terça-feira, 27 de setembro de 2005

Peña-Ruiz: «A Laicidade...»

«A Laicidade é um valor essencial, com a preocupação de liberdade de consciência e de igualdade de todos os homens, quer sejam crentes, ateus ou agnósticos. O ideal laico não é um ideal negativo de ressentimento contra a religião. É o maior dos contra-sensos ver-se na laicidade uma espécie de hostilidade de princípio à religião. Pelo contrário, é um ideal positivo de afirmação da liberdade de consciência, da igualdade dos crentes e dos ateus e da ideia de que a lei republicana deve visar o bem comum e não os interesses particulares. É o que se chama o princípio da neutralidade da esfera pública
(Henri Peña-Ruiz, filósofo, Setembro de 2003)

segunda-feira, 26 de setembro de 2005

Mário Soares dissera que...

  • «Participei nos Encontros Ecuménicos inter-religiosos organizados, em diferentes países, pela Comunidade de Santo Egídio. Lutei sempre pelo diálogo, pelo multiculturalismo, em sentido lato, pelo pluralismo ideológico e cultural. Pela tolerância, contra o fanatismo religioso e cultural, pelo laicismo e contra a confusão perigosa entre religião e política
...E nem falara mal. Porém, quando Soares mistura na mesma frase o laicismo e o orgulho em ser convidado pelos padres de Santo Egídio deixa a descoberto a facilidade com que transige nos princípios. É-me impossível não recordar que na mente deste homem o laicismo foi sempre um conceito vazio: a passagem de Soares pela Presidência da República não trouxe qualquer avanço à causa da laicidade do Estado.

domingo, 25 de setembro de 2005

Desfazendo os mitos sobre a República (3)

«Ser católico não é mandar - é obedecer. Não é discutir a orientação da Igreja - é proceder conforme as instruções recebidas de quem de direito.
Assim procedemos nós, jornais católicos, como absoluta e concretamente procedem os nossos representantes no Parlamento.
Fazemos apenas aquilo que os nossos bispos nos mandam
(Jornal A Ordem, 1916.)

Um dos mitos mais persistentes respeitantes ao período da República é o de que a ICAR lutava, de alguma forma, pela liberdade. No entanto, nessa época como em todas as outras, a Igreja Católica era a principal instituição que reproduzia socialmente a deferência pelas hierarquias (sobretudo pelas não sujeitas a sufrágio), a submissão do indivíduo ao colectivo e o espírito de rebanho. Hoje, nenhum responsável católico escreveria a frase clara e sincera que se lê acima. Mas a mentalidade continua a ser a mesma.

Manuel Alegre diz que...

  • «Em nome dos valores republicanos da liberdade e da igualdade quero estar aqui em Janeiro como candidato à Presidência da República para derrotar Cavaco Silva nas eleições presidenciais.»
  • «[Concorro por] imperativo cívico, por ser republicano e porque é preciso um novo patriotismo nesta época de globalização».
  • «A democracia e a cidadania não podem ser confiscadas apenas pelos directórios dos partidos políticos».
(Fonte: Diário de Notícias.)

sábado, 24 de setembro de 2005

«Iluminismo muçulmano»?

O artigo de Salman Rushdie cujo original em língua inglesa eu destaquei há poucos dias foi hoje publicado no Diário de Notícias. O título é questionável: «Iluminação muçulmana» parece mais o nome de uma loja de candeeiros cujos proprietários são da dita religião; seria preferível «Iluminismo muçulmano» (penso eu...) dado que os artigos recentes de Rushdie vão precisamente no sentido de criar um contexto cultural em que o Islão conviva com o pensamento crítico e, simultaneamente, são um esforço para afastar os muçulmanos residentes na Europa do clero integrista que pretende representá-los (e que quanto mais fanático é, mais «autêntico» é considerado...). Efectivamente, o pensamento de Salman Rushdie é simultaneamente iluminista e anticlerical, e por isso este escritor merece todo o encorajamento e toda a publicidade que seja possível dar-lhe.

sexta-feira, 23 de setembro de 2005

A culpa é do Fidel

Hurricane Rita
Enfurecida por Bush persistir em não assinar o protocolo de Quioto, Gaia juntou forças com os comunistas que dominam Cuba e lança a sua segunda manifestação anti-americana em menos de cinco semanas. Notar a semelhança do furacão com o símbolo da foice e do martelo.

quarta-feira, 21 de setembro de 2005

Resultados das eleições na Alemanha

(Comentários: os dois grandes partidos têm resultados melhores nos círculos uninominais do que no círculo nacional, como seria de esperar; houve, aparentemente, uma transferência directa de 4% do eleitorado SPD para o Partido da Esquerda, enquanto a CDU/CSU terá perdido 2% para o FDP no círculo nacional e 1% para a extrema direita.)
(Comentários: a Baviera continua homogeneamente conservadora, enquanto no leste da Alemanha a soma das percentagens dos partidos de esquerda anda pelos 65%-75%, tendo o Partido da Esquerda vencido em duas circunscrições de Berlim leste.)
(Linques obtidos via Margens de erro.)

terça-feira, 20 de setembro de 2005

Três apontamentos sobre a manifestação da extrema direita

  1. Por muito interessante que seja discutir os limites da liberdade de expressão, enquanto as leis proibirem organizações fascistas devem ser aplicadas sem tibiezas.
  2. Desta vez, manifestaram-se «apenas» cerca de duzentos fascistas. Portanto, a última purga interna no PNR (após a manifestação de Junho) terá afastado uma centena?
  3. Existe um livro que defende que Adolf Hitler era guei.

segunda-feira, 12 de setembro de 2005

Salman Rushdie: «Message to Muslims: this is not the 8th century»

«A FEW weeks ago, in an article written in response to the London bombings, I wrote about the urgent need for a “reform movement to bring the core concepts of Islam into the modern age”.
The response to this article has been widespread and extremely interesting. Naturally there were those who rushed to dismiss my arguments because they came out of my mouth. “The man who lost his personality and beliefs should not speak about the great religion of Islam,” wrote Anna Tanha, of Glasgow.
However, there was an encouraging flood of more positive commentary, much of it coming from Muslims. “Absolutely right; it is time Muslims accepted that it is Islam’s 8th-century attitudes that are causing so much suffering in the 21st-century world,” wrote Mohammed Iqbal, who comes from Leeds, home of three of the 7/7 bombers. “Please keep dogma aside and let reason be part of the debate. We believers have done enough to harm ourselves. What European monarchs and clergy did in the Dark and Middle Ages is exactly what Muslim rulers and clergy are doing to the Muslim world,” argued Nadeem Akhtar, from Washington, DC.
Ozcan Keles, of London, insisted that only “faith-based Muslim leaders” could perform the act of Quranic reinterpretation known as ijtihad, but Haroon Amirzada, a former lecturer at Kabul University, felt that “secular Islamic and non-Islamic Western and Eastern scholars and politicians should work together to modernise Islam to meet the realities of our time”.
Dr Shaaz Mahboob, of Hillingdon, Middlesex, pointed out that: “There are hundreds of thousands of Muslims in Britain who do not follow their religion as strictly as do the older generations . . . We are the mainstream Muslims who are keen to live in peace and harmony with other faith groups, feel proud of being British and are patriotic . . . I know of no organisation that represents the secular and liberal Islam that the vast majority of Muslims follow.”
Several writers challenged me to take the next step and hypothesise the content of such a reform movement. The nine thoughts that follow form an initial response to that challenge, and focus primarily on Britain.
It may well be that reform will be born in the Muslim diaspora where contact (and friction) between communities is greatest, and then exported to the Muslim majority countries. It would not be the first time such a thing has happened. The idea of Pakistan was shaped in England, too. So were the history-changing characters of Mahatma Gandhi, Pakistan’s founder Muhammad Ali Jinnah and the pro-British Indian Muslim leader Sir Syed Ahmad Khan.
British Muslims, who are mainly of South Asian origin, should remember their own histories. In India, Muslims have always been secularists, knowing that India’s secular constitution is what protects them from the dictatorship of the (Hindu) majority. British Muslims should take a leaf out of their counterparts’ book and separate religion from politics.
Remembering history, part 2. Within living memory, Muslim cities such as Beirut and Tehran were cosmopolitan, tolerant, modern metropolises. That lost culture must be saved from the radicals, celebrated, and rebuilt.
The idea that all Muslims are kin to all others should be re-examined. The truth is that, as the bitter divisions between Iraqi Sunnis and Shias demonstrate, it is a fiction, and when it deludes young men such as the British 7/7 bombers into blowing up their own country in the name of an essentially fantastical idea of Islamic brotherhood (few British Muslims would find life in conservative Muslim countries tolerable), it is a dangerous fiction.
Pan-Islamism, part 2: the people most directly injured by radical Islam are other Muslims: Afghan Muslims by the Taleban, Iranian Muslims by the rule of the ayatollahs; in Iraq, most people killed by the insurgency are Muslims, too. Yet Muslim rhetoric concentrates on the crimes of “the West”. It may be that Muslims need to re-direct their rage against the people who are really oppressing and killing them.
In the 1970s and 1980s the politics of British peoples of South Asian origin were largely organised around secular groups, mostly run by activists of Left-Marxist persuasion. The Black/Asian unity of that period was broken, and then replaced, by the mosque-based, faith-determined radical Islam that grew in part out of the protests against The Satanic Verses. That ground needs to be reclaimed (not necessarily by Left-Marxists) by creating truly representative bodies. Then the increasingly discredited “leaders” of the Muslim Council of Britain can be relegated to the fringes where they belong.
Reformed Islam would reject conservative dogmatism and accept that, among other things, women are fully equal to men; that people of other religions, and of no religion, are not inferior to Muslims; that differences in sexual orientation are not to be condemned, but accepted as aspects of human nature; that anti-Semitism is not OK; and that the repression of free speech by the thin-skinned ideology of easily-taken “offence” must be replaced by genuine, robust, anything-goes debate in which there are no forbidden ideas or no-go areas.
Reformed Islam would encourage diaspora Muslims to emerge from their self-imposed ghettoes and stop worrying so much about locking up their daughters. It would emerge from the intellectual ghetto of literalism and subservience to mullahs and ulema, allowing open, historically based scholarship to emerge from the shadows to which the madrassas and seminaries have condemned it.
There must be an end to the defensive paranoia that led some Muslims to claim that Jews were behind the 9/11 attacks and, more recently, that Muslims may not have been behind the 7/7 bombings either (a crackpot theory exploded, if one may use the verb, by the recent al-Jazeera video).
Not so much a reformation, as several people said in response to my first piece, as an Enlightenment. Very well then: let there be light.»
(Salman Rushdie)

sexta-feira, 9 de setembro de 2005

Palpite

Mário Soares ganhará a eleição presidencial de Janeiro de 2006, e até com uma percentagem superior à de 1986. Cavaco Silva terá uma percentagem superior à que obteve em 1996.

quarta-feira, 7 de setembro de 2005

«In the wake of the London bombings - Time to assert anti-racism ober communalism»

«As soon as news of the explosions broke and it became clear that it was the work of terrorists professing to be carrying out their actions in the name of Islam, it was obvious that Britain’s Asian community would come under attack. While the media talk of a backlash against Muslims because of the events, in reality the events are an excuse for racists to attack any Asians.
(...)
No matter how small an organisation is, its ideas can often resonate well beyond its membership or even its fellow travellers. This is especially the case when there are no other organisations providing more sensible explanations; where there is a political vacuum. That is why the ideas of both small Islamist and small fascist groups influence a considerable number of people outside their membership. In the case of the BNP this is evident from the fact that even in places where it has few members it can often get a reasonable vote.
The BNP has begun to symbolise opposition to a multiracial and multicultural society, while Islamic fundamentalism articulates alienation and disen-chantment with a Western society which its adherents believe discriminates against them. Yet many of the more vocal people who articulate support for these groups might never actually have come into physical contact with them.
It is ironic that these people, who would no doubt consider themselves diametrically opposed to one another, believe in pretty much the same things. Both the Islamists and the fascists believe that Western governments are under the control of Jews through Zionism. They also believe that communism and capitalism are tools with which the Jews control the world. They both disseminate the same texts such as the Russian tsarist forgery The Protocols of the Elders of Zion and The International Jew by the US industrialist Henry Ford. In Britain there are two main sources for these publications, mail order from fascist groups and some Islamic bookshops.
The BNP and Islamist groups also have a symbiotic relationship, their activities fuelling each other. Racism from organisations such as the BNP, high votes for fascists and racist attacks all create a climate in which some young Asians in particular feel that they are victims of, and in conflict with, wider society. In turn, Islamist groups preach that Muslims not only face racism in Britain, but are oppressed across the world, particularly in Palestine and Iraq. Islamist groups encourage their followers not to see themselves as British citizens, but as Muslims first, which is of course exactly how the BNP and other racists want them to be seen. The BNP, for its part, points to the extreme Islamist groups – which declare themselves the true face of Islam – and portrays all Muslims as fanatics, poised at any moment either to attack white youths on the street or to carry out bombings.
Moreover, just as the Iraq war and other perceived injustices across the world have undoubtedly acted as recruiting sergeants for Islamist groups, so we have to accept that the fundamentalist cleric Omar Bakri Mohammed and his ilk are recruiting sergeants for the BNP. His recent comments that the London bombings were the fault of ALL British people were clearly an attempt to cause a hostile reaction among the white population and so deepen the rift between communities. The BNP and other fascist organisations clearly will likewise hope that their own literature will have a similarly provocative effect on the Muslim community.

Yet in between the BNP and the Islamist groups stands the vast majority of white and Asian youth, not members or supporters of any form of hate group.
(...)
Anti-racism has been under sustained attack in Britain for some years now with the politics of “diversity” being used as the main device successfully to undermine it. In the world of diversity faith groups and religion are brought to the fore at the expense of tackling racism head on. This has led to an increase in the polarisation of communities which has manifested itself in an increase in faith-based schools and a general undermining of secular education.»

(Nick Lowles and Steve Silver, Searchlight Magazine)

sexta-feira, 2 de setembro de 2005

Ainda os atentados em Londres a 7 de Julho

Para os mais distraídos: a Al-Jazira divulgou ontem um vídeo onde o líder dos atentados de 7 de Julho, Mohamad Sidique Khan, deixou explicado o porquê do que faria nessa data. O vídeo inclui também imagens e palavras de Al-Zawahiri (o nº2 da Al-Qaida) e de combates no Iraque e na Palestina.
É uma indicação de que a ligação dos terroristas de 7 de Julho à Al-Qaida não seria apenas ideológica.
«I am going to keep this short and to the point, because it's all been said before by far more eloquent people than me.
But our words have no impact upon you, therefore I'm going to talk to you in a language that you understand. Our words are dead until we give them life with our blood.
I'm sure by now the media has painted a suitable picture of me, this predictable propaganda machine will naturally try to put a spin on it to suit the government and to scare the masses into conforming to their power- and wealth-obsessed agendas.
I and thousands like me are forsaking everything for what we believe. Our driving motivation doesn't come from tangible commodities that this world has to offer. Our religion is Islam, obedience to the one true God, Allah and follow in the footsteps of the final prophet and messenger Muhammad.
This is how our ethical stances are dictated. Your democratically elected governments perpetuate atrocities against my people and your support of them makes you responsible, just as I am directly responsible for protecting and avenging my Muslim brothers and sisters.
Until we feel security, you'll be our target. Until you stop the bombing, gassing, imprisonment and torture of my people, we'll not stop this fight. We are at war and I am a soldier. Now you too will taste the reality of this situation.
»

Desfazendo os mitos sobre a República (2)

A propaganda católica afirma recorrentemente que a República não apenas «perseguiu» a ICAR em particular, como até «perseguiu» a religião em geral. Difunde-se assim, não apenas o mito usual da «perseguição horrível» como, implícitamente, o mito de que em Portugal, mesmo após 1910, só existiria uma religião (a católica). Na realidade, antes de 1910 já existiam minorias judaicas e protestantes, embora em situação de semi-clandestinidade porque (em boa verdade vos recordo) a liberdade religiosa antes de 1910 era só para a ICAR.
Não é portanto surpreendente que, logo no dia 8 de Outubro de 1910, Teófilo Braga receba o telegrama seguinte:
«Embora colectivamente alheio à política partidária, o Comité Nacional das Uniões Cristãs da Mocidade, representando a mocidade protestante portuguesa, encarrega-me de saudar em V. Ex.ª, como chefe do Governo Provisório, o advento da República Portuguesa, por termos nela a esperança de que acabará com todas as leis de excepção de que nós, protestantes, temos sido vítimas e nos trará as liberdades que há muito ambicionamos para mais desafogadamente trabalharmos para o engrandecimento da nossa pátria
Mais tarde, quando foi publicada a Lei de Separação da Igreja e do Estado, os protestantes protestaram, talvez com alguma razão, contra os «privilégios de que ainda fica gozando a Igreja Católica Romana». Apesar de os protestantes fazerem uma avaliação positiva da República e de considerarem que a Lei de Separação era tímida, a ICAR difundiu e difunde ainda hoje a lenda de que a Lei de Separação terá sido parte de uma «perseguição horrível» feita à religião católica em particular mas a toda a religião em geral. Mas, como se vê por estes e por outros factos deliberadamente ocultados, trata-se efectivamente de uma lenda: o objectivo da República era tratar igualitariamente as diversas confissões religiosas. Infelizmente, essa obra ficou inacabada.

John Gray: «The World is Round»

«The belief that a process of globalization is underway which is bringing about a fundamental change in human affairs is not new. Marx and Engels expressed it in 1848, when they wrote in a justly celebrated passage in The Communist Manifesto:
(...)
Because they were on opposite sides of the cold war it is often assumed that neoliberalism and Marxism are fundamentally antagonistic systems of ideas. In fact they belong to the same style of thinking, and share many of the same disabling limitations. For Marxists and neoliberals alike it is technological advance that fuels economic development, and economic forces that shape society. Politics and culture are secondary phenomena, sometimes capable of retarding human progress; but in the last analysis they cannot prevail against advancing technology and growing productivity.
(...)
In current discussion two different notions [of globalization] are commonly conflated: the belief that we are living in a period of rapid and continuous technological innovation, which has the effect of linking up events and activities throughout the world more widely and quickly than before; and the belief that this process is leading to a single worldwide economic system. The first is an empirical proposition and plainly true, the second a groundless ideological assertion.
(...)
It is necessary to distinguish between globalization—the ongoing process of worldwide industrialization—and the various economic systems in which this process has occurred. Globalization did not stop when Lenin came to power in Russia. It went on—actively accelerated by Stalin's policies of agricultural collectivization. Nor was globalization in any way slowed by the dirigiste regimes that developed in Asia —first in Japan in the Meiji era and later in the militarist period, then after World War II in Korea and Taiwan.
(...)
There is no systematic connection between globalization and the free market. It is no more essentially friendly to liberal capitalism than to central planning or East Asian dirigisme. Driven by technological changes that occur in many regimes, the process of globalization is more powerful than any of them.
(...)
the problems of globalization are more intractable than those of corporate life. States cannot be phased out like bankrupt firms, and large shifts in wealth and power tend to be fiercely contested. Globalization is a revolutionary change, but it is also a continuation of the conflicts of the past (...) it is inflaming nationalist and religious passions and triggering a struggle for natural resources

quinta-feira, 1 de setembro de 2005

O regresso dos mortos-vivos

Em 1995, o país estava farto de Soares e de Cavaco, de Cavaco e de Soares, e das respectivas facadas nas costas, guerrinhas subterrâneas, pontapés debaixo da mesa e outras manifestações de (des)afecto subtis, muitas vezes sem qualquer relação com os problemas reais e concretos que se viviam em Portugal no final dessa década (1985-95) em que foram a dualidade dominante da República.
Em 2005, dez anos depois, o país assistiu conformado à novela estival que trouxe de volta estes dois indivíduos, autênticos zombies da política nacional que julgávamos mortos e enterrados, e que de repente, à esquerda e à direita, se posicionaram com o fatalismo das coisas inevitáveis como candidatos ao mais alto cargo da República.
Estão de parabéns, todos: tanto os da esquerda como os da direita. Na década que passou o pessoal político não se renovou, não surgiram políticos que se destacassem de tal forma que pudessemos olhar para eles como presidenciáveis. Guterres fugiu para o Sudão, Barroso para Bruxelas, Santana Lopes voltou para a 24 de Julho e António Vitorino é demasiadamente fino para a República.
Como republicano de esquerda e independente, lamento que Manuel Alegre não tenha sido ideologicamente mais claro nas suas manifestações de disponibilidade. É no mínimo curioso que um grupo de apoiantes seus tenha escolhido como título para um blogue Esquerda Republicana, antes de descobrirem que já existia outro blogue com o mesmo nome (este) e terem, então, decidido passarem a chamar-se Acção Republicana.
Do discurso de ontem de Mário Soares, retive, entre muitos outros aspectos, o orgulho soarista por participar nos encontros da Comunidade de Santo Egídio e no diálogo ecuménico. Dialoguemos então, mas entre republicanos. Do Acção Republicana aprecio outras coincidências, como a coragem de ser soberanista ou o discurso de Manuel Alegre em que me parece haver a consciência de que a relação entre Portugal e a UE é mais importante para Portugal do que para a UE, e que há que tirar consequências desse facto. Seria igualmente interessante saber como os apoiantes de Manuel Alegre vêem o estado actual das relações entre as igrejas e o Estado, particularmente entre a ICAR e a República...

Desfazendo os mitos sobre a República (1)

Um mito recorrente sobre a República de 1910 é que a ICAR terá sido «perseguida». Raramente esta acusação é explicada, mas nessas raras vezes é geralmente referida a expulsão das ordens religiosas.
No entanto, a realidade é que, no dia 5 de Outubro e nos dias que se seguiram, os padres das congregações (particularmente os jesuítas) dispararam sobre a tropa republicana e mesmo sobre o povo. No convento do Quelhas, por exemplo, foram lançadas de uma janela bombas de dinamite que mataram dois soldados da Marinha, iniciando uma fusilaria incessante a partir das janelas do convento. Foi feito fogo sobre os republicanos e sobre o povo a partir de outros conventos, como o convento de Arroios, ou o de Torres Vedras, onde foi fuzilado um cidadão que gritara vivas à República.
Foi portanto em auto-defesa que, no dia 8 de Outubro, o Governo Provisório da República repôs a legislação de Pombal e de Joaquim António de Aguiar extinguindo as congregações religiosas.