quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Pequeninos mas orgulhosos, a progressividade do IRC

A progressividade do imposto sobre o rendimento pessoal é um valor partilhado por vários quadrantes políticos em vários países, ao ponto de estar inscrito na nossa Constituição. É o principal instrumento de redistribuição de rendimento e de combate à desigualdade.
A recente reforma do IRC introduziu, pelas mãos do PS, um princípio novo no sistema fiscal que estranhamente pouco foi discutido: a solidariedade entre empresas. Haverá agora progressividade também no IRC que taxará 17% ou 23% consoante o lucro estiver abaixo ou acima de 17 mil euros. E diga-se: o PS batalhou por uma progressividade bem maior.
Este bizarro princípio, existente apenas em alguns países, é de difícil compreensão. O Estado deve corrigir a desigualdade, inerente à economia de mercado, de rendimentos entre pessoas e assim garantir uma sociedade mais igual e garantir um mínimo de qualidade de vida a todos, mas... porquê fazer o mesmo com as empresas? Tanto mais que uma empresa não é uma entidade imutável como uma pessoa. Se tivermos uma empresa A com 200 empregados e 20 mil euros de lucros, e 10 empresas B com 20 empregados e 2 mil euros de lucro cada uma, porquê descriminar entre A e B, porquê obrigar a A a ser solidária, se os dois conjuntos de empresas contribuem exactamente o mesmo para a sociedade?
Poder-se-ia argumentar que a empresa grande pertence a um empresário abastado, e que isto diminuiria a desigualdade - mas isto não é necessariamente assim. Um "rico" pode ter várias empresas pequenas, e a grande ser possuída por várias pessoas com menor rendimento. Se realmente fosse esta a fundamentação, porque não corrigir a desigualdade de rendimentos da maneira mais clara e simples, através do IRS?
As PME's criam mais emprego? Mais uma vez isto não é necessariamente verdade, e porque não incentivar mais emprego da maneira mais directa, através da redução da TSU?
As grandes empresas pagam um IRC efectivo mais baixo? Isto é bem verdade em Portugal, mas corte-se então nas isenções que levam a essa injustiça.
As grandes empresas distorcem a concorrência? Reforce-se esse controlo.
A inovação nasce em pequenas start-ups? Subsidie-se a inovação.
Para lá de ser um soundbite demagógico do PS que quis mostrar alguma batalha "contra" a direita na reforma do IRC, esta progressividade pode ter efeitos negativos. Ao discriminar negativamente as empresas de média e grande dimensão, o Estado está a dizer que prefere um país cheio de pequenas empresas em vez de empresas maiores com um mínimo de massa crítica para exportarem e serem competitivas internacionalmente.
Desistimos de lutar pela solidariedade entre as pessoas, para ficarmos pelas empresas?

1 comentário :

Miguel Madeira disse...

"A inovação nasce em pequenas start-ups? Subsidie-se a inovação."

Duvido que isso seja viável na prática (subsidiar a inovação); se efectivamente se chagar à conclusão que as pequenas empresas são mais inovadoras que as grandes (e não estou certo que isso seja liquido), penso que então é mesmo melhor adoptar medidas gerais de favorecimento das pequenas empresas do que fazer programas especificos de "apoio à inovação".

E porque é que acho que é dificil subsidiar a inovação? Pelo simples facto de que é dificil medir a inovação (para atribuir o subsidio em conformidade) - veja-se uma empresa que lança um novo produto: qual é o grau de diferença que tem que haver entre esse produto e os produtos que a empresa já fabricava para se considerar que estamos em presença de "inovação"?; o que as politicas de "subsidiar a inovação" na prática fazem é subsidiar projectos de "Investigação e Desenvolvimento", o que não é exactamente a mesma coisa que subsidiar a inovação (toda a inovação que não é feita num quadro formalizado de "Inovação"-com-letra-grande fica de fora; p.ex., o barman que, enquanto atende um cliente e outro, exprimenta combinações para novos cocktails)