sexta-feira, 11 de julho de 2008

O islamismo já tem os seus arrependidos

No jornal Público de hoje (no P2), encontra-se um interessante artigo sobre a renúncia à jihad de um teórico do islamismo, que agora diz que «é proibido cometer actos de agressão, mesmo que os inimigos do islão o façam».

A deserção tem importância porque o senhor em questão, Sayyed Imam Bin 'Abd Al-'Aziz Al-Sharif, vulgo «Dr. Fadl», é companheiro de luta de Al-Zawahiri há 40 anos, deste os tempos da Universidade do Cairo. Acompanhou o actual líder operacional da Al-Qaeda nos grupúsculos islamofascistas dos anos 70 e, depois da proverbial passagem pela prisão, esteve no Paquistão, nos anos 80, no local e no momento em que as presentes redes islamistas realmente começaram. Como diz o artigo do Público: «foi também em Peshawar, a 11 de Agosto de 1988, um ano antes da retirada soviética do Afeganistão e depois de escrever o seu primeiro manual de terrorismo, que o Dr. Fadl se encontrou com os principais líderes da Al-Jihad. Cada um tinha uma agenda. O palestiniano Abdullah Azzam sonhava atrair os mujahedin para a sua causa; o egípcio Zawahiri queria derrubar o regime de Mubarak; e o multimilionário saudita Osama bin Laden ambicionava criar uma legião de exércitos árabes que expandisse a guerra santa até à Ásia Central e ao Iémen, onde vigorava, na época, um governo marxista. Nasceu assim a Al-Qaeda». O actual terrorismo islamista começou perante a frustração palestiniana, a repressão dos regimes seculares do Egipto e outros, e face ao «comunismo ateu» dos soviéticos. Era (e é) anti-moderno, contra a emancipação das mulheres, contra os «imperialismos», e contra as democracias laicas. (Há uns trapaceiros de direita que acham que isto era uma frente «de esquerda», algo «marxista-leninista», quiçá «guevarista». O disparate é tão grande que se refuta lendo a mais sumária história destes movimentos.)

Voltando ao «Dr. Fadl»: continuou com Bin Laden e Al-Zawahiri no Sudão, essa pausa para teorização e recolha de fundos, mas afastou-se para o Iémen por divergências pessoais com Al-Zawahiri. Depois do 11 de Setembro, «desapareceu» numa prisão qualquer, para em 2004 «aparecer» numa prisão egípcia. Agora «renuncia à violência», na prisão controlada pelo governo egípcio (e pelos EUA?). Duvido que convença alguém. Um «arrependido» diz o que os seus captores quiserem, especialmente se depois de anos de tortura o colocarem numa cela com «um quarto privado, casa de banho, uma pequena cozinha, um frigorífico, um televisor e um jornal por dia» (sic!). Não vale a pena sonhar. O monstro islamista continuará vivo e bem vivo enquanto houver dinheiro saudita, jovens desesperados nos subúrbios árabes, e áreas fora do controlo governamental no Afeganistão, no Paquistão e na Argélia. O resto é propaganda.

3 comentários :

Carlos Esperança disse...

A globalização também traz vantagens. A heresia e a apostasia passam fronteiras. Felizmente.

dorean paxorales disse...

Sayyid Qutb foi executado em '66. Antes, a tortura nas prisões de Nasser levara-o ao extremismo da 'jahiliyyah' ("não basta matar os líderes, o povo também é corrupto").

Zawahiri era seu estudante.
Quando os seus 'jihads' mataram Sadat mas os 'jovens desesperados dos subúrbios árabes' permaneceram calmos viu provada a teoria.

Osama foi sempre e apenas dinheiro e antes do 11 Set não havia qualquer rede. Foi algum tempo antes, num tribunal americano, que a expressão 'al-qaeda' foi criada.

Depois do ataque, servia como uma luva para manter a opinião pública assustada.

Zawahiri e Bin Laden adoptaram-na imediatamente, num espírito de colaboração impressionante para com os seus inimigos religiosos (os neocons).

Nesta guerra de audiências, uma mão lava a outra.

Ricardo Alves disse...

Dorean,
ante do 11/9 havia rede, e a prová-lo está a capacidade executar ataques no Iémen, no leste de África, etc. Claro que cresceu depois do 11/9, mas o nome é irrelevante. E a «Al-Qaeda» não existe para «assustar audiências», existe por razões político-religiosas bem claras e sobre as quais os seus líderes não têm mentido.