Recorrente.
Recorrente esta preocupação com a baixa natalidade.
Muito presente na direita, principalmente na menos liberal. Muito presente entre católicos mais conservadores, assumindo contornos de verdadeira histeria entre os simpatizantes de ideais de extrema direita (PNRs e afins...).
Convém deixar claro algo:
1-
A população mundial está a aumetar a um ritmo galopanteA população mundial continua a crescer exponencialmente. Actualmente a esmagadora maioria da humanidade não tem acesso a um estilo de vida confortável, e já assim os danos que fazemos ao nosso planeta têm sido maiores que a capacidade de regeneração deste.
Para quem, como eu, considera desejável que toda a humanidade alcance os níveis de conforto e bem-estar do ocidente, a situação não poderia ser mais dramática: os níveis de consumo de carne, petroleo, e todos os recursos em geral dariam cabo do actual equilíbrio lançando este planeta para um daqueles cataclismos que conhecemos da ficção.
É importante que se encontrem formas de aproveitar melhor os recursos que temos disponíveis, de conseguir manter este nível de vida sem afectar tanto o meio ambiente, etc... Mas se a população continuar a crescer exponencialmente, não há poupança que nos salve. A situação será completamente insustentável.
2-
O grau de distribuição da riqueza está relacionado com a abundância de mão-de-obraAs pessoas obtêm dinheiro fundamentalmente de 3 formas: pelo trabalho, pela propriedade e pelo roubo.
Numa sociedade que tem determinados recursos naturais, verfica-se esta tendência: quanto maior for a população, mais valiososa se torna a propriedade (pois para cada pessoa corresponde uma fatia menor dos recursos naturais). Por outro lado, o trabalho torna-se mais abundante. Assim sendo, para os mesmos recursos naturais, quanto maior for a população, menos vale o trabalho face à propriedade. Quanto maior a população, pior distribuídos deverão estar os recursos (visto que a propriedade passa de geração em geração sem depender do mérito individual, e a remuneração do trabalho honesto sempre depende mais do mérito de cada um).
Um exemplo trágico desta situação foi o rescaldo da peste negra, quando, tendo a Europa ocidental perdito cerca de 1/3 da sua população, os senhores feudais perderam muito poder, visto que a posse de terra tornou-se menos valiosa, e o trabalho tornou-se muito melhor pago. Essa forte redistribuição da riqueza pela sociedade europeia foi um dos factores que levou ao renascimento.
A criminalidade, como é natural, está relacionada com a proporção de dinheiro obtido pelo trabalho em comparação com o valor da propriedade. O criminoso sabe que corre um determinado risco para roubar um determinado bem, mas se o trabalho for mais valioso, a alternativa de "trabalhar para o obter" corresponde a menos horas de trabalho.
Assim sendo, uma sociedade com um elevado crescimento populacional, não está apenas a contruir um futuro onde a riqueza tem uma distribuição mais injusta e arbitrária, também está a contruir uma sociedade onde a criminalidade será maior - com todo o desperdício de recursos que isso implica, além do medo e violência que causa.
3-
Querer resolver os problemas da segurança social por via da natalidade é querer adiar e agravar o problemaAs contribuições para a segurança social de cada indivíduo são atenuadas na proporção do crescimento populacional. Por exemplo: se a população duplicasse em cada geração, cada indivíduo só teria de contribuir com metade do dinheiro que seria necessário para garantir o seu sustento.
Como é óbvio, a população não pode crescer para sempre. Nem que seja 1%.
No dia em que parar de crescer, cada indivíduo terá de pagar inteiramente o seu próprio sustento. O problema terá sido agravado, e só então será resolvido.
Querer pagar a segurança social encorajando o crescimento populacional é querer embarcar num esquema tipo «Dona Branca».
4-
Educação e Tecnologia? Poucos Filhos!Acho a revolução tecnológica fascinante: permite um conforto e uma abundância sem precedentes. Aumenta a produtividade em factores inimagináveis. Como é óbvio, numa sociedade com abundância de mão-de-obra, ela não faz muito sentido - vai causar desenprego, a não ser nos casos em que as pessoas já trabalham por tão pouco, que se torna mais barato usar esse «trabalho escravo» do que investir na máquina em questão. Aí nem vale a pena investir em educação, para formar os engenheiros que concebam as tais máquinas. Os recursos serão mais canalizados para uma polícia musculada capaz de conter a violência.
Numa sociedade em que os pais tenham poucos filhos, a tendência é investirem mais no acompanhamento e educação de cada um destes. Investe-se mais na formação cívica, na formação ética, e a sociedade terá toda a vantagem em investir na educação técnica - visto que o trabalho é precioso, e interessa automatizar os processos não-criativos.
Nota: este artigo foi também publicado no
Banqueiro Anarquista.