A primeira vez que se falou da «Europa» em Portugal foi com Mário Soares. A organização internacional actualmente conhecida como «União Europeia» foi, à época, apresentada como o reconhecimento de que Portugal era uma democracia.
Voltou-se a falar da então CEE durante o período mais populista do cavaquismo. Disse-se que viria dinheiro sob a forma de subsídios, parte a fundo perdido, e que em 1992 (lembram-se do «desafio de 92»?) Portugal assumiria a presidência rotativa da coisa. O que seria um reconhecimento da nossa capacidade tecnocrática.
Entretanto, a instituição transformava-se. A partir da queda das ditaduras do leste da Europa, a CEE acelerou em Maastricht na direcção de uma federação sui generis de Estados. O «europeísmo» passou a ser a nova utopia, uma utopia pós-socialista, pós-nacionalista, fundada no mercado livre e na livre circulação das elites.
Os portugueses provavelmente nunca se aperceberam de que o impulso inicial fora prevenir as guerras que tinham desgraçado o centro e leste da Europa durante a primeira metade do século 20. Mais concretamente, criar um novo equilíbrio entre a Alemanha e a França, arbitrado (quando necessário) pelos países do Benelux. Em Portugal, continuou a encarar-se a «Europa» como pouco mais do que uma burocracia que distribui subsídios e que será necessariamente democrática. O défice de reflexão sobre a «Europa», em Portugal, é tremendo. O que gera imensos equívocos.
A União Europeia de hoje, alargada a quase toda a Europa geográfica à excepção da Rússia e dos seus satélites, é demasiadamente grande e diversa para se poder imaginar um futuro coerente. É uma instituição internacional em que as decisões são tomadas pelo Conselho Europeu, nas reuniões sazonais dos Primeiros Ministros do continente, sempre à porta fechada, e onde é o peso populacional de cada Estado que manda.
O Parlamento Europeu é a fachada democrática da União Europeia. Confere a aparência de uma proto-federação democrática de Estados. Mas não se trata de um Parlamento no sentido de uma câmara legislativa: os grupos parlamentares não podem iniciar legislação. E nenhum «governo europeu» (Comissão Europeia) alguma vez caiu em consequência de eleições para o Parlamento Europeu.
A União Europeia tem um problema grave para resolver: a inexistência de um demos europeu. Não é tanto não existir nem povo nem nação europeia: é mais não existir sequer um «espaço público europeu» no sentido de media comuns, com debate público alargado e participação directa dos cidadãos. É duvidoso que venha a existir, quanto mais não seja porque as razões que levaram alemães, portugueses, britânicos, checos e estónios a juntarem-se nesta empresa são mais divergentes do que parecem à primeira vista.
Voltou-se a falar da então CEE durante o período mais populista do cavaquismo. Disse-se que viria dinheiro sob a forma de subsídios, parte a fundo perdido, e que em 1992 (lembram-se do «desafio de 92»?) Portugal assumiria a presidência rotativa da coisa. O que seria um reconhecimento da nossa capacidade tecnocrática.
Entretanto, a instituição transformava-se. A partir da queda das ditaduras do leste da Europa, a CEE acelerou em Maastricht na direcção de uma federação sui generis de Estados. O «europeísmo» passou a ser a nova utopia, uma utopia pós-socialista, pós-nacionalista, fundada no mercado livre e na livre circulação das elites.
Os portugueses provavelmente nunca se aperceberam de que o impulso inicial fora prevenir as guerras que tinham desgraçado o centro e leste da Europa durante a primeira metade do século 20. Mais concretamente, criar um novo equilíbrio entre a Alemanha e a França, arbitrado (quando necessário) pelos países do Benelux. Em Portugal, continuou a encarar-se a «Europa» como pouco mais do que uma burocracia que distribui subsídios e que será necessariamente democrática. O défice de reflexão sobre a «Europa», em Portugal, é tremendo. O que gera imensos equívocos.
A União Europeia de hoje, alargada a quase toda a Europa geográfica à excepção da Rússia e dos seus satélites, é demasiadamente grande e diversa para se poder imaginar um futuro coerente. É uma instituição internacional em que as decisões são tomadas pelo Conselho Europeu, nas reuniões sazonais dos Primeiros Ministros do continente, sempre à porta fechada, e onde é o peso populacional de cada Estado que manda.
O Parlamento Europeu é a fachada democrática da União Europeia. Confere a aparência de uma proto-federação democrática de Estados. Mas não se trata de um Parlamento no sentido de uma câmara legislativa: os grupos parlamentares não podem iniciar legislação. E nenhum «governo europeu» (Comissão Europeia) alguma vez caiu em consequência de eleições para o Parlamento Europeu.
A União Europeia tem um problema grave para resolver: a inexistência de um demos europeu. Não é tanto não existir nem povo nem nação europeia: é mais não existir sequer um «espaço público europeu» no sentido de media comuns, com debate público alargado e participação directa dos cidadãos. É duvidoso que venha a existir, quanto mais não seja porque as razões que levaram alemães, portugueses, britânicos, checos e estónios a juntarem-se nesta empresa são mais divergentes do que parecem à primeira vista.
8 comentários :
Neste blog, os disparates que se dizem sobre religião são compensados pela coerência do que se escreve sobre política europeia. Bom texto.
"O «europeísmo» passou a ser a nova utopia, uma utopia pós-socialista, pós-nacionalista, fundada no mercado livre e na livre circulação das elites."
E da 'arraia-miúda', em muito maior número e com uma facilidade nunca antes experimentada.
Mas isto é sempre menos lembrado dado que não contribui para a tal imagem de sucesso.
Ora, o Nuno Gaspar tirou-me as palavras do teclado.
Embora no que diz respeito à Religião também são ditas algumas coisas (e só isso) bastante a propósito - e falo como crente.
«Neste blog, os disparates que se dizem sobre religião são compensados pela coerência do que se escreve sobre política europeia»
Haverá quem diga o contrário: que os disparates que se escrevem sobre política europeia são compensados pela coerência do que se escreve sobre religião. ;)
A vida é assim: somos multidimensionais... ;)
Dorean,
livre circulação da «arraia-miúda» europeia. A extra-europeia vê as portas fecharem-se cada vez mais.
i stand corrected (era o que eu queria dizer).
eu diria mesmo mais: os disparates que se escrevem sobre a 1ª república são compensados pela coerência com que se escreve sobre religião e política europeia. ;)
(e como a dita acima já se finou há muito, graças a teus, por mim está tudo bem...)
Pelo menos que a "Esquerda Republicana" se mantenha.
"Antes o diparate dos mortais que o despotismo dos iluminados".
João Moutinho
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