quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Dualidades perversas - Inconformismo e Compromisso

Como já escrevi no texto anterior, «há dinâmicas sociais que dificultam a transformação do mundo num lugar melhor. Elas têm origem na existência de características humanas que tanto têm um lado positivo como negativo, sendo muito raro alguém te-las de tal forma que o lado positivo surge sem o negativo associado; ou a ausência do negativo não corresponde também à ausência do positivo.»

Olhemos para o inconformismo - a motivação para lutar pela transformação do mundo, em vez de aceitar os seus problemas e injustiças. A vontade de adpatar o mundo aos desejos de prosperidade, liberdade, e justiça, em vez nos adptarmos à existência de escassez, tirania, violência, injustiça.

O inconformismo descrito assim parece louvável, e certamente tem um lado muito positivo. Foram incomformistas aqueles que lutaram contra a escravatura, pelo sufrágio feminino, contra a monarquia absolutista, contra tantas formas de opressão injusta. Mas raramente o inconformismo é perfeitamente selectivo.

É comum que os mais inconformistas tenham maior dificuldade em aceitar o compromisso. Não se conformam com menos do que aquilo que acreditam ser justo, e por isso é que não se conformam com o mundo e têm volição para tentar mudá-lo, com todo o esforço que isso tantas vezes implica. Mas sem aceitar o compromisso, é mais difícil trabalhar em grupo de forma eficaz. Quando são precisos muitos para travar uma batalha, a forma como se organizam não poderá parecer justa e adequada para todos, dificilmente parecerá perfeita para a maioria, e será certamente inaceitável se os seus elementos forem incapazes de aceitar o compromisso.

Às vezes o problema pode ser ainda mais complicado. Alguns inconformistas têm volição e consequente empenho porque se vêem fortes e poderosos face ao mundo: não é o mundo quem dita as regras, eles podem muda-las. Mas este egocentrismo - com tudo o que de bom pode ter ao nível da independência intelectual, da originalidade do discurso, etc - pode dificultar também o trabalho de grupo. Mais dificilmente aceitam a perspectiva dos outros elementos, mais dificilmente se conformam quando o grupo rejeitou a sua, nem que seja a respeito de um mero detalhe.

Assim, aqueles que lutam para transformar fundamentalmente o mundo têm mais dicifuldade em ser eficazes quando se associam. E quando a mudança porque lutam é positiva...

... é uma pena.

4 comentários:

  1. As organizações que funcionam na base do dogma e da autoridade funcionam sempre bem, desde que tenham um número mínimo de elementos. O que importa, para eles, é obedecer sem questionar. Nessa base, qq organização funciona. Mas os chatos que pensam pela sua cabeça, que questionam as ordens e tudo o resto, passam o tempo a discutir. E até duvidam da sua própria acção. Mesmo assim, acredito que a democracia é possível.

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  2. É isso mesmo Ricardo.

    Organizações onde se perca muito tempo a discutir, podem ser menos eficazes na luta pelos seus objectivos, mas existe maior probabilidade de que os objectivos sejam os correctos.
    Uma dualidade perversa.

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  3. A dualidade é a do ser humano quando vive em sociedade. É entre o que cada um pretende (os inconformistas com mais volição tendem a acreditar - com mais força - que sabem o que é melhor para eles e para os outros) e o que os outros pretendem ( muitas pessoas acomodam-se às situações em que vivem e rejeitam ideias diferentes) mas há equilibrios.

    É sempre o dilema entre o que se chama "foco" e a capacidade empática de cada um.

    Se a capacidade de empatizar dos inconformistas for pouca, então temos problemas...

    Se a capacidade de ter um foco da maior parte do grupo for baixa ou nula ou tiver sido dissuadida então temos outro tipo de problemas!

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