quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

O voto LIVRE nas próximas eleições à Assembleia da República

Já vem sendo habitual que partilhe neste espaço as minhas razões para votar no LIVRE nas eleições à Assembleia da República. Gostaria de destacar duas razões muito importantes e duas razões menos importantes, embora existam muitas outras. Comecemos pelas mais importantes:

1- Razões de cariz ambiental. São poucos os partidos que colocam o ambiente no centro das suas preocupações. O actual contexto é um que exige uma acção urgente e determinada de combate às alterações climáticas, ao colapso da biodiversidade e a um conjunto de outros problemas ambientais que assumem cada vez mais os contornos de um desafio civilizacional. A sociedade continua em grande medida inerte e míope face a estes problemas, e o debate político reflecte essa indiferença e incapacidade de reagir com a urgência e determinação necessária. Três partidos colocam o ambiente no centro da sua acção política: o LIVRE, o PAN e o PEV. A exclusão do MPT é deliberada (no parlamento europeu juntaram-se à bancada liberal e não à bancada verde e votaram a favor de acordos de comércio e investimento com impactos ambientais absolutamente desastrosos - são menos ecologistas que qualquer partido de esquerda), e o PEV não concorre isoladamente nestas eleições, sendo que correspondem a uma pequena proporção dos deputados eleitos pela CDU, a qual, no seu todo, não coloca as questões ambientais no centro da sua acção política. O eleitor que considere as questões ambientais absolutamente cruciais e prioritárias terá dificuldade em votar num partido que não o LIVRE ou o PAN. Partidos como o Volt ou o BE merecem um honroso segundo lugar, relativamente distante dos restantes partidos. O PS, juntamente com todos os partidos à sua direita, pela sua posição face ao Tratado da Carta da Energia, defende que se continue a acelerar em direcção ao abismo. É lamentável. 

2- Um plano progressista que pode funcionar. Os partidos "tipo PS" têm partilhado o poder ao longo das últimas décadas nos países desenvolvidos. Não só as desigualdades de rendimento e poder não diminuíram enquanto estes partidos estiveram no poder, como até aumentaram. Além do que isso representa de negativo para os rendimentos da classe média e das populações mais vulneráveis, isso tem também outros impactos sociais indesejáveis (menor esperança média de vida, pior impacto ambiental do consumo, menos confiança inter-pessoal, etc.) e, mais recentemente, tem conduzido à ascensão da extrema-direita que ameaça a Democracia. A verdade é que estes partidos não têm conseguido cumprir um projecto de esquerda no que concerne às questões económicas. Têm cumprido um projecto de direita (privatizações, desregulamentação, abertura de mercados, etc.) que têm conduzido à desvalorização do trabalho, se bem que a um ritmo mais lento que o de partidos "tipo PSD". 
Infelizmente, partidos/coligações como o BE ou a CDU não constituem boas alternativas. Há uma boa razão pela qual o Syriza não conseguiu implementar um projecto progressista que merecesse o aplauso do BE, e em vez disso governou de forma pouco distinta da de um partido "tipo PS". É que quando a direita diz que o tipo de medidas progressistas que o BE e a CDU defendem iriam tornar o país menos competitivo, o que reduziria o investimento e encorajaria fugas de capital, com impactos negativos no emprego e nos salários ela tem, no actual contexto, ... alguma razão. 
E o BE e CDU até o reconhecerão. A CDU tem um projecto para mudar o contexto: a União Europeia é um espaço com enorme mobilidade de capital, e a CDU apresenta-se como euro-céptica. Pode não ser tão clara e inequívoca como MAS ou o PCTP, mas não é nenhum segredo de Polichinelo que, se dependesse da coligação, não estaríamos na UE. No entanto, se Portugal não estivesse na UE, o contexto geopolítico seria tal que facilmente teríamos aceite acordos de comércio e investimento com o mesmo efeito na mobilidade do capital, mas ainda menos controlo democrático sobre o "espaço de mercado" por eles criado (o Reino Unido, que tem um peso que Portugal não tem, está não obstante a seguir este caminho). Em alternativa (muito improvável), teríamos uma economia tão mais autárcica que os salários seriam, com toda a probabilidade, muitíssimo inferiores aos actuais. 
O BE, pelo contrário, não tem um projecto consequente para mudar de contexto, pelo menos no que concerne à UE. Existem no BE três facções com três propostas diferentes e opostas (uma delas muito semelhante à do LIVRE), e como a relação de forças entre elas é relativamente equilibrada o BE não é capaz de apresentar um conjunto de propostas que efectivamente consigam mudar o panorama. 
O LIVRE vai ao fundo da questão. A UE não está a propiciar o contexto que resulta nos maiores ganhos de qualidade de vida para os seus cidadãos devido aos défices democráticos que existem. A Democracia tende a gerar políticas públicas mais alinhadas com os interesses dos cidadãos do que outros regimes políticos alternativos. Assim, para mudar o contexto económico importa propor transformações na arquitectura institucional da UE. O LIVRE não só propõe mudanças que devem ser feitas em conjunto pelos vários estados-membros da UE através de mudanças dos tratados (reforçar os poderes do Parlamento Europeu face ao Conselho, televisionar as reuniões do Conselho, etc.) como também mudanças que Portugal pode implementar unilateralmente, tais como eleger o nosso representante no Conselho da UE. Estas mudanças são análogas às mudanças que Roosevelt trouxe aos EUA que constituíram uma tremenda vitória histórica das forças progressistas, uma que "mudou as regras do jogo". 
(O Volt é o único partido além do LIVRE que também propõe uma alteração da arquitectura da UE, mas não propõe nada que Portugal possa implementar unilateralmente a este respeito, sendo por essa razão inferior neste domínio. Além disso, não se assume como um partido de esquerda, nem identifica o aumento das desigualdades e a desvalorização do trabalho como um problema grave.)

As duas razões acrescidas são as seguintes:

3- Entendimentos à esquerda. Rui Tavares insistiu muito neste ponto durante os debates, e foi das questões mais esmiuçadas pela comunicação social. Parece relativamente plausível que a eleição de deputados do LIVRE torne mais fácil o entendimento à esquerda. O LIVRE pode aliás criar o "ponto focal" para esse entendimento. 

4- Combate à corrupção. O programa do LIVRE tem um capítulo dedicado a esta questão. Não conheço nenhum partido com melhores propostas nesta matéria. O combate à corrupção pode ajudar o país a convergir com o resto da UE. 


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