quarta-feira, 12 de julho de 2006

Marx e a religião (1)

A passagem de Karl Marx em que se afirma que «a religião é o ópio do povo» é frequentemente citada como prova de que o pensamento marxista (e o comunismo, por extensão) seria anti-religioso. No entanto, essa passagem é mal compreendida, talvez por raramente ser citada na sua totalidade.
  • «A miséria religiosa é, de um lado, a expressão da miséria real e, de outro, o protesto contra ela. A religião é o soluço da criatura oprimida, o coração de um mundo sem coração, o espírito de uma situação carente de espírito. É o ópio do povo.»

Note-se que a referência ao ópio, que na época de Marx era uma droga de aristocratas e burgueses ricos, significa apenas que a religião é o escape, a fuga possível à «miséria real» das classes «oprimidas». Ao designar a religião como um «protesto» contra essa miséria e como «coração de um mundo sem coração», Marx demonstra até alguma compreensão pelo fenómeno religioso (senão mesmo simpatia). Nitidamente, se se tivesse que completar a série de metáforas usadas por Marx, facilmente se escreveria que a religião não é causa de problemas, mas sim consequência, que não é a doença, mas sim o seu sintoma.

Continuemos com a Introdução à Crítica da Filosofia em Hegel.

  • «A crítica arrancou as flores imaginárias que enfeitavam as cadeias, não para que o homem use as cadeias sem qualquer fantasia ou consolação, mas para que se liberte das cadeias e apanhe a flor viva. A crítica da religião desengana o homem para que este pense, aja e organize sua realidade como um homem desenganado que recobrou a razão a fim de girar em torno de si mesmo e, portanto, do seu verdadeiro sol.»

Na sequência do seu raciocínio (perfeitamente lógico atendendo às premissas) Marx defende que a crítica da religião não é um fim em si próprio, mas apenas um primeiro passo para que o homem se liberte das suas «cadeias». De certo modo, pode dizer-se que Marx subordina a crítica anti-religiosa à luta política socialista, não reconhecendo à primeira mais do que um valor instrumental.

15 comentários :

João Moutinho disse...

Todos nós temos tendência a adoptar chavões e sloglans como representantes quase absolutos de determinada ideologia.

Mudando de área política, muito se falou do "orgulhasomente sós" de António Salazar. Também se trata de uma utilização de um sloglan extraído sem ter em atenção o seu contexto.

Mas voltando a Marx, tenho pena que ele nunca tenha podido fazer uma crítica aos regimes ditos marxistas.

no name disse...

desculpa lá, joão moutinho, mas parece-me que isso é um bocadinho como ter curiosidade nas críticas que darwin faria dos pseudo-cientistas do intelligent design... é malta que não percebe claramente nada de teoria da evolução! :-)

João Moutinho disse...

Estás desculpado, é o problema da taxa de mortalidade ser 100% e não ser possível voltar cá uns anos depois.

A propósito do "intelligent design", eu sou religioso e acredito que o Universo (no qual estamos incluídos) foi feito com um propósito.

Ricardo Alves disse...

João Moutinho,
só por curiosidade: vocês acreditam que o universo foi «criado»? E o ser humano também, ou só o universo?

Cumps,

João Moutinho disse...

Nós acreditamos que o Universo foi criado e que o ser humano é resultante da vontade divina.
Não somos fruto do acaso.
Acreditamos nos Génesis (como uma parábola).

no name disse...

ops! vais ter que me desculpar novamente, joão moutinho, mas o que dizes é científicamente incorrecto. nós somos fruto do acaso. isso é verdade científica indiscutível (basta ler um pouco sobre astrofísica, em primeiro lugar, e teoria da evolução, em segundo lugar). negar a verdade desses factos passa, antes de mais nada, por negar a ciência. e, nesse caso, por forma a não correres o risco de seres catalogado como hipócrita, parece-me que não tens outro remédio senão ser coerente na negação da ciência e também deixar de usar televisão, telemóvel, computador, médicos, etc. etc. :-)

(e nota que nem estou a entrar na questão da cosmogénese divina, que por si só também é absurda e anti-científica: tal cosmogénese falha logo à nascença ao esquecer-se de explicitar onde e como se materializa a identidade divina que cria o nosso universo... mas enfim...)

João Moutinho disse...

Ricardo,
Acreditar em Deus ou não é uma questão de Fé. Em todo os caso vou tenter transmitir o meu pensamento.
Quando olho para o Céu estrelado e vejo as estrelas (algumas delas até talvez já nem existem) que formam a nossa via láctea e outras mais distantes só reforça a minha Fé.
Alguém construi o monitor que visualizamos, ele não surgiu do nada. Nem poderia ter surgido ao acaso após um tufão ter passado por uma conjunto de elementos que o compõem.
O Universo teve que ter um construtor, tal como o ser humano, construído a partir de elementos formados ns estrelas.
E porque razão há de um religioso ter de negar a teoria da evolução?
Para nós (os Bahá'ís) o Universo caracteriza-se pela sua mutabilidade.

Quanto à materialização da substância divina, para nós ninguém tem acesso a tal.

Anónimo disse...

Apenas por curiosidade, que luta ideológica é que o João Pedro Moura vislumbra nos dias de hoje?

Porém, há-de concordar comigo que o sistema em que hoje vivemo, ou melhor, o sistema onde se pretende que vivamos não é perfeito. Afinal de contas, há milhões a morrer à fome sem necessidade nenhuma, já para não falar na falta de cuidados médicos e da exploração dos países pouco desenvolvidos.

Pronto, se isto estivesse a andar para a frente e as pessoas cada vez tivessem mais direitos sociais e liberdade, eu calava-me, mas... de há uns trinta/vinte anos para cá, parece que se está a andar para atrás. A tão falada constituição europeia, por exemplo, relega para segundo plano os direitos laborais e o aumento do poder participativo directo e foca sobretudo aspectos como a liberdade total do mercado, a redução da despesa pública do estado, enfim, uma apologia do laissez faire, laissez passer.

Quer dizer, o comunismo de facto falhou, mas o capitalismo também vai pelo mesmo caminho...

Ricardo Alves disse...

André Militão,
na minha opinião a luta política que realmente interessa é a laicista, e essa não pode ser subordinada a lutas pela ordem económica, quanto mais não seja porque esta última está sempre dependente dos avanços tecnológicos, das conjunturas demográficas e ambientais, etc.

Anónimo disse...

Vivam todos!
É a primeira vez que comento aqui.
E estou aqui para continuar uma conversa com o André Militão, procedendo do Diário Ateísta, pois que este blogue, Esquerda Republicana, publicou primeiramente o artigo epigrafado.

Eh, pá, está-se bem aqui nesta caixa... luminosa (melhor que a outra...), com bom tamanho de letra (melhor que o outro...), boa gente...
É pena eu só estar aqui de passagem...

Anónimo disse...

ANDRÉ MILITÃO disse:

1- “Porém, há-de concordar comigo que o sistema em que hoje vivemo, ou melhor, o sistema onde se pretende que vivamos não é perfeito.”

Não há sistemas perfeitos, meu caro André Militão.
O caminho faz-se caminhando…

2- “Afinal de contas, há milhões a morrer à fome sem necessidade nenhuma, já para não falar na falta de cuidados médicos e da exploração dos países pouco desenvolvidos.”

Eles morrem de fome porque são pobres, mentalmente pobres, antes de mais… daí o pouco engenho e pouco labor que aplicam nas suas vidas…
O Ocidente rico não tem a obrigação de sustentá-los e já faz, quiçá, demasiado por eles, “ajudando” tais preguiçosos e corruptos…

3- “Pronto, se isto estivesse a andar para a frente e as pessoas cada vez tivessem mais direitos sociais e liberdade, eu calava-me, mas... de há uns trinta/vinte anos para cá, parece que se está a andar para atrás. “

As pessoas vão tendo liberdade, depende do país ou da civilização em apreço…
Quanto aos direitos sociais… não sei o que é, mas presumo que seja pedir subsídios e intervencionismos ao Estado tutelar …
Eu prefiro a liberdade e autonomia dos indivíduos e sua livre associação para criarem empresas, riquezas, iniciativas que lhes gratifiquem as suas vidas, numa base contratual, com intervenção mínima do Estado, essa instituição espoliadora e opressora.
A mim parece-me que, “de há uns trinta/vinte anos para cá”, a coisa é que tem andado mais para a frente, e não para trás, com o fim do socialismo e a instauração dum sistema liberal e capitalista alargado, mais proveitoso para os povos e mais à feição da natureza humana, senão o socialismo teria continuado e o capitalismo definhado…

4- “A tão falada constituição europeia, por exemplo, relega para segundo plano os direitos laborais e o aumento do poder participativo directo e foca sobretudo aspectos como a liberdade total do mercado, a redução da despesa pública do estado, enfim, uma apologia do laissez faire, laissez passer.”

A constituição europeia tinha coisas más e coisas boas e terá, quando for instituída, coisas boas e coisas más…
Não é exactamente o “laissez faire, laissez passer”, de há 200 anos, mas será a antecâmara dos futuros Estados Unidos da Europa, que será um bom contraponto ao poderio asiático e norte-americano, se os nacionalismos europeus, esses carcinomas inibitórios do desenvolvimento e livre circulação de pessoas e bens, deixarem…
…Com maior liberdade para as pessoas se associarem e cooperarem, em termos empresariais e das suas vidas privadas e com menos Estado metediço…

5- “Quer dizer, o comunismo de facto falhou, mas o capitalismo também vai pelo mesmo caminho...”

Não, meu caro Militão, o capitalismo não falhou nem falhará nunca, porque é o sistema mais coadunado com a condição humana…
… Como se tem visto…

Anónimo disse...

"Eles morrem de fome porque são pobres, mentalmente pobres, antes de mais… daí o pouco engenho e pouco labor que aplicam nas suas vidas…
O Ocidente rico não tem a obrigação de sustentá-los e já faz, quiçá, demasiado por eles, “ajudando” tais preguiçosos e corruptos…"

Yep, makes sense...


"Não, meu caro Militão, o capitalismo não falhou nem falhará nunca, porque é o sistema mais coadunado com a condição humana…"

O que é que os padres e os reizinhos diziam do ancient regime?

"Não há sistemas perfeitos, meu caro André Militão.
O caminho faz-se caminhando…"

Caminhando para onde? Para trás? Se o marxismo está falido, o que há a dizer do liberalismo que se tenta agora implementar.


P.S. Por direitos sociais não me refiro a subsidiozinhos, mas sim ao direito a um sistema de saúde e de educação públicos bem organizados e gratuitos para as pessoas "mentalmente pobres" como você lhes chama. Refiro-me ao direito a uma justiça célere e barata que dê um tratamento preferencial ao trabalhador, uma vez que este está dependente do patrão para subsistir, etc.

Anónimo disse...

ANDRÉ MILITÃO disse:

1- “O que é que os padres e os reizinhos diziam do ancient regime?”

Não percebi.

2- “Caminhando para onde? Para trás? Se o marxismo está falido, o que há a dizer do liberalismo que se tenta agora implementar.”

Para trás… para a frente… para todo o lado…
O indivíduo e os grupos é que devem decidir…
Não conheces aquele dito do Lenine de que, às vezes, é preciso dar um passo atrás para poder dar 2 em frente…

3- “… mas sim ao direito a um sistema de saúde e de educação públicos bem organizados e gratuitos para as pessoas "mentalmente pobres" como você lhes chama.”

Eu não me estava a referir aos pobres de cá, mas aos pobres do estrangeiro, visto que tu tinhas aludido aos “milhões a morrer à fome (…) já para não falar na falta de cuidados médicos e da exploração dos países pouco desenvolvidos.”

Isso da saúde e educação gratuitas é um mito socialista.
Se é o Estado tutelar, espoliador e opressor, que paga, quem é que paga ao Estado?!
Quem quer saúde e educação deve pagar. Quem não pode pagar, deve ser ajudado com subsídios, porque ninguém deve privar-se de saúde e educação, só porque não tem dinheiro.
Quem pode, paga, para não viver à custa dos subsídios estatais.
As transferências subsidiárias de dinheiro devem ser para os mais pobres e incapazes e não para classes médias ou altas, mais ou menos desafogadas, que auferem as gratuitidades do Estado.
O princípio utilizador-pagador deve prevalecer.
Não há cá recolha de impostos, em geral, para subsidiação geral.
Quem quer, paga, esforça-se e coopera para alcançar o que pretende.
A relação impostos/contribuições-benefício deve ser o mais directa possível, para evitar oportunismos e parasitismos (a começar pelo Estado gordo de sinecuristas…), e levar, concomitantemente, à redução progressiva de impostos…

4- “Refiro-me ao direito a uma justiça célere e barata que dê um tratamento preferencial ao trabalhador, uma vez que este está dependente do patrão para subsistir, etc.”

A justiça está num estado tão lastimoso, que demorará anos a pô-la em ordem, em Portugal. Só com reformas radicais e contundentes, o que, portanto, não é para este pessoal político…
De resto, o “célere” e “barata” leva a pagamentos pelos interessados, sobretudo a pagamentos pelos que perderam a causa ou foram condenados e a um sistema de seguros que assegure indemnizações às vítimas.
Nada de impostos, em geral, para financiamentos, em geral, pois que é o caminho dos oportunistas e sinecuristas estatais…
Sobre a justiça, haveria muito mais para dizer, mas, por ora, fico-me por aqui.

Anónimo disse...

Mas se quisermos ter uma discussão mais profunda, importa discutir a adequação do capitalismo, ou mais concretamente, do liberalismo à condição humana.

Como Marx afirma várias vezes, o liberalismo teve um contributo absolutamente notável para a História, na medida em que acabou com a exploração do Homem pelo Homem na política. Ou seja, os homens deixaram de poder governar com base em pressupostos divinos e direitos de nascimento e passaram a poder fazê-lo apenas com um mandato expresso do povo. Assim, qualquer pessoa, em teoria, podia participar na vida política.

Pode mesmo dizer-se que se tratou de uma racionalização da esfera política e social. Criam-se leis, aplicáveis para qualquer cidadão, independentemente do seu estatuto, e concebidas por cidadãos com mandatos atribuídos pelo povo através do sufrágio universal.

Com efeito, o grande contributo de Marx e Engels para a história do pensamento político, social e económico foi o estudo dos modelos de sociedade até então experimentados, com especial ênfase para o capitalismo.

Marx constatou brilhantemente que apesar da exploração do homem pelo homem na esfera política, continuava a existir outra espécie de exploração, desta vez económica, que impedia que todos os homens gozassem dos mesmos direitos essenciais, nomeadamente o direito a viver condignamente.

Marx teorizou então, juntamente com Engels, que se a racionalização do social e da política levou ao desenvolvimento e à melhoria das condições de vida da população em geral, a racionalização do meio económico faria o mesmo. Para tal, era necessário que o Estado tomasse à sua tutela todos os meios de produção, distribuindo a riqueza produzida de forma a satisfazer as necessidades de todos os cidadãos.

Apesar dos constantes argumentos infundados do neoliberalismo de que a condição humana requer (por qualquer motivo desconhecido) que existam ricos e pobres e que ambos sejam tratados de forma igual (apesar de serem diferentes), faz todo o sentido que o mercado, à semelhança do Direito e de toda a esfera social seja racionalizado (ao contrário do que defende o liberalismo puro), acabando assim com muitos dos problemas das sociedades actuais (que de facto foram resolvidos na União Soviética), tais como o desemprego, a acumulação massiva de capitais e a exclusão social que deriva da existência de meios sociais muito empobrecidos.

O argumento do liberalismo é mais ou menos aquele que o João Pedro Moura defende. Parte do darwinismo social que pressupõe que as mesmas leis que regulamentam a natureza, devem reger as sociedades humanas. Assim, os mais aptos devem "mandar" na sociedade e devem ser recompensados pelas suas aptidões, ao passo que os mais fracos e menos aptos devem servir os primeiros.

Porém, este argumento tem duas grandes falhas (evidentes).

A primeira é o facto de partir do princípio de que todos os homens são iguais em oportunidades (o famoso direito de igualdade que figura na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão proveniente da revolução de 1789). Com efeito, os homens não tem igualdade de oportunidades e isso não se deve unicamente (como pretende o liberalismo) à "mentalidade empobrecida" de uns e à inteligência resplandecente de outros. Os factores sociais, que assumem uma importância capital na formação da inteligência e da personalidade de cada um, condicionam as capacidades de cada um goza. Apenas por uma enorme ignorância (que eu não estou habituado a ver nos comentários do João Pedro Moura) se pode concluir que a fome em África é uma consequência da mentalidade pobre dos africanos. Ainda para mais tendo nós (o mundo ocidental) explorado - e ainda hoje o fazemos através de grandes multinacionais - a mão de obra e os recursos desses países. Nós cometemos autênticos genocídios de tribos africanas e dividimos a nosso bel-prazer o continente negro. Como é que o João pretende que esses países se desenvolvam se a única ajuda que lhes damos são dinheiros (que muitas vezes são desviados por pessoas corruptas de ambos os lados) e comida. O que eles precisam é de meios tecnológicos e de instrução técnica para que possam eles produzir a sua própria riqueza.

Mas claro, isso passaria por quebrar o princípio irracional de que o mercado internacional deve ser completamente livre. Se o mercado for completamente livre, os países com grandes recursos mas sem capacidades objectivas (materiais) de os explorarem serão, obviamente anexados (economicamente) pelos países desenvolvidos.

A segunda grande falha do darwinismo social, ou melhor, paradoxo é que, apesar de afirmar que o mercado deve ser totalmente livre, permitindo o desenvolvimento dos melhores e a eliminação dos piores, não faz a mesma afirmação em relação à esfera social. Por exemplo, é bem frequente vermos os neoliberais da nossa praça defenderem penas criminais cada vez mais pesadas (apesar de não serem levados a sério pelos juristas, excepto nos EUA), ao mesmo tempo que defendem a redução do peso do Estado social e dos direitos sociais.

Em que é que ficamos, se o mercado não deve ser regulado pelo Estado de forma racional de modo a satisfazer as necessidades de todos (embora à custa do crescimento maior de alguns), por que é que deve fazer leis que impeçam que os mais poderosos de actuarem como quiserem dentro da sociedade, tal como ocorria no ancien régime.

Se o liberalismo contribui, e bem, para a racionalização do poder político e legislativo, por que não avançamos para o patamar seguinte. Por que motivo não deverá o Estado racionalizar o mercado e controlar os meios de produção para assegurar o bem-estar colectivo, criando assim uma sociedade mais justa.

Este sim, é o verdadeiro contributo de Marx para o pensamento ideológico da segunda metade do século XIX e do século XX.

O argumento, à falta de melhor termo, do João Pedro Moura de que o capitalismo é o fim da História é patético e infundado. Que é isso da condição humana? Veja os estudos de qualquer psicólogo moderno, a condição humana é fruto quer do património genético, quer do meio social. Ou seja, não é algo de metafísico oriundo de um desígnio divino. Muda conforme os tempos e, mais importante, conforme as condições de vida de cada indivíduo.

Se há 800 anos perguntássemos a um vulgar servo da gleba se desejava ser livre e participar na formação de leis, ele acusar-nos-ia de blasfémia, pois a condição humana, ou melhor, a sua condição era de servo que apenas pretendia sobreviver, já que o poder de governar e fazer leis era do rei por origem divina e este transmitia-o consoante a sua vontade aos nobres da sua eleição.

Se a sua idea de condição humana envolve porventura a submissão do homem e a necessidade de uns se sobreporem aos outros, através da exploração, então, vá para o raio que o parta, que eu rejeito essa ideia veementemente, tal como rejeito a ideia de submissão a divindades inexistentes que os crentes afirmam fazer parte da condição humana.

Caso contrário, terá de me explicar de que modo é que o capitalismo preenche a condição humana e, mais importante, por que razão é que a condição humana, ao contrário da mentalidade, da inteligência e da personalidade, não é afectada pelo meio.

Que o João me diga que não faz qualquer sentido que o operariado seja a classe dominante num modelo de sociedade socialista (se por socialismo entendermos a regulação do aparelho produtivo e a concentração dos meios produtivos no Estado), eu entendo. Assim como entendo e concordou que a URSS falhou.

Contudo, negar o contributo desta para a construção das sociais-democracias que hoje existem na Europa é desonesto. Se não fora pela força dos movimentos operários que se geraram nos países industrializados e da existência de um estado socialista, nunca teriam sido criados os direitos laborais que hoje tomamos (ou talvez não) por garantidos.

É óbvio que o marxismo não pode ser aplicado ipsis verbis, mas apesar disso o capitalismo baseia-se ainda na exploração económica do homem pelo homem, assegurada pela propriedade privada e pela ausência do Estado no mercado, o que, em última análise, resulta em desigualdades sociais. Para si, estas desigualdades são fruto de algo metafísico e inexplicável que designa por "condição humana", para mim são sinónimos de injustiça.

Concluindo, não é pelo João, ou pelo Pacheco Pereira, ou pelo João Carlos Espada, ou por mil e um professores catedráticos de economia dizerem que o marxismo é uma ideologia ultrapassada, que isso se torna verdade.

Os argumentos que vejo para fundamentar tão peremptória afirmação são sempre os mesmos:

1º A URSS falhou, ergo, o comunismo está ultrapassado. Também conhecido por, Estaline era um assassino de massas, logo, o Marx e o comunismo vão arder no inferno!
2º O capitalismo é o fim da história porque é um sistema funcional e permite às pessoas distinguirem-se pelas suas capacidades, coadunando-se com a "condição humana" - seja lá o que isso for.
3º O Estado não sabe gerir empresas. (nota, a este não respondo porque não é um argumento, mas sim uma petição de princípio. Note-se que o grande crescimento económico que se seguiu à 2ª Guerra Mundial foi conseguido á custa de uma intervenção massiva dos Estados europeus na economia. O aparelho produtivo de alguns estados como a França, ou a Suécia chegou a atingir 50% da produção de riqueza desses países. Aliás, o estado só deixou de saber gerir empresas, curiosamente, quando as começou a privatizar em massa. Além do mais, as empresas privadas vão à falência todos os dias e não me vêem a gritar que os privados não sabem gerir empresas, pois não? A única explicação minimamente lógica que me ocorre para a afirmação "O Estado não sabe gerir empresas" é de que para ser bem gerida, a empresa tem de visar unicamente a acumulação de capital, mas isso é uma interpretação subjectiva, para mim, uma empresa bem gerida é aquele que dá lucros mas também dá segurança e estabilidade económica aos seus empregados, mas isto sou eu que sou estúpido.)
4º Se o Estado gerir empresas, faz concorrência desleal ao sector privado.


O primeiro argumento não é difícil de rebater. Quantos anos esteve o capitalismo à espera para se impor? Quantos avanços e recuadas empreendeu a burguesia antes de ter capacidade para assumir o poder político (com a Revolução Francesa)? E o que é que se seguiu à Revolução Francesa? Um imperador/ditador chamado Bonaparte.
Pelo contrário, se o critério para o pensamento marxista estar ultrapassado são as atrocidades cometidas no regime da URSS (e outros) ou a falta de liberdade nestes regimes para quem nesses regimes discordasse da opinião vigente, então, o capitalismo está mais que ultrapassado (ironia)... Vejam-se as atrocidades cometidas pelo império britânico nas províncias ultramarinas e, se bem me lembro, uma das primeiras coisas que se fez na Revolução Francesa foi decapitar o Luízinho e a Aninha, aos quais se seguiram dezenas de outros nobres. Aliás, a democracia moderna tem origem no Estado Social (e negar o contributo essencial do marxismo para a sua construção é idiota), que alguns afirmam estar falido. Génios! Num sistema que pressupõe a detenção de uma boa parte dos meios de produção no sector público, de modo a assegurar o bem estar colectivo, parece-me óbvio que, ao alienar o património (quase) todo do Estado como tem sido feito desde Tatchers, Helmut Kohls, Reagans and friends, o modelo de Estado social não tem outra opção senão falir.

Porém isto não se deve a uma contrariedade inerente ao modelo de Estado social, mas sim à opção de cariz neoliberal de alienar a capacidade produtora do Estado e, por conseguinte, a sua capacidade de intervenção na economia.

E agora dizem-me assim, ah e tal!, mas a União Europeia, mercado do livre e o camandro! Mas isso são tretas. A União Europeia não tinha necessariamente de ir pelo caminho do neoliberalismo, ou será que tinha?

Uma das críticas mais fascinantes de Marx à social-democracia, porque nos dias de hoje se tornou claramente realidade, é a de que apesar de ser uma enorme melhoria face ao liberalismo puro (pois garantia quer a liberdade individual, quer a liberdade (ou direitos) sociais), como a propriedade ainda não estava completamente sob a tutela do Estado, eventualmente acabaria por ceder ao (neo)liberalismo, uma vez que não abolia o que, no seu entender, constituía a causa da injustiça social - a propriedade privada -, limitando-se a mitigar os seus efeitos.


Ao 2º argumento já respondi muito antes. Não creio numa "condição humana" que ultrapasse o processo de socialização e não vejo a sua ligação com o capitalismo.

O 4º argumento, é verdade que ao gerir empresas o Estado faz concorrência desleal ao sector privado. Porém, note que esta crítica só faz sentido dentro da lógica capitalista. Num estado onde não existam empresas privadas (o que, vão se lá lixar, não é assim tão difícil de imaginar), não há esse problema.

Muitas vezes, faz-se uma crítica desonesta ao marxismo, que ignora a História das sociedades, afirmando a incompatibilidade de um sistema onde a propriedade está concentrada numa só instância (o Estado) com a liberdade de expressão. Isto aconteceu em todas as experiências socialistas até agora, mas, isso não resultou do facto da propriedade estar concentrada no Estado, não há provas disso. É muito mais racional atribuir o feroz regime ditatorial estalinista à constante luta da União Soviética contra os grandes países capitalistas, favorecendo a formação de um regime militarista anti-democrático, no qual os oficiais mais inflexíveis chegavam ao poder.

Além do mais, é certo e sabido que o actual modelo económico tende para a acumulação massiva de capitais nas grandes empresas, em detrimento das pequenas. Pelo que, em vez de termos um Estado que controla todos os meios de produção, temos uma dúzia de empresas multinacionais que controlam quase tudo.


Para terminar, que já começo a ter fome, para mim, é secundário discutir a possibilidade ou não de realizar o comunismo, o que é fundamental é aproveitar os vários contributos, quer do liberalismo, quer do marxismo, e estruturar o nosso pensamento político a partir daí. Dizer que o marxismo está ultrapassado não faz sentido, a não do ponto de vista de Fukuyama
de que a história acabou e as ideologias morreram (o que em si constitui uma ideologia) e o melhor que conseguimos é este mundo (o que poderia muito bem ter sido dito a qualquer outro momento da História por qualquer velho do Restelo). Pois à merda com Fukuyama, se as ideologias morreram porque é que se está hoje a fazer uma clara apologia do neoliberalismo em detrimento do actual modelo social (que para Fukuyama era o fim da História).

Neste momento só há duas (ou três se considerarmos a social-democracia) ideologias que compreendem a globalidade das sociedades, o marxismo e o liberalismo.

Não nego que o marxismo tenha de ser actualizado, mas por agora, parece-me a análise mais realista e estruturada da realidade económica e social.

Se o futuro é o socialismo, comunismo, ou quaisquer outros ismos que lhe queiram chamar, pouco me importa. O que eu sei é que este é um sistema injusto e tende à concentração do poder económico e políticos nos grandes grupos de capital, o que põe em causa a democracia e os direitos sociais. E isto, de alguma forma, seja daqui a dez, vinte, cinquenta ou cem anos, vai ter de evoluir para um sistema mais justo do ponto de vista social que distribua eficazmente a riqueza de acordo com as necessidades dos cidadãos. Ora, sendo que todo o Homem é um produto do meio, a mim parece-me que o caminho para isso passa por uma maior detenção de meios de produção por parte dos Estados (seja ela feita de forma gradual ou brusca), mas em concreto não sei.

Não faz sentido andar a berrar pela instituição de um estado socialista neste momento da História em concreto. Mas é absolutamente essencial que se tenha em conta o conceito de justiça social introduzido por Marx e Engels e que se lute pela manutenção dos direitos sociais adquiridos, quanto mais não seja para alertar os partidos no poder que não podem fazer aquilo que bem entendem a troco de financiamento e de lugares estratégicos em grandes empresas.


Um abraço,

André Militão

Anónimo disse...

1- “Marx constatou brilhantemente que apesar da exploração do homem pelo homem na esfera política, continuava a existir outra espécie de exploração, desta vez económica, que impedia que todos os homens gozassem dos mesmos direitos essenciais, nomeadamente o direito a viver condignamente. “

COMENTÁRIO – O que são “direitos essenciais” e o “direito a viver condignamente”, na perspectiva marxista?

2- “Marx teorizou então, juntamente com Engels, que se a racionalização do social e da política levou ao desenvolvimento e à melhoria das condições de vida da população em geral, a racionalização do meio económico faria o mesmo. Para tal, era necessário que o Estado tomasse à sua tutela todos os meios de produção, distribuindo a riqueza produzida de forma a satisfazer as necessidades de todos os cidadãos.”

COMENTÁRIO – Mas verificou-se, posteriormente e na prática socialista, que não havia grande “riqueza produzida” (era mais distribuição da pobreza…)e que o sistema favorecia a formação duma casta burocrática, de vida desafogada, que reprimia a grande maioria da população…
… E o que são as “necessidades de todos os cidadãos”???!!!
Quem deveria definir essas “necessidades”???!!!
Estás a ver, meu caro André, os efeitos do totalitarismo comunista?...
Estás a ver, meu caro André, as vantagens do liberalismo capitalista?...

3- “Apesar dos constantes argumentos infundados do neoliberalismo de que a condição humana requer (por qualquer motivo desconhecido) que existam ricos e pobres e que ambos sejam tratados de forma igual (apesar de serem diferentes), faz todo o sentido que o mercado, à semelhança do Direito e de toda a esfera social seja racionalizado (ao contrário do que defende o liberalismo puro), acabando assim com muitos dos problemas das sociedades actuais (que de facto foram resolvidos na União Soviética), tais como o desemprego, a acumulação massiva de capitais e a exclusão social que deriva da existência de meios sociais muito empobrecidos.”

COMENTÁRIO - a) A “condição humana”, na perspectiva liberal, não requer, ao contrário do que dizes, “que existam ricos e pobres”. Não é essa a questão. O liberalismo requer a liberdade política, económica, enfim, geral, para as pessoas prosseguirem as suas actividades, numa base contratual e cívica.

b) É certo que o sistema socialista resolveu, em geral, o problema do desemprego e da exclusão social, mas decretando o trabalho obrigatório e juntando as pessoas nas empresas, mesmo sem terem um trabalho real, pois que tinham, sobretudo, um emprego, e distribuindo a pobreza por todos, ao ponto de ter de se esperar 10 e mais anos por um apartamento (vivia-se, frequentemente, em apartamentos colectivos…) e, mais ou menos o mesmo tempo por um automóvel de fraca qualidade e inferior nível tecnológico aos dos seus congéneres ocidentais, pois que o problema do desenvolvimento tecnológico era pouco importante para a mentalidade comunista, e as técnicas mais manuais sempre empregavam mais gente…
Acresce que a falta de estímulo material gerava pouco génio inventivo e muito conformismo, acabando por agravar o estado geral da sociedade e minguar o abastecimento das lojas…
Só em 2 sectores é que havia vencimentos mais elevados e outros estímulos materiais: a propaganda (imprensa, edição livreira, televisão e rádio) e indústria de armamento, provocando logo maior eficácia e desenvolvimento tecnológico…

c) Ao contrário dos liberalismos tradicionais, eu defendo uma correcta e eficaz intervenção do Estado para acabar, radicalmente, com o desemprego e outras maleitas sociais, sem sair do liberalismo nem fomentar parasitismos…
Eu tenho solução, relativamente fácil, para acabar com esses problemas, obrigando os cidadãos ao trabalho, sob pena de exclusão progressiva e castigadora…

4- “O argumento do liberalismo é mais ou menos aquele que o João Pedro Moura defende. Parte do darwinismo social que pressupõe que as mesmas leis que regulamentam a natureza, devem reger as sociedades humanas. Assim, os mais aptos devem "mandar" na sociedade e devem ser recompensados pelas suas aptidões, ao passo que os mais fracos e menos aptos devem servir os primeiros.”

COMENTÁRIO – E por que é que “as mesmas leis que regulamentam a natureza” não deveriam reger “as sociedades humanas”???!!! Será que não somos animais???!!! Será que não fazemos parte da natureza???!!! O facto de sermos animais racionais concede-nos outro trato com os problemas, levando-nos à organização cívica, mas tal não desmerece o primado normal dos mais aptos, dos mais laboriosos e engenhosos. Os outros deverão ficar, normalmente, para trás… e ficar para trás não é sinónimo de vida indigna, mas condigna. É a vida!

5- a)“A primeira é o facto de partir do princípio de que todos os homens são iguais em oportunidades (…). Com efeito, os homens não tem igualdade de oportunidades e isso não se deve unicamente (como pretende o liberalismo) à "mentalidade empobrecida" de uns e à inteligência resplandecente de outros. Os factores sociais, que assumem uma importância capital na formação da inteligência e da personalidade de cada um, condicionam as capacidades de cada um goza.”

COMENTÁRIO – André, o que as pessoas devem ter todas é “igualdade de oportunidades” traduzidas pela igualdade na lei, sem privilégios para ninguém. O resto é a competição cívica…
O que é que querias fazer?! Pôr o Estado a igualizar inteligências e aptidões para o trabalho, transformando todos os cidadãos numa espécie de robots?! Achas que era possível???!!! Como se pode tentar igualizar as diferenças naturais, portanto biológicas, entre as pessoas???!!! Ou pensas que os “factores sociais” decorrem de quê?!
Os países socialistas tentaram fazer uma coisa parecida. Falharam!!!

b) “Apenas por uma enorme ignorância (que eu não estou habituado a ver nos comentários do João Pedro Moura) se pode concluir que a fome em África é uma consequência da mentalidade pobre dos africanos. Ainda para mais tendo nós (o mundo ocidental) explorado - e ainda hoje o fazemos através de grandes multinacionais - a mão de obra e os recursos desses países.”

COMENTÁRIO – “A fome em África” é, realmente, “uma consequência da mentalidade pobre dos africanos.”
O capitalismo retirou em massa gente da pobreza, desde o séc. XIX para cá, e continua a retirar. Com base inicial na mentalidade engenhosa e laboriosa dos europeus.
Os africanos sempre estiveram mais voltados para o tribalismo e para a economia de subsistência…
Talvez porque também o colonialismo se tivesse iniciado tarde em África é que esta gente está no estado em que está…
Foram os europeus colonialistas que impeliram os africanos a formar sociedades modernas e a dar-lhes melhor sistema de vida, mas que eles não conseguem manter, sem uma intervenção neocolonial. Porque são mentalmente pobres, inaptos e ineptos, conforme se pode examinar ao longo da História. O PNB per capita baixa constantemente em África, e só não baixa mais devido à valorização das matérias-primas, mormente do petróleo.
Vivem pior do que nos tempos coloniais! A África negra é desemprego, doença, fome, guerra, miséria e morte! Cada vez pior! Vai ser um desastre terrível! E um regresso ao tribalismo de subsistência, ruralista e miserável! Aliás, estão nesse caminho vários países africanos, que já não têm organização estatal, mas oligarquias feudais…

6- “Nós cometemos autênticos genocídios de tribos africanas e dividimos a nosso bel-prazer o continente negro. Como é que o João pretende que esses países se desenvolvam se a única ajuda que lhes damos são dinheiros (que muitas vezes são desviados por pessoas corruptas de ambos os lados) e comida. O que eles precisam é de meios tecnológicos e de instrução técnica para que possam eles produzir a sua própria riqueza.”

COMENTÁRIO – a) Os africanos já faziam genocídios entre eles, antes dos europeus se instalarem, e eram aqueles que vendiam os escravos, que faziam nas guerras, aos europeus …

b) O problema é que os africanos não assimilam nenhum tipo de ajuda, capitalizando-a para o progresso…
Nada funciona em África, duradouramente, sem a ajuda dos técnicos e capitais estrangeiros…

7- “Mas claro, isso passaria por quebrar o princípio irracional de que o mercado internacional deve ser completamente livre. Se o mercado for completamente livre, os países com grandes recursos mas sem capacidades objectivas (materiais) de os explorarem serão, obviamente anexados (economicamente) pelos países desenvolvidos.”

COMENTÁRIO – André, ao longo da História, houve países que se adiantaram; outros fizeram o arranque da revolução industrial mais tarde e alcançaram os primeiros; outros ficaram na segunda ou terceira linhas; outros estão a aparecer agora e a conquistar cada vez mais mercados…
Só o mercado livre, o mais livre possível, é que favorece a livre troca e o livre desenvolvimento. Quem não quiser isto… que fique de fora a apreciar e a ver o que lhe acontece…

8- “A segunda grande falha do darwinismo social, ou melhor, paradoxo é que, apesar de afirmar que o mercado deve ser totalmente livre, permitindo o desenvolvimento dos melhores e a eliminação dos piores, não faz a mesma afirmação em relação à esfera social.“

COMENTÁRIO – Um verdadeiro liberal defende a liberdade, o nosso bem cívico mais precioso, em todas as esferas de actuação…

9- “Em que é que ficamos, se o mercado não deve ser regulado pelo Estado de forma racional de modo a satisfazer as necessidades de todos (embora à custa do crescimento maior de alguns), por que é que deve fazer leis que impeçam que os mais poderosos de actuarem como quiserem dentro da sociedade, tal como ocorria no ancien régime.”

COMENTÁRIO – O liberalismo não tem nada que ver com o Antigo Regime, que era iliberal, e o limite é o direito cívico, comum a todos.

10 – “Se o liberalismo contribui, e bem, para a racionalização do poder político e legislativo, por que não avançamos para o patamar seguinte. Por que motivo não deverá o Estado racionalizar o mercado e controlar os meios de produção para assegurar o bem-estar colectivo, criando assim uma sociedade mais justa.”

COMENTÁRIO - André, até parece que não te chegaram décadas de “bem-estar colectivo” socialista, que foi… à falência …
… Precisamente, porque essa “racionalização do mercado” e controlo dos meios de produção é contrária à condição humana… criando uma sociedade mais injusta, como se viu…

11- O argumento, à falta de melhor termo, do João Pedro Moura de que o capitalismo é o fim da História é patético e infundado. Que é isso da condição humana?

COMENTÁRIO – Eu nunca disse que o capitalismo é o fim da História…
A condição humana é o conjunto de características biológicas e sociais, inerentes à espécie humana…

12- “Veja os estudos de qualquer psicólogo moderno, a condição humana é fruto quer do património genético, quer do meio social. Ou seja, não é algo de metafísico oriundo de um desígnio divino. Muda conforme os tempos e, mais importante, conforme as condições de vida de cada indivíduo.”
COMENTÁRIO – Ah, grande André! É assim mesmo! Agora sim, estás no caminho dos pressupostos do liberalismo…

13- “Se a sua idea de condição humana envolve porventura a submissão do homem e a necessidade de uns se sobreporem aos outros, através da exploração…”

COMENTÁRIO - Não! Não é de submissão, ou sobreposição ou exploração.
É de liberdade contratual que se trata…
Todavia, não há regimes perfeitos, donde, também não haverá contratos perfeitos. Mas o mais imperfeito é o contrato socialista…

14 – “Caso contrário, terá de me explicar de que modo é que o capitalismo preenche a condição humana e, mais importante, por que razão é que a condição humana, ao contrário da mentalidade, da inteligência e da personalidade, não é afectada pelo meio.”

COMENTÁRIO – a) O capitalismo “preenche” a condição humana porque é o que está mais em conformidade com a mesma, como se vê…
É sempre uma questão de liberdade, contra o totalitarismo…

b) Tudo é afectado pelo meio: mentalidade, inteligência, personalidade…
É da interacção meio-indivíduo que poderá haver progresso…
Nuns casos, a inteligência e a acção do indivíduo são mais determinantes na transformação do meio e na consecução de progressividade de vida e bem-estar; noutros casos, a menor inteligência e menor acção dos indivíduos remete-os para a conformidade social e diminui ou não há progresso…
É que os indivíduos também fazem parte da selecção natural e da competição dos mais aptos, pois também são animais, isto é, natureza…

15 – “Contudo, negar o contributo desta para a construção das sociais-democracias que hoje existem na Europa é desonesto. Se não fora pela força dos movimentos operários que se geraram nos países industrializados e da existência de um estado socialista, nunca teriam sido criados os direitos laborais que hoje tomamos (ou talvez não) por garantidos.”

COMENTÁRIO – É verdade! É a lei da dialéctica…
O socialismo “enriqueceu” o capitalismo e tornou-o mais forte…

16- “É óbvio que o marxismo não pode ser aplicado ipsis verbis, mas apesar disso o capitalismo baseia-se ainda na exploração económica do homem pelo homem, assegurada pela propriedade privada e pela ausência do Estado no mercado, o que, em última análise, resulta em desigualdades sociais. Para si, estas desigualdades são fruto de algo metafísico e inexplicável que designa por "condição humana", para mim são sinónimos de injustiça.”

COMENTÁRIO – Essas desigualdades não são algo de metafísico, mas sim de físico e de condição humana.
Metafísicas é que são as tentativas de acabar com essas desigualdades…
Tão metafísicas que… faliram…
Por isso é que o André diz que “o marxismo não pode ser aplicado ipsis verbis”…
…Ao contrário do capitalismo…





17 - "O primeiro argumento não é difícil de rebater. Quantos anos esteve o capitalismo à espera para se impor? Num sistema que pressupõe a detenção de uma boa parte dos meios de produção no sector público, de modo a assegurar o bem estar colectivo, parece-me óbvio que, ao alienar o património (quase) todo do Estado como tem sido feito desde Tatchers, Helmut Kohls, Reagans and friends, o modelo de Estado social não tem outra opção senão falir."

COMENTÁRIO – a) O capitalismo é tão velho como a Humanidade. O liberalismo é que é mais recente.
Só a conjugação dos dois é que reforçou e aperfeiçoou o primeiro…

b) Não, André! O problema é tu pensares que a apropriação estatal dos meios de produção é que assegura o “bem-estar colectivo”…

18 – “E agora dizem-me assim, ah e tal!, mas a União Europeia, mercado do livre e o camandro! Mas isso são tretas. A União Europeia não tinha necessariamente de ir pelo caminho do neoliberalismo, ou será que tinha?”

COMENTÁRIO – O que é o neoliberalismo???!!!

19 – “Ao 2º argumento já respondi muito antes. Não creio numa "condição humana" que ultrapasse o processo de socialização e não vejo a sua ligação com o capitalismo.”

COMENTÁRIO – Enfim, se queres negar a realidade… é lá contigo!...

20- "Muitas vezes, faz-se uma crítica desonesta ao marxismo, que ignora a História das sociedades, afirmando a incompatibilidade de um sistema onde a propriedade está concentrada numa só instância (o Estado) com a liberdade de expressão. Isto aconteceu em todas as experiências socialistas até agora, mas, isso não resultou do facto da propriedade estar concentrada no Estado, não há provas disso. É muito mais racional atribuir o feroz regime ditatorial estalinista à constante luta da União Soviética contra os grandes países capitalistas, favorecendo a formação de um regime militarista anti-democrático, no qual os oficiais mais inflexíveis chegavam ao poder."

COMENTÁRIO – Não, André, não é nada disso!
A concentração do poder político com o poder económico leva ao desastre, à ditadura, ao totalitarismo!

21 – “Além do mais, é certo e sabido que o actual modelo económico tende para a acumulação massiva de capitais nas grandes empresas, em detrimento das pequenas. Pelo que, em vez de termos um Estado que controla todos os meios de produção, temos uma dúzia de empresas multinacionais que controlam quase tudo.”

COMENTÁRIO – Os Estados capitalistas têm leis antimonopólio e antioligopólio…


22 –“ E isto, de alguma forma, seja daqui a dez, vinte, cinquenta ou cem anos, vai ter de evoluir para um sistema mais justo do ponto de vista social que distribua eficazmente a riqueza de acordo com as necessidades dos cidadãos.”

COMENTÁRIO - Quem define as “necessidades dos cidadãos”???!!! Quem deve “distribuir as riquezas”???!!!
Não te importas que sejam os cidadãos a definir isso, em cooperação cívica e livre, escolhendo e decidindo no mercado, incluindo o político, sem injunções dos Estados nem de vanguardismos metafísicos de pretensos iluminados???!!!