Uma das formas de fazer face aos problemas descritos no texto anterior é apostar na formação dos trabalhadores, para que a oferta de horas de trabalho menos qualificado seja de tal modo inferior à respectiva procura que o valor de mercado da hora de trabalho já esteja muito distante da situação de quase-escravatura.
Esta estratégia passaria por associar aos elevados incentivos que os trabalhadores já dispõem para se formar, a possibilidade destes (e dos seus descendentes) acederem à formação gratuitamente, através de um sistema de excelência, bem financiado, justo e funcional.
Há, no entanto, algumas limitações a esta estratégia. Por grande que seja a aposta de uma sociedade na respectiva formação, é impossível fazer progressos muito rápidos em poucas gerações. Por exemplo, se numa geração a taxa de analfabetismo é maioritária, é praticamente impossível que na geração seguinte se atinjam os valores médios (cerca de 20%) para uma formação superior de qualidade.
Isto sucede-se porque numa sociedade com piores taxas de literacia será mais difícil encontrar bons professores em grande quantidade; porque a aprendizagem não se resume à escola, e a escolarização dos pais contribui para a aprendizagem dos filhos; etc...
Também se sucede que caso os pais trabalhem numa situação de quase-escravatura, será muito mais difícil que consigam dar apoio aos respectivos descendentes, os quais vão por essa razão encontrar dificuldades acrescidas na aprendizagem.
Note-se que a resolução mais rápida deste problema já parte de uma significativa forma de regulamentação laboral: a proibição do trabalho infantil. Sem ela o raciocínio exposto no texto anterior vai reflectir-se em toda a economia familiar, tornando o trabalho infantil praticamente obrigatório nas famílias mais pobres, e prejudicando a resolução do problema através da estratégia de formação.
Note-se portanto que a estratégia da formação, que passa pela proibição do trabalho infantil e pela criação de um sistema gratuito que qualifique a população, é a melhor estratégia de longo prazo. Mas por si pode ser insuficiente para fazer face ao problema descrito.
Demografia
Se o valor de mercado da hora de trabalho menos qualificado depende da oferta e da procura deste produto, podemos concluir que a demografia de uma sociedade terá um impacto significativo sobre o preço de equilíbrio do mesmo.
A diminuição ou aumento da população (mantendo o perfil de qualificação da mesma) tem impacto tanto na procura como na oferta de mão de obra. No entanto, o impacto não é igual.
A lei dos rendimentos decrescentes levar-nos-ia a crer que uma diminuição ligeira da população (mantendo o perfil de qualificação) levaria ao aumento da média da produtividade de cada hora de trabalho. Assim sendo, a diminuição da procura de mão de obra é menos significativa do que a diminuição da oferta, o que pode levar a um aumento do valor de mercado da hora de trabalho em questão.
Existem outras questões relevantes a ter em conta. Uma é que a demografia depende do contexto socio-económico em que cada família vive, e, por essa razão, é pouco provável que o perfil de formação da população se mantenha. É importante que os factores demográficos não piorem o mau perfil de formação da população, sob pena de agravar o problema descrito. No entanto, isto poderá acontecer se certos segmentos da sociedade tiverem uma taxa de natalidade muito diferente de outros segmentos.
Novamente, é importante a legislação relativa ao trabalho infantil: sem esta proibição, as famílias mais pobres terão um incentivo maior para ter muitos filhos, sendo quase obrigadas a isso, visto que as famílias concorrem umas com as outras na venda da hora de trabalho.
Por outro lado, a diminuição da taxa de natalidade permite que cada família dedique mais tempo à educação de cada um dos seus descendentes, o que facilitará a estratégia acima descrita relativa à formação.
Não obstante, a diminuição da população pode ter impactos vistos como nefastos em certos sistemas de segurança social. Trata-se, creio, de uma visão incompleta. É certo que a médio prazo poderão surgir algumas dificuldades resultantes da diminuição da população. Mas deve notar-se que tais dificuldades tenderão a desvanecer, criando possivelmente um excedente, quando a população estabilizar mais tarde num valor mais reduzido. Apesar de tudo, convém lembrar que por esta razão pode ser importante que a alteração na taxa de natalidade não seja muito abrupta.
Assumindo então que a uma diminuição suave na taxa de natalidade pode ser positiva para a resolução do problema descrito, fica por explicar que estratégias podem ser utilizadas para atingir este fim. A proibição do trabalho infantil, e a fiscalização necessária para garantir, na medida do possível, o respeito efectivo por esta proibição é uma medida a tomar, e a promoção de informação a respeito dos métodos de planeamento familiar é outra.
Por considerar que estas medidas são insuficientes alguns países optaram por estratégias coercivas para limitar a natalidade. Mesmo que tais estratégias possam levar a um aumento da prosperidade, e a uma resolução mais rápida do problema descrito, elas podem ser indignas e desumanas.
Assim sendo, sem usar métodos coercivos desumanos, não se pode fazer muito para diminuir significativamente a natalidade de uma sociedade, que resulta de uma série de decisões do foro familiar que devem escapar ao controlo centralizado.
Por outro lado, a qualificação da mão de obra através de um sistema de formação sólido e funcional nunca poderá resolver os problemas descritos a curto ou médio prazo.
É essencial a existência de tal sistema, e que ele seja gratuito. É muito importante a proibição do trabalho infantil, e a informação a respeito dos métodos de planeamento familiar. Mas tudo isto é insuficiente.
Serão necessárias outras formas de regulamentação laboral?
Quais?
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