domingo, 27 de dezembro de 2009

À escuta de José

O Policarpo usou o seu tempo de antena natalício no canal de todos nós para responder à Associação Ateísta Portuguesa. Registe-se: «nos últimos tempos, entre nós, falou-se muito de ateísmo; exprimiram-se ateus, pessoas e organizações, defendeu-se o direito de ser ateu e de exprimir a negação de Deus».

José Policarpo, numa prova de respeito e civilidade, não se exime portanto a argumentar a existência de «Deus» com os ateus. É bem. No entanto, sabe que o diálogo é desigual e que o canal pago com os meus impostos não convida o Munir para falar no início do Ramadão, nem dará a palavra ao Carlos Esperança ou ao Ludwig Krippahl para lhe responderem como merece. E isso fica-lhe mal. Porque é abuso de posição dominante.

Quanto aos argumentos: são fracos. Concordo que «não é o facto de os crentes acreditarem em Deus que faz com que Ele exista»; e também que «não é o facto de alguém não acreditar em Deus que faz com que Ele não exista». Não acho é que haja «mistério» algum neste assunto que não tenha explicação humana. Compreendemos cada vez melhor como «Deus» foi inventado.

Finalmente, quando Policarpo quiser dar lições de humildade, que abdique do espaço na televisão de todos. Não é muito curial aproveitar um espaço numa televisão paga por todos para difundir uma mensagem tão arrogante e divisiva como a sua, centrada na crítica aos ateus e no apelo à conversão de judeus e muçulmanos. E, como já disse um comentador do Diário Ateísta, se quer fazer prova de humildade que proteste por lhe chamarem «Dom», «Eminência Reverendíssima» e outros desvarios que tais. Ah, e use menos maiúsculas. Acima de tudo menos maiúsculas, por favor.

6 comentários :

Francisco Brito disse...

"Compreendemos cada vez melhor como «Deus» foi inventado"

O que não compreendemos é como é que nós fomos "inventados". Talvez tenha sido por Deus e se considerarmos Deus "o criador" seja ele quem for existe. Nem que seja um átomo!

Deus foi inventado pelo Homem para dar resposta a uma pergunta que continua sem resposta. A solução até não foi má de todo!!

João Vasco disse...

Se "o criador" for "um átomo" então a expressão "criador" seria talvez pouco adequada para descrever o átomo, visto que essa expressão evoca uma vontade consciente de criar, criatividade no acto da criação, etc.. coisa que o dito "átomo" não teria.

Se a palavra "criador" seria desadequada para descrever o "átomo", a palavra "Deus" seria muito mais...

Francisco Brito disse...

Isto era só uma brincadeira mas criar significa também dar existência ou originar. Originar não é um acto "criativo" no sentido em que o João Vasco refere...Deus, neste sentido, pode até ser só matéria ou qualquer coisa que deu origem a tudo isto. A essência da invenção (ou da descoberta) de Deus é a tentativa de encontrar uma explicação para o inexplicável. E dentro do inexplicável a nossa existência, a morte ,etc ocuoam, por regra, o 1º llugar...As religiões - não desvalorizando a complexidade da questão - são uma adaptação destas "soluções", "invenções" ou explicações à realidade que as envolve. São humanas e não divinas.

João Vasco disse...

FB:

Explico-me de outra maneira. É diferente dizer "alguém criou" ou "algo criou". Creio que faz sentido usar a expressão "criador" no primeiro caso, mas não no segundo.

E se sou da opinião que usar a palavra "criador" no segundo caso encorajaria o equívoco, usar a palavra "Deus" ainda mais.

Não é uma opinião sobre a realidade, é sobre o uso mais conveniente a dar às palavras para que a comunicação tenha mais eficácia e menos mal-entendidos.

José-Icthus disse...

Apenas duas considerações:

Mistério não significa coisa sem explicação, mas antes realidade tão densa e plena que todas as explicações são apenas apalpadelas e descobertas do muito que se abre por explicar. É o que se passa diante da questão do sentido da vida, do universo, do tempo...

O argumento apresentado por Cardeal Policarpo para a existência de Deus não foi o facto de Deus ser mistério, mas o facto de os crentes se encontrarem com Ele.
"O que existia desde o princípio,o que ouvimos,o que vimos com os nossos olhos,o que contemplámos e as nossas mãos tocaram relativamente ao Verbo da Vida, - de facto, a Vida manifestou-se; nós vimo-la,dela damos testemunho e anunciamo-vos a Vida eterna que estava junto do Pai e que se manifestou a nós - o que nós vimos e ouvimos, isso vos anunciamos..." (cf. I jo 1, 1-3): este é o testemunho dos discípulos de Jesus, desde o séc. I até hoje.

P.S. Não encontrei nenhum apelo à conversão de judeus e muçulmanos...

Ricardo Alves disse...

«José-Ichtus»,
um «mistério», do modo como o formula, será principalmente uma questão mal formulada.

Quanto ao apelo à conversão:

«Saúdo os nossos irmãos judeus, membros do mesmo povo crente ao qual pertencemos (...)

Saúdo todos os irmãos que acreditam no Deus único, santo e misericordioso e que, como o povo bíblico, fundamentaram no encontro de Deus com Abraão o início da sua fé.

A todos vós, quando um dia receberdes o prémio da vossa fidelidade, será revelado o Seu Filho, Jesus Cristo, que vos encherá de alegria.
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