Sucedeu-me há poucas semanas, numa das minhas viagens no Intercidades. Topei logo a pinta do homem quando me dirigia ao meu lugar e verifiquei que estava ocupado por uma senhora de idade, com muita bagagem (na verdade ocupava dois). Sem nos deixar (a mim ou à senhora) abrir a boca, "destinou" logo que eu deveria sentar-me noutro lugar que não o meu. Sem lhe responder, acabei por fazer isso porque a senhora mo pediu, e não pela sua ordem.
O homem falava alto. O seu interlocutor não o conhecia, mas ele era do género que gostava de meter conversa com quem estivesse ao lado, para que os outros o ouvissem. E eu sem ir ao lado dele tive de o ouvir a dizer que a guerra "do ultramar" não estava nada perdida, os portugueses não tinham nada de ter abandonado as "províncias ultramarinas", e os capitães de Abril eram "uns traidores".
O seu interlocutor à força, enfadado com o companheiro de viagem que lhe calhara, deu-lhe uma resposta simples e lógica: "Pois, os outros países todos já tinham saído de África, e nós éramos os únicos que iam lá ficar com um império. Éramos os maiores."
O nosso homem nem lhe responde. Nem argumenta. Muda completamente de assunto - mas na cabeça dele não muda: tudo era exatamente a mesma coisa:
"Você sabe quanto é que o Estado português gasta na segurança da casa de praia do Mário Soares?"
O outro senhor ainda tentou ripostar: "você acredita em tudo o que lê?" Mas levou com um "Em Portimão toda a gente sabe." Deve ter-se sentido muito aliviado por o homem ter saído no Entroncamento.
Todos os portugueses já devem ter presenciado conversas destas. São conversas como a deste homem que fazem com que Mário Soares, concorde-se ou não com ele (e era perfeitamente possível não concordar com ele), tenha sido, como nenhum outro, o português que melhor permitia detetar quem não prestava. Quer saber se um português não presta? Ponha-o a falar sobre o Mário Soares.
O homem falava alto. O seu interlocutor não o conhecia, mas ele era do género que gostava de meter conversa com quem estivesse ao lado, para que os outros o ouvissem. E eu sem ir ao lado dele tive de o ouvir a dizer que a guerra "do ultramar" não estava nada perdida, os portugueses não tinham nada de ter abandonado as "províncias ultramarinas", e os capitães de Abril eram "uns traidores".
O seu interlocutor à força, enfadado com o companheiro de viagem que lhe calhara, deu-lhe uma resposta simples e lógica: "Pois, os outros países todos já tinham saído de África, e nós éramos os únicos que iam lá ficar com um império. Éramos os maiores."
O nosso homem nem lhe responde. Nem argumenta. Muda completamente de assunto - mas na cabeça dele não muda: tudo era exatamente a mesma coisa:
"Você sabe quanto é que o Estado português gasta na segurança da casa de praia do Mário Soares?"
O outro senhor ainda tentou ripostar: "você acredita em tudo o que lê?" Mas levou com um "Em Portimão toda a gente sabe." Deve ter-se sentido muito aliviado por o homem ter saído no Entroncamento.
Todos os portugueses já devem ter presenciado conversas destas. São conversas como a deste homem que fazem com que Mário Soares, concorde-se ou não com ele (e era perfeitamente possível não concordar com ele), tenha sido, como nenhum outro, o português que melhor permitia detetar quem não prestava. Quer saber se um português não presta? Ponha-o a falar sobre o Mário Soares.
1 comentário :
Pois Filipe, é verdade, mas não esquecer que Mário Soares era quase tão detestado para os lados do PCP como para os lados da Extrema-Direita. Aliás, apesar da mensagem de condolências do PCP ser respeitadora e sem hipocrisias, não deixa de chamar a atenção (de acordo com os comunistas) para a oposição de Soares ao 'rumo emancipador da Revolução de Abril e às suas conquistas, incluindo a soberania nacional'. Ao fim destes anos todos, os comunistas ainda não querem entender que a esmagadora maioria do Povo Português rejeitou o dito 'rumo emancipador' em eleições sucessivas. E como não querem entender, também não tiram daí consequências. Mário Soares suscitava ódios em praticamente todos os quadrantes políticos, PS incluído (e eu não sou propriamente um admirador do seu estilo monárquico de exercício do Poder embora ache que o melhor que ele fez foi mesmo ter metido o socialismo na gaveta, depois dos disparates de Mitterrand). O que quer dizer que o que fez esteve quase sempre certo...
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