sábado, 11 de junho de 2011

Ainda sobre as convergências à Esquerda

O Rui Tavares escreveu um excelente texto, que vale a pena partilhar:


«É, apesar de tudo, injusto dizer que a esquerda portuguesa não consiga estar de acordo. Para dar um exemplo, perguntemos por que não consegue a esquerda portuguesa convergir e a resposta vem pronta: a culpa é do outro partido.

O Partido Socialista dirá, como quem constata uma evidência, que PCP e Bloco estão arrinconados numa confortável posição de protesto e que evitam, ao mínimo pretexto, implicar-se numa governação do país que seja pragmática.

Bloco e PCP dirão que o PS deriva para o centro quando está no governo, quando não aplica medidas que parecem ter saído direitinhas do manual da direita. Apontam para o legado de Sócrates e perguntam se alguém no seu perfeito juízo poderia esperar que fossem eles a salvá-lo.
[...]
Não se pode fazer convergência com quem é, no fundo, o aliado objetivo da direita. E quem é o aliado objetivo da direita? A resposta é simples: o outro partido. É mais do que claro que o PS é aliado objetivo da direita: não o viram assinar o acordo da troika? Entra pelos olhos adentro que o Bloco e o PCP são aliados objetivos da direita: não os viram deitar o governo abaixo?
[...]
Porque a esquerda, na origem, é uma aliança. Mais do que uma doutrina ou uma ideologia, a esquerda é a aliança daqueles que não são ricos nem poderosos. A esquerda é uma aliança de pessoas livres e iguais, fraternas entre si na mesma dignidade.

Sendo os ricos e poderosos naturalmente poucos, a esquerda terá de ser, para ter força, a união dos muitos. E esses muitos são — como é evidente — muito diferentes uns dos outros. Não são, não podem ser, todos da mesma seita. Não têm, e não podem ter, todos os mesmos objetivos de futuro, a mesma visão do mundo, ou o mesmo estilo de vida. Isso é impossível, e a esquerda que é esquerda luta para que isso seja impossível, e para que ainda assim haja unidade entre os muitos, os que não são ricos nem poderosos, os que se arriscam a ser lixados se não souberem fazer uma aliança. [...]»


Com uma maioria sociológica de esquerda, só esta luta fratricida entre os partidos da Esquerda explica o mais recente desastre eleitoral.

10 comentários:

  1. "Maioria sociológica de desquerda" é bonito. Afinal, quem, dentro dessa potencial ou eventual "maioria", se afastou há muito da esqurda?

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  2. «fratricida?»

    Era isso mesmo, foi uma gralha. Já fiz a alteração.

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  3. platao:

    «E quem é o aliado objetivo da direita? A resposta é simples: o outro partido. É mais do que claro que o PS é aliado objetivo da direita»

    Este texto foi escrito por um eurodeputado do BE, e está particularmente lúcido na capacidade de entender perspectivas alheias, na humildade de compreender que as alianças alargadas - necessários num contexto democrático para que as ideias da esquerda se traduzam em medidas concretas - exigem compromisso. Exigem aceitar as diferenças, exigem aceitar que as coisas não sejam da maneira que idealizaríamos.

    Se o PS é um partido tão, tão, tão, tão de direita, então os portugueses claramente querem um governo de direita por terem votado 3/4 em partidos tão à direita. Desiste-se então de tentar governar, e espera-se por melhores dias, quando BE e CDU possam ter cerca de 50% dos votos ou deputados. Eu esperaria sentado.

    E depois há o pequeno detalhe de BE e CDU nem sequer terem conseguido fazer uma coligação pré-eleitoral entre eles, que muito teria favorecido a esquerda nestas eleições.

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  4. divisões devem-se esbater

    é necessário cortar nos previlégios do estado sem cortar nas pessoas

    especialmente nas que ganham menos de 1000 por mês

    agora há que racionalizar recursos

    quando um procurador tem uma agenda e um oficial de justiça outra

    quando um gadjo numa empresa pública e um sub-director na mesma recebem brindes de sítios diferentes

    a duplicação de encomendas leva a problemas de excessos que vão desaparecendo via mão leve de funcionários mal pagos

    entre os 1500 e os 2500 por mês

    é nestes tostõezinhos que se vão os anéis e os contos de réis

    a CP faz um trabalho de importância social tremenda

    quem levava aquelas 3 velhotas e os 4 turistas e mais os 7 dos gangs do vale da amoreira até ao lavradio se nã houvesse comboio?

    o revisor nem pediu bilhete
    infelizmente pediu às velhotas gente mai necessitada

    greve geral permanente...já faltou mais

    e quando só houver escudos vai ser mais fácil

    se nã houvesse

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  5. obviamente a Mota-Engil a SLN e outras também deviam levar por tabela

    mas o $ anda desde N.Y. às islas Caimão e New Zeland

    hacer o quê né

    racionalizar com PCP e BE a gritarem por uma constituição copiada do século XIX e com mais acrescentos que a tornam ilegível

    os ingleses perduraram 3 séculos in semi-democracia sem constituições e sem Blocos

    o mundo muda há que saber adaptar-se

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  6. O que se passa com a dita esquerda tem a ver um pouco com a história do mundo, das corporações e ideologias.
    Durante o seu início representava (ou reinvidicava) defender os mais desfavorecidos mas hoje quando vemos certas atitudes das centrais sindicais (como aquela de os funcionários públicos são quem paga a crise) há que reconhecer que alguns poderes instalados são defendidos também à esquerda.
    Quanto ao BE, estou de acordo em muitas coisas que eles afirmam sobre remunerações em organismo públicos e trocas de influências.
    Mas será que aqueles ataques desenfreados ao Capital iriam dar alguma coisa de bom?

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  7. João Moutinho:

    Eu pessoalmente não sou contra a economia de mercado ("capitalismo"?), e é verdade que muitas pessoas no BE são, e naturalmente discordarei delas.

    Mas a deriva para a direita do nosso espectro partidário foi de tal forma completa, que quando olhamos para os programas eleitorais de BE e PCP nos últimos anos, vemos lá programas sociais democratas.

    São partidos cheios de comunistas, sim, mas as propostas destes partidos já são sociais democratas.

    O BE e o PCP são hoje aquilo que o PSD era nos anos 70, com a diferença que os restantes partidos com representação parlamentar estão todos à direita (ao contrário do que acontecia com o PSD).

    Nesse sentido, não me parece que a maioria das propostas do BE fossem "ataques desenfreados ao Capitalismo". Aumentar um imposto sobre a grandes fortunas aqui, o IRC efectivo sobre os bancos ali, e a economia de mercado aguentava, como aguentou nesses anos em que a economia Portugal crescia bastante, mesmo com a GALP e outras tantas nacionalizadas.


    Sobre os sindicatos, creio que ironicamente o nosso problema é uma taxa de sindicalização muito reduzida.
    Isso tem duas consequências negativas: sindicatos fracos, e extremistas.
    Extremistas, porque quando só 15% dos trabalhadores está sindicalizado, não são trabalhadores ao acaso. Com maior probabilidade são aqueles com uma posição de princípio contra a economia de mercado, menos abertura para o compromisso e negociação.

    Assim, com uma taxa de sindicalização tão baixa Portugal tem o pior dos dois mundos: tem enormes desigualdades de rendimento (das maiores da Europa), pois os sindicatos são fracos.
    Mas tem greves a torto e a direito, que incomodam muita gente e trazem poucos benefícios, pois os sindicatos estão pouco abertos à negociação.

    Os sindicatos suecos, onde existe uma taxa de sindicalização de 70%, podem convocar muito poucas greves - preferem negociar - mas o medo de que o façam, sendo uma instituição poderosa, é suficiente para que as suas pretensões sejam levadas a sério pelo patronato, o que acaba por levar a um menor grau de desigualdades na Suécia, e por consequência a uma maior qualidade de vida.

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  8. "arrinconados" tb deve ser gralha. senão, é lindo, lindo

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  9. João Vasco

    Não deixo de concordar consigo em muita coisa e de forma alguma regozijo com o que foram as "parcerias" na Saúde e outras - ou as passagens dos Hospitais SPA para SA - agora EPE.
    Mas o imposto sobre as grandes fortunas parece-me uma brincadeira de mau gosto - vejo-a com impraticável.
    Quanto à sua análise sobre o peso sindical, concordo consigo. Mas vejo-a também como um exemplo da cristalização da esquerda e da má distribuição do seu poder.
    Segundo o meu singelo entendimento o peso sindical dever-se-ia sentir essencialemente no sector privado. privado

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