sábado, 19 de maio de 2018

Futebol: a cocaína do povo

O futebol português vive de celebrar uma cultura de sectarismo, fanatismo e violência. Os comportamentos mais fomentados entre os adeptos são encontrar apenas qualidades no seu próprio clube e defeitos nos outros, apoiar os seus mesmo quando não merecem e desculpar a violência quando parte do lado respectivo, ao mesmo tempo não tolerando qualquer comportamento deste género vindo do outro lado. Um adepto que veja um penalti bem marcado contra o seu clube é um traidor, outro que elabore teorias de conspiração envolvendo clubes adversários em qualquer cartão amarelo contra a sua seita merece ser ouvido com respeito.

O futebol português, hoje em dia, nada tem que ver com desporto, no sentido de celebrar virtudes como a capacidade de reconhecer as qualidades dos adversários, de premiar o esforço mesmo quando inglório ou de reconhecer que os árbitros devem ser respeitados mesmo quando não concordamos. É hoje claramente um problema social grave, o que infelizmente era de esperar muito, em particular desde o Euro 2004.


O que se pode fazer sem limitar liberdades fundamentais é muito pouco. Proibir programas televisivos que não fazem mais do que promover valores anti-desportivos de facciosismo, parcialidade e intolerância seria, há que reconhecê-lo, um atentado à liberdade de expressão. «Proibir claques» seria outro atentado, à liberdade de associação (para além de não ser exequível). Todavia, toda a cultura futebolística é um perigo para a democracia, a médio e longo prazo, como se viu esta semana. Não por acaso, o político mais xenófobo da democracia (André Ventura) veio do submundo do «comentário futebolístico», assim como o mais tacanhamente provinciano e bairrista (Rui Moreira).

O que fazer, então? Cortar subsídios públicos a grandes empresas que representam a maior indústria do entretenimento em Portugal seria ineficaz. Seria melhor proibir a entrada de crianças em estádios de futebol, e para isso há bons argumentos: nenhuma sociedade saudavelmente democrática progride com os valores que o futebolismo actual promove.


Noutra frente, e à semelhança do que se fez noutras paragens, a proibição de frequentar estádios de futebol deve ser vulgarizada como modo de afastar em massa os piores «adeptos» dos estádios de futebol.

Finalmente, seria uma medida de prevenção do agravamento da situação (e de higiene) que os políticos deixassem de procurar do modo infantil que o fazem os estádios de futebol, as respectivas bandeirinhas e cachecóis, os futebolistas populares e os dirigentes das seitas. Ao continuarem a «ir à bola» ostensivamente e ao usarem-na para se promoverem, os políticos estão a contribuir para alimentar um monstro.


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