segunda-feira, 16 de janeiro de 2006

O neo-cavaquismo, ano 2

Na sequência da divulgação do «crescimento negativo» (ou decrescimento positivo) do PIB de 2006, a discussão sobre que parcela da governação cabe a Belém e que parcela cabe a S. Bento agrava-se, e as reuniões entre o Presidente e o Primeiro Ministro atingem as seis horas de duração (nas primeiras ocasiões em que tal acontece, o gabinete do PM chega a dizer que ele já voltou para S. Bento, mas os assessores de Cavaco conduzem as câmaras da SIC a filmar as silhuetas, visíveis atrás das cortinas, de Cavaco -de pé, a falar e com um ponteiro na mão- e de Sócrates -sentado, não se sabe se a escrever ou a dormir).
No dia 5 de Março de 2007, após falar num seminário na Universidade Católica, Cavaco Silva é perguntado sobre a possibilidade de uma guerra contra o Irão. Responde que «Portugal é um país de Paz e nunca entraria em guerra com ninguém (...) aliás, a inflação está muito alta para nos metermos em guerras». Quarenta e três horas depois, George W. Bush faz um ultimato ao Irão para que desista do seu programa nuclear. Ahmadinejadi responde com uma saraivada de perdigotos e citações do aiatolá Khomeini. Quando Sócrates decide seguir a maioria da NATO, a confusão instala-se: as ruas enchem-se de manifestantes liderados por Louçã e Policarpo, Freitas do Amaral demite-se e Cavaco vai ao Vaticano. A guerra do Irão durará quatro meses.
Durante a guerra, Marcelo Rebelo de Sousa, Pacheco Pereira, Alberto João Jardim e outras figuras prestigiadas do PSD criticam violentamente Marques Mendes, sem que se perceba muito bem porquê. No entanto, em poucas semanas é convocado um Congresso extraordinário, no qual Luis Filipe Menezes é surpreendentemente eleito presidente do PPD-PSD. No grupo da liderança ficam também Ferreira Leite, António Borges, Isaltino Morais e Valentim Loureiro.
No mês de Maio, Sócrates anuncia, durante uma visita ao Alentejo, que pretende subir as reformas 0,2%. Duas horas depois, à entrada para um colóquio da Gulbenkian, Cavaco diz que «estamos em tempo de vacas magras (...) nem pensar em subir as reformas mais de 0,19%». Sócrates engole em seco e obedece.
Em Junho, Cavaco dá uma entrevista televisiva a Maria João Avillez, na qual, apesar de se afirmar «satisfeito por estar a colocar a [sua] experiência ao serviço de um ajudante de Presidente, como é o Primeiro Ministro», lamenta os «políticos que não gostam de ouvir as pessoas mais velhas e com mais experiência (...) porque depois podem atirar o país para crises graves».
No fim de semana seguinte, num almoço do PS em Carrazeda de Ansiães, Sócrates queixa-se, perante uma plateia de velhotes de boné e de senhoras vestidas de preto que mastigam rissóis, de obscuras «forças do bloqueio» que «não o deixam trabalhar». O Governo termina três dias depois.
Nas eleições legislativas de Setembro de 2007, a coligação entre o PSD e outro partido tem 45% dos votos (110 deputados), a coligação PS/BE fica com 42% (105) e a CDU 9% (15). Numa situação de tremenda ingovernabilidade e efervescência política, ouvem-se gritos de raiva para os lados de Belém e segue-se um mês de conversações de bastidores que terminam num Governo PSD/PS/CDS. O Primeiro Ministro Luis Filipe Menezes tem Teixeira Pinto como Ministro das Finanças, António Borges como Ministro da Economia, Pina Moura como Ministro da Energia e Transportes, Valentim Loureiro na Defesa, Jaime Gama nos Negócios Estrangeiros e Ribeiro e Castro como Ministro da Cultura e Desportos.
Na tomada de posse, o Presidente Cavaco Silva rejubila com este «Governo suprapartidário, (...) sem pressões exteriores de lóbis ou clientelas» e considera-o a prova de que «afinal, os políticos podem cooperar uns com os outros».
(continua)

4 comentários :

Ricardo disse...

Excelente exercício de futurologia. Com ironia qb...

Anónimo disse...

futurologia ?

futurologia é isto :

http://esquerda-republicana.blogspot.com/2005/12/o-ponto-de-viragem.html

Tás lá pha .Tá mesmo lá .hehehe

Anónimo disse...

Ricardo:

Um bom momento de humor num exercício que desgraçadamente pode estar próximo da realidade.

Unknown disse...

Bom trabalho de futurologia. O mais certo é a realidade ultrapassar a ficção. Venha mais prosa, antes de nos agarrarmos ao Prozac.