Reparem bem nestes nacos de prosa:
"The best form of climate-change insurance is a large and growing economy so that future generations can afford to adapt to whatever they may confront. (...) A more prosperous society a century or more from now is a more important goal than asking the world to accept a lower standard of living today in exchange for symbolic benefits."
Estamos a falar do editorial de um dos principais jornais norte-americanos. Quem o escreveu sabe perfeitamente que está demonstrado que o aquecimento global existe. Sabe que 90% dos especialistas em climatologia concordam que é causado por atividade humana. Mas não é por isso que considera o combate ao aquecimento global uma prioridade.
Parece-me que existe uma crença de que a oposição ao combate ao aquecimento global só pode ser consequência de desinformação, e combate-se com campanhas de sábios. Não me interpretem mal: não estou a menosprezar a divulgação científica (eu próprio gosto muito de a fazer). Mas parece-me que exemplos como este editorial demonstram que tal oposição pode não ser só consequência de desinformação.
Aliada a esta crença de que o problema é a desinformação do povo parece estar outra, na superioridade moral dos cientistas. Ora, como já tenho dito, a ciência nem é democrática nem tem moral. Independentemente disso, casos como o das vacinas demonstram que uma significativa parte do público não acredita na ciência nem nos cientistas. Tal como não acredita nos políticos. Nem no Estado. Este é um problema seriíssimo, que creio afetar mais os EUA, como demonstra a eleição de Trump. Mas que também afeta a Europa. Enquanto não for enfrentado, creio que não adianta muito os especialistas virem, com um ar muito doutoral, dar lições ao povo. O povo não gosta muito que sábios lhe dêem lições.
Obviamente existe uma superioridade (chamemos-lhe assim) dos cientistas a falar de assuntos científicos. Creio que também seria desejável que o povo estivesse efetivamente consciente dos problemas (para a espécie humana, para as outras espécies e para o planeta) associados ao aquecimento global (por isso - repito para ficar claro - não estou a menosprezar a divulgação científica). Mas exemplos como o editorial acima demonstram que, mesmo entre o público informado, nunca se chegaria a acordo. E isto porque o aquecimento global, ao contrário da vacinação ou das "terapias alternativas", não é tanto um problema científico: é mais um problema político e moral. Temos que nos convencer de que o combate ao aquecimento global é, sobretudo, um combate político, e requer ação política. E isso implica convencermo-nos de que há pessoas que defendem posições e ideias como a deste editorial.
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