja também obrigatoriamente de alta definiçäo e de grande raio de alcance...

Ricardo Alves disse...

Lavoura,
em primeiro lugar, como explica o Francisco Burnay, as câmaras não servem para grande coisa. Em segundo lugar, também somos prejudicados se essas lojas subirem os preços para pagar as câmaras...

Anónimo disse...

Ou então a ideia é meramente populista, o que me parece mais provável.

E o securitarismo populista cheira a fascismo. Espero que o povo não se perfume, como se fazia no tempo da Peste.