segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

As tretas do CETA bem explicadas

No blogue Que Treta! o Ludwig Krippahl explica o que é o CETA e porque é que é muito importante fazer tudo para que não seja aprovado.
Eis alguns destaques do seu texto:

«O Comprehensive Economic and Trade Agreement (CETA) é um tratado entre a União Europeia e o Canadá que, alegadamente, visa promover a colaboração económica permitindo o acesso pleno a todo o mercado das partes signatárias (1). À primeira vista, parece bem levantar obstáculos ao comércio. Infelizmente, a abordagem é injusta, prejudicial e ilegítima.

Estes tratados facilitam a circulação de capital sem remover barreiras à circulação de pessoas. Se o CETA for ratificado, um investidor português poderá montar restaurantes em Toronto como em Lisboa. Assim, o CETA beneficiará directamente aqueles, talvez uns 0.1% da população, com o capital necessário para aproveitar esta liberdade de investimento.[...]

O CETA também é problemático em muitos detalhes. Compromete os signatários a criminalizar a gravação não autorizada de espectáculos ou a remoção de identificadores incluídos em músicas ou filmes para gerir o DRM. Prevê um fórum onde a UE, o Canadá e as empresas interessadas coordenem a regulação de bens de consumo e alimentos. Assim, em vez do exportador se adaptar às exigências do mercado para onde exporta, será ainda mais o interesse comercial a ditar o que permitimos que se comercialize e em que condições. O CETA prevê até um tribunal arbitral que permita aos investidores processarem directamente os Estados por legislação que frustre as expectativas criadas pelo CETA. Se bem que não seja má ideia haver tribunais com autoridade para sancionar Estados – como o Supremo Tribunal dos EUA ou o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos – estes tribunais arbitrais são fundamentalmente diferentes. Primeiro, permitem aos investidores processar Estados por violação de um tratado que Estados celebram com outros Estados. Só Estados é que teriam legitimidade para processar por violação deste tratado. Além disso, a legitimidade de um tribunal vem de fazer cumprir leis criadas pelos cidadãos, ou por referendo ou por meio de representantes eleitos. Este tribunal arbitral não teria essa legitimidade, ficando à margem de qualquer legislação europeia ou canadense. É inaceitável que se crie um tribunal ao qual só os ricos têm acesso e cuja função é subordinar o poder legislativo dos cidadãos aos interesses económicos dos investidores. Isto são apenas alguns exemplos de muitas medidas inaceitáveis que o CETA impinge como parte daquilo que, fundamentalmente, deveria ser um tratado acerca de taxas aduaneiras e licenças comerciais.

E este é outro grande problema do CETA. O processo legislativo tem de ser transparente e permitir a participação de toda a sociedade. Para isso, as medidas propostas têm de ser específicas, bem circunscritas, e sujeitas a discussão pública. A negociação do CETA não foi nada assim. Decorreu à porta fechada, entre burocratas e investidores, e só se foi sabendo o que combinavam quando havia fugas de documentos. Ao longo do processo foram colando ao CETA artigos sobre tudo o que lhes pudesse interessar, desde taxas alfandegárias a patentes sobre plantas, de regras de segurança alimentar à vídeo-gravação de espectáculos, da autorização de serviços de telecomunicação a legislação laboral e imensas outras coisas. São quase 1600 páginas de artigos, tabelas e apêndices – doze vezes o Código Penal Português – que agora pedem ao Parlamento Europeu que assine de cruz, sem discussão nem possibilidade de alterações. A maioria destas medidas dispensa até ratificação pelos países da UE. Isto não é uma forma democrática de legislar.

[...] É um tratado enorme, com muita coisa má, negociado às escondidas no interesse dos investidores e que, se for aprovado no próximo dia 15, será imposto em bloco a toda a UE. Não haverá possibilidade de discutir ou corrigir qualquer problema. A quem concorda que a democracia não devia funcionar assim, apelo que contactem os eurodeputados que nos representam e que ainda não se comprometeram a votar contra o CETA. O site CetaCheck tem um formulário prático para isto e outros contactos para se quiserem exercer uma pressão mais personalizada. Penso que é importante bloquear este mecanismo pelo qual quem tem muito dinheiro consegue contornar os limites democráticos do poder. »

Post também publicado no Espaço Ágora.

6 comentários :

Lucas disse...

Bem vindo à era do internacionalismo e do globalismo, caro esquerdista, defensor do....internacionalismo e do globalismo.

Mats

João Vasco disse...

Sou esquerdista defensor do internacionalismo/universalismo com muito orgulho.

Mas, tal como existe mais de uma forma de governar um estado (existem ditaduras, democracias, teocracias, etc.) também existem várias maneiras de governar as relações entre os estados.

Estas propostas de regular as relações entre os estados pelos desejos das grandes multinacionais são péssimas: conduzem a um acentuar de desigualdades e uma perda da democracia. Mas aquelas que os nacionalistas levaram à prática quando estiveram no poder conseguem ser ainda piores - guerras sem fim, miséria, mortes, destruição.
Infelizmente a humanidade tem memória curta, e já se começa a esquecer dos desastres tremendos que a extrema direita trouxe à Europa (a seguir à segunda guerra mundial, depois da direita nacionalista estar no seu ponto mais baixo, a Europa melhorou económica e socialmente a todo o vapor durante várias décadas).

Já hoje (com a direita nacionalista a renascer porque a humanidade está a esquecer as lições do passado) entre a oligarquia das multinacionais e os desvarios dos nacionalistas, sempre prefiro a malta que nos quer enfiar o CETA pela goela abaixo. Mas não te equivoques, que a minha aversão aos nacionalistas não me vai impedir de lutar contra os oligarcas. Felizmente, existem mais que essas duas desastrosas opções.

É possível ser universalista e não querer as multinacionais no controlo.

Mats disse...

Sou esquerdista defensor do internacionalismo/universalismo com muito orgulho.

Então não te podes queixar das consequências destas ideologias.

Estas propostas de regular as relações entre os estados pelos desejos das grandes multinacionais são péssimas: conduzem a um acentuar de desigualdades e uma perda da democracia.

Esse é um dos objectivos do internacionalismo: concentrar a riqueza nas mãos duma minoria não representativa dos interesses da maioria.

Mas aquelas que os nacionalistas levaram à prática quando estiveram no poder conseguem ser ainda piores - guerras sem fim, miséria, mortes, destruição.

Curioso, porque a Hungira é governada por um governo nacionalista, mas não há evidências de que isso esteja a acontecer por lá. Pelo contrário, pelo que se sabe, o povo local está relativamente feliz com a governação nacionalista, e quer um governo ainda mais defensor dos direitos dos trabalhadores nativos.

E se tu usas exemplos de nacionalistas violentos como imagem de marca do nacionalismo eu posso fazer o mesmo dos internacionalistas. O que foi que o internacionalismo comunista causou em Cuba, Cambodja. URSS, e todo o Leste Europeu durante quase 75 anos?

Infelizmente a humanidade tem memória curta, e já se começa a esquecer dos desastres tremendos que a extrema direita trouxe à Europa

Para ti, nacionalismo = "extrema direita"? Então internacionalismo = extrema esquerda. Concordas?

(a seguir à segunda guerra mundial, depois da direita nacionalista estar no seu ponto mais baixo, a Europa melhorou económica e socialmente a todo o vapor durante várias décadas).


Excepto na Europa do Leste internacionalista.

Já hoje (com a direita nacionalista a renascer porque a humanidade está a esquecer as lições do passado) entre a oligarquia das multinacionais e os desvarios dos nacionalistas, sempre prefiro a malta que nos quer enfiar o CETA pela goela abaixo.

Entre aqueles que te querem escravizar sob a usura e sob a dívida, e aqueles que querem que o governo coloque os interesses do povo nativo acima dos interesses das oligarquias e dos grupos económicos, tu ficas do lado dos grupos económicos e dos internacionalistas.

Ou seja, a lavagem cerebral anti-nacionalista que te fizeram foi tão bem feita, que tu preferes ficar do lado de pessoas comprovadamente mentirosas e desonestas (como os arquitectos do CETA) do que ficar do lado de nacionalistas. Impressionante.

Mas não te equivoques, que a minha aversão aos nacionalistas não me vai impedir de lutar contra os oligarcas.

Tu nunca "lutas" contra os oligarcas enquanto defendes o internacionalismo. Vai ler quem financiou a reviolução "Russa" e vê o que quero dizer. Pesquisa as palestras do historiador C. Sutton e vê que o internacionalismo é a forma como os oligarcas tentam unificar o mundo sob a sua gerência.

Felizmente, existem mais que essas duas desastrosas opções.

Não, não há. Ou és nacionalista (e defensor do povo) ou és internacionalista (e defensor dos bancos e dos oligarcas).

É possível ser universalista e não querer as multinacionais no controlo.

lol Isso é o mesmo que dizer "é possível ser-se do Benfica sem torcer por equipas que vestem de vermelho".

João Vasco disse...

«Não, não há. Ou és nacionalista (e defensor do povo) ou és internacionalista (e defensor dos bancos e dos oligarcas).»

Se não tens capacidade cognitiva para compreender mais de duas opções - e todas as tuas respostas vão nesse sentido - a discussão contigo é inútil.

Não vou perder o meu tempo. Talvez um dia consigas perceber que a realidade é um pouco mais complexa, mas duvido muito. A ironia é que bem me podes tentar colar às ideologias comunistas tudo o que quiseres (como se os comunistas não tivessem orgulho em assumir-se, mas pronto...), mas nessa forma de veres as coisas a preto e branco e achar que não existem mais de duas opções és tu que és igualzinho à maioria dos comunistas que conheci, e nesse sentido a visão de facínoras como Estaline ou Mao não era muito diferente. Há muitas diferenças entre os extremos, mas nessa incapacidade de não ver outra coisa, tocam-se completamente.

Unknown disse...

Olha que eu (Mats) não sou o único a dizer que só há duas opções: globalismo/internacionalismo ou nacionalisno.

João Vasco disse...

Não duvido que não sejas o único. Há pessoas para quem não existia diferença entre Clinton e Trump, por exemplo. Há gente que é mesmo incapaz de compreender coisas basilares, e isso até é um risco para a Democracia, que se baseia na capacidade dos cidadãos serem capazes de compreender devidamente a realidade para que tomem boas decisões.

Mas no fim de contas, pode-se enganar alguém por muito tempo, ou quase todos por pouco tempo, mas não se pode enganar quase todos por muito tempo. Por isso é que estes regimes nacionalistas acabam sempre por cair, e a história bem os recorda como o desastre inqualificável que foram para as pessoas e o mal que fizeram aos seus países. E durante bastante tempo as pessoas ficam vacinadas. Por isso é que, com revezes aqui e ali, às vezes mais graves (2ª guerra mundial), a Humanidade lá vai avançando em direcção ao progresso.