- «[A remodelação] "não tem dignidade para ocupar grande destaque político"» (Passos Coelho).
Assim se vê o respeito pelas pessoas com quem se colabora. Parece que o Salazar os despedia ou no intervalo da ópera ou com um bilhetinho.
«entre le fort et le faible, entre le riche et le pauvre, entre le maître et le serviteur, c’est la liberté qui opprime, et la loi qui affranchit.»
(Lacordaire)
Eu sou decididamente contra as mortes causadas em seres humanos. Acho-as obscenas. Também me insurjo contra o sofrimento e a morte provocados em animais. Mas impõe-se, nesta ocorrência de Beja, uma razão de justiça, com uma forte carga simbólica. Rompeu-se brutalmente um equilíbrio. Não se pode repor esse equilíbrio. É impossível, infelizmente, devolver a vida à pobre criança. Mas impõe-se dar-nos um sinal forte de que não estamos dispostos a conformar-nos, de forma nenhuma, com ataques mortais a seres humanos. Há uma razão de justiça, há uma razão de solidariedade, há uma razão de respeito pelos mortos. Há uma razão de consideração por nós próprios, enquanto pessoas. Esse cão deve ser abatido.Eu gostaria que alguém me explicasse como se pode escrever palavras destas, por um lado, e ser contra a pena de morte, por outro. Vão-me dizer os antropocentristas do costume que "uma vida humana é uma vida humana". Mas por acaso quando um assassino em série mata uma série de pessoas, como ouvimos falar de vez em quando, não há também "um equilíbrio que se rompe brutalmente" e que "não pode ser reposto"? Frases como "impõe-se dar-nos um sinal forte de que não estamos dispostos a conformar-nos, de forma nenhuma, com ataques mortais a seres humanos. Há uma razão de justiça, há uma razão de solidariedade, há uma razão de respeito pelos mortos" não se aplicariam no caso de um assassino em série porquê? Da minha parte, sou decididamente contra a pena de morte de seres humanos. Aceito a morte de animais domésticos que tenham assassinado humanos (já não a defendo para animais selvagens, mesmo em cativeiro). Este assunto é delicado mas, pense-se o que se pensar sobre a morte do cão Zico (e eu não estou aqui a referir-me a todos os defensores da morte do Zico), eu nunca a defenderia com argumentos destes.
Vi agora na Televisão que o Paulo Futre acaba de dobrar um filme para crianças. É extraordinário. Num país onde os actores profissionais precisam de contratos e de trabalho, qualquer pessoa que se notabilize em qualquer área pode substitui-los num trabalho que eles sabem fazer, estudaram e treinaram-se para isso e é a sua área profissional. A Lili Caneças já fez Tenessee Williams. Não sei quantas actrizes nesses meses estavam desempregadas. Ou a fazer papelinhos na TV para sobreviverem. Os ex-políticos ocupam cargos da área da Cultura, nas Fundações, etc, etc. Será que não há pessoas de Cultura para esses cargos? Por que é que um Reitor quando se reforma vai para casa e um banqueiro vai para administrador da Gulbenkian? Os criadores, os actores são uma espécie de ursos que vão para o circo presos por uma corda e quem ganha o dinheiro é o dono do circo, o dono do urso e o dono da corda. E se algum deles souber dar cambalhotas manda-o abater. Não será altura de dizermos que assim não vale. Eu estou farta. Não quero que nos dêem emprego, quero que não nos tirem os nossos.Compreendo as razões da atriz e concordo em certos aspetos, mas no essencial creio que não tem razão. Eu não tenho formação nenhuma em jornalismo, e trabalhei como jornalista científico em 2006; se o critério de Maria do Céu Guerra patente na sua última frase valesse, não teria tido esse trabalho, que muito prazer me deu, e que creio ter desempenhado bem. Mas alguma formação eu tinha (já era cientista, e era um cargo de jornalismo científico). O melhor contraexemplo é o de Susan Boyle, unanimemente considerada um grande talento vocal, descoberta acidentalmente num programa de televisão, e nunca teve aulas de canto. Seria melhor nunca ter sido descoberta? Outro exemplo é o da deputada e advogada Odete Santos, um talento histriónico natural, a atuar numa revista. Desde a célebre conferência do jogador chinês que se percebeu que o Paulo Futre tinha um talento natural para o entretenimento. Esse tipo de talento não requer preparação nem estudo. De resto, creio que entre as profissões intelectuais e/ou não-braçais há que distinguir as que requerem uma vocação (médico, cientista, historiador…) e as que requerem talento (ator, músico, pintor, futebolista…). Ao contrário das primeiras, as segundas podem ser exercidas, a um nível elementar, sem nenhum tipo de preparação que não seja o próprio talento, a ser apreciado pelo público. É claro que um cantor não pode cantar ópera sem anos de estudo; mas não há mal nenhum na Susan Boyle. È evidente que há uma grande diferença entre Lili Caneças representar Tenessee Williams no teatro e a Odete Santos fazer uma revista ou o Paulo Futre fazer uma telenovela ou uma dobragem de um desenho animado, num papel curto (é essa a confusão de Maria do Céu Guerra, que mistura tudo). Não digo que não compreenda a revolta e a frustração de Maria do Céu Guerra ao ver tantos colegas seus desempregados e Futre a desempenhar uma missão que ela acha, legitimamente, que seria melhor desempenhada por eles. Tão pouco irei cair no extremo cinismo de lhe responder que esses seus colegas, tão bem preparados para representarem os melhores dramaturgos, certamente sentir-se-iam frustrados ao dobrarem desenhos animados, como respondem certos engenheiros que dão aulas de física e matemática em politécnicos ao desculparem-se por promoverem mais um assistente e não contratarem mais um doutorado. Não, não direi isso. Apenas lhe faço ver, como já disse, que em profissões criativas para “talentos” estes podem sempre surgir, pelo que não faz sentido falar nos “nossos empregos”. O resto é a frustração normal com as preferências populares, que eu também partilho. Mas a culpa não é do Futre.