«Agora que Salazar parece em vias de ganhar pela primeira vez uma "eleição", e logo contra o Afonso Henriques, convém lembrar como eram as votações quando ele era vivo.
No que diz respeito à aprovação da Constituição de 1933, foi simples. As abstenções contaram a favor. A maioria foi esmagadora. Os portugueses nem precisaram de sair de suas casas para exprimir a sua "vontade".
Nas eleições legislativas o método também era infalível. Nas eleições de 1957, por exemplo, em Lisboa, na véspera da eleição, os responsáveis pelas mesas eleitorais foram chamados ao Governo Civil onde receberam a indicação do resultado da votação do dia seguinte com uma margem de erro de 2 %. Assim, na freguesia de São João da Pedreira o resultado devia ser 56 ou 57 %.
No dia seguinte houve guarda republicanos que andaram pelas mesas de voto a levar pacotes de votos de "guardas que estavam de piquete", que foram metidos nas urnas pelos presidentes das mesas. Mas isto teve uma relativa pouca importância.
Perto do fim, depois de assegurada a ausência de testemunhas inconvenientes, os elementos das mesas multiplicaram o número total de eleitores por 0,57 e dividiram o resultado pelo número de páginas dos cadernos eleitorais. Tiveram, assim, o número de eleitores de cada página que "deviam votar".
Procederam, então, sem se preocupar em lançar votos nas urnas, à operação de "compor os cadernos eleitorais", descarregando conscenciosamente nos dois cadernos o conveniente número de eleitores que "tinham" votado. A operação foi acompanhada de comentários do tipo: " Este é comunista, mas desta vez vai votar no governo".
Depois, enviaram para o Governo Civil um documento a dizer: "Percentagem de eleitores: 57 %." Mas não se ficaram por aqui: abriram as urnas, contaram os votos, e enviaram para o Governo Civil um outro documento a dizer. "Percentagem real de eleitores, tantos por cento".
No caso concreto de uma mesa, a percentagem real de eleitores, incluindo os votos dos "guardas de piquete" e 50 votos riscados foi de 28 %, mas os elementos da mesa enviaram um documento a dizer que a "percentagem real", era de 30 %. É provavel que, quando chegasse ao Salazar, esta percentagem já fosse um bocadito mais alta.
Fui testemunha parcial destes factos em 1957. Uma outra testemunha foi o escritor Luis Pacheco a quem envio, 50 anos depois, as minhas saudações e que devia ser agora ouvido. Como comentador da "eleição de Salazar" e porque pode confirmar factos importantes para esclarecer um país que, 30 anos depois do 25 de Abril, ainda está muito mal informado.
Que, ao falar nas eleições do "antigamente", ainda fala em chapeladas, como se a fraude "dos guardas que estavam de piquete" e de uns tantos legionários fosse a mais importante. Salazar era muito mais subtil. Quarenta anos depois de morto, ainda engana o país.
E não só. Quando em Novembro de 1957 cheguei a França vi que os jornais franceses analisavam a situação portuguesa a partir do resultado de 57% de votos obtidos pelo governo nas últimas eleições legislativas.»
No que diz respeito à aprovação da Constituição de 1933, foi simples. As abstenções contaram a favor. A maioria foi esmagadora. Os portugueses nem precisaram de sair de suas casas para exprimir a sua "vontade".
Nas eleições legislativas o método também era infalível. Nas eleições de 1957, por exemplo, em Lisboa, na véspera da eleição, os responsáveis pelas mesas eleitorais foram chamados ao Governo Civil onde receberam a indicação do resultado da votação do dia seguinte com uma margem de erro de 2 %. Assim, na freguesia de São João da Pedreira o resultado devia ser 56 ou 57 %.
No dia seguinte houve guarda republicanos que andaram pelas mesas de voto a levar pacotes de votos de "guardas que estavam de piquete", que foram metidos nas urnas pelos presidentes das mesas. Mas isto teve uma relativa pouca importância.
Perto do fim, depois de assegurada a ausência de testemunhas inconvenientes, os elementos das mesas multiplicaram o número total de eleitores por 0,57 e dividiram o resultado pelo número de páginas dos cadernos eleitorais. Tiveram, assim, o número de eleitores de cada página que "deviam votar".
Procederam, então, sem se preocupar em lançar votos nas urnas, à operação de "compor os cadernos eleitorais", descarregando conscenciosamente nos dois cadernos o conveniente número de eleitores que "tinham" votado. A operação foi acompanhada de comentários do tipo: " Este é comunista, mas desta vez vai votar no governo".
Depois, enviaram para o Governo Civil um documento a dizer: "Percentagem de eleitores: 57 %." Mas não se ficaram por aqui: abriram as urnas, contaram os votos, e enviaram para o Governo Civil um outro documento a dizer. "Percentagem real de eleitores, tantos por cento".
No caso concreto de uma mesa, a percentagem real de eleitores, incluindo os votos dos "guardas de piquete" e 50 votos riscados foi de 28 %, mas os elementos da mesa enviaram um documento a dizer que a "percentagem real", era de 30 %. É provavel que, quando chegasse ao Salazar, esta percentagem já fosse um bocadito mais alta.
Fui testemunha parcial destes factos em 1957. Uma outra testemunha foi o escritor Luis Pacheco a quem envio, 50 anos depois, as minhas saudações e que devia ser agora ouvido. Como comentador da "eleição de Salazar" e porque pode confirmar factos importantes para esclarecer um país que, 30 anos depois do 25 de Abril, ainda está muito mal informado.
Que, ao falar nas eleições do "antigamente", ainda fala em chapeladas, como se a fraude "dos guardas que estavam de piquete" e de uns tantos legionários fosse a mais importante. Salazar era muito mais subtil. Quarenta anos depois de morto, ainda engana o país.
E não só. Quando em Novembro de 1957 cheguei a França vi que os jornais franceses analisavam a situação portuguesa a partir do resultado de 57% de votos obtidos pelo governo nas últimas eleições legislativas.»
(Texto de António Brotas; recebido por correio electrónico e publicado com a autorização do autor.)
5 comentários :
Também era para publicar este texto... :) Acho que o vou publicar de qualquer maneira, mas noutra ocasião. Está excelente. E sabes: convenci-me que o facto de o Salazar ganhar o concurso (algo que me parece irreversível), sendo triste tem aspectos positivos. Creio que é uma vergonha para a maioria das pessoas e vai reavivar o antifascismo.
Ricardo,
Ao menos isto tem o mérito de tornar mais claras as simpatias de alguns personagens que para aí andam... é só ver quem é que anda aos saltos de alegria.
É curioso que estes simpatizantes de Salazar parecem ter medo que os seus próprios métodos sejam usados para a decisão do concurso. Pelos vistos a ditadura é boa ou má dependendo do lado em que nos encontramos.
Adorei. Vou tentar fazer chegar esta informação aos miudos, para que não andem de olhos fechados, num tempo em que parece que a maior parte das gentes de cá dorme a sono solto.
Pior que isto é ter a sensação de que a história afinal é mesmo cíclica e que não tarda, estaremos outra vez a viver situações idênticas. Ou não estamos já?
De facto e dificil compreender a estupidez das pessoas. Aqui ha seis anos um colega meu disse a uma aluna que estava toda contente a comemorar a vitoria do Bush: "Oh menina, porque e que esta tao contente? A minha mae votou nele porque tem milhoes de dolares e vai deixar de pagar impostos. A menina nao tem nada e vai passar a pagar os impostos da minha mae. Se a coisa esta bem para si, eu tambem nao me importo."
TENHO NOJO, NOJO , NOJO de ser " tuga " depois de saber o resultado do concurso, grandes portugueses
i,m a shamed of the nation !!!
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