Há muito, que economistas (Keynesianos, mas não só) nos advertem para a ineficácia das políticas de austeridade, mas poucos conseguiram explicar o apelo de uma ideia que tem demonstrado ser tão nociva. Foi precisamente isso que Mark Blyth, professor de Economia Política na Universidade de Brown explicou no livro
Austerity: The History of a Dangerous Idea. Num estilo acessível, Blyth faz duas coisas. Primeiro, descreve a genealogia das ideias de austeridade, e explica o seu apelo – são simples e têm a mensagem moralista que convém a sociedades influenciadas pela cultura cristã. Em segundo lugar (e esta é a parte mais importante), Blyth demonstra que a austeridade não só não funciona agora, como nunca funcionou.
Não funcionou na Alemanha no período pós-1918, nem em França no período 1919-39, nem nos Estados Unidos durante a Grande Depressão. As políticas de austeridade também não funcionaram nos casos mais recentes que os economistas “austeritários” (por exemplo, Alesina, Ardagna, Perotti, economistas da escola de Bocconi que o BCE cita com regularidade) gostam de citar como exemplos de sucesso, nomeadamente os da Dinamarca, Suécia e Irlanda nos anos 80, e os da Estónia, Letónia, Lituânia, Bulgária e Roménia em 2008-2010. Todos estes casos foram desmontados por Blyth com a ajuda de economistas do FMI (uma ajudinha oportuna). No caso da Dinamarca, os autores do estudo que tentam demonstrar a tese da austeridade, omitiram o simples facto de que os cortes à despesa pública terem sido efectuados quando a economia estava em crescimento. Pelos vistos, este é um pormenor de somenos importância.
Assim, Blyth conclui: “...the deployment of austerity as economic policy has been as effective in bringing peace, prosperity, and crucially, a sustained reduction of debt, as the Mongol Horde was in furthering the development of Olympic dressage. It has instead brought us class politics, riots, political instability, more rather than less debt, assassinations, and war. It has never once ‘done what it says on the tin’”.
As alternativas à austeridade
Blyth diz ainda que, obviamente, há alternativas à austeridade (achei sempre curioso o determinismo dos neo-liberais; afinal a base do liberalismo é a crença no livre-arbítrio). As alternativas tradicionais à austeridade são a desvalorização,a inflação e o não-pagamento, mas nenhuma é ideal ou é sequer uma possibilidade na zona euro. Mas há mais alternativas e uma delas é a que Blyth define de “repressão financeira” e que se traduz pelo aumento dos impostos para a classe de contribuintes que mais beneficiou do boom dos anos 90 e que provavelmente é mais responsável pela crise.
Ora, Blyth não é o único a pensar nisto. Um grupo de economistas alemães fez recentemente o cálculo seguinte: um imposto pontual (one-off) de 10% à riqueza pessoal que exceda os 250 mil euros por contribuinte poderá arrecadar fundos equivalentes a 9% do PIB alemão. Peter Diamond (do MIT) e Emanuel Saez (da Universidade de Berkeley) chegaram a conclusões semelhantes: o aumento dos impostos sobre os rendimentos dos actuais 22,4% para 43,5% para os contribuintes mais ricos (o topo 1%) teriam o efeito de arrecadar fundos equivalentes a 3% do PIB, o que será suficiente para fechar o défice estrutural norte-americano.
Blyth está convencido que, mais dia, menos dia, a opção ‘repressão financeira’ e impostos elevados para os mais ricos chegará à mesa da zona Euro. Estou a torcer para que Blyth tenha razão.
P.S. O livro de Mark Blyth deveria ser leitura obrigatória para todos os governantes e políticos europeus, e já agora para todos os jornalistas e comentadores que contribuíram para o triunfo do “austeritarismo”.
P.S.2: Muitas desculpas por um post tão longo.