O Rui Tavares escreveu um excelente texto, que vale a pena partilhar:
«É, apesar de tudo, injusto dizer que a esquerda portuguesa não consiga estar de acordo. Para dar um exemplo, perguntemos por que não consegue a esquerda portuguesa convergir e a resposta vem pronta: a culpa é do outro partido.
O Partido Socialista dirá, como quem constata uma evidência, que PCP e Bloco estão arrinconados numa confortável posição de protesto e que evitam, ao mínimo pretexto, implicar-se numa governação do país que seja pragmática.
Bloco e PCP dirão que o PS deriva para o centro quando está no governo, quando não aplica medidas que parecem ter saído direitinhas do manual da direita. Apontam para o legado de Sócrates e perguntam se alguém no seu perfeito juízo poderia esperar que fossem eles a salvá-lo.
[...]
Não se pode fazer convergência com quem é, no fundo, o aliado objetivo da direita. E quem é o aliado objetivo da direita? A resposta é simples: o outro partido. É mais do que claro que o PS é aliado objetivo da direita: não o viram assinar o acordo da troika? Entra pelos olhos adentro que o Bloco e o PCP são aliados objetivos da direita: não os viram deitar o governo abaixo?
[...]
Porque a esquerda, na origem, é uma aliança. Mais do que uma doutrina ou uma ideologia, a esquerda é a aliança daqueles que não são ricos nem poderosos. A esquerda é uma aliança de pessoas livres e iguais, fraternas entre si na mesma dignidade.
Sendo os ricos e poderosos naturalmente poucos, a esquerda terá de ser, para ter força, a união dos muitos. E esses muitos são — como é evidente — muito diferentes uns dos outros. Não são, não podem ser, todos da mesma seita. Não têm, e não podem ter, todos os mesmos objetivos de futuro, a mesma visão do mundo, ou o mesmo estilo de vida. Isso é impossível, e a esquerda que é esquerda luta para que isso seja impossível, e para que ainda assim haja unidade entre os muitos, os que não são ricos nem poderosos, os que se arriscam a ser lixados se não souberem fazer uma aliança. [...]»
Com uma maioria sociológica de esquerda, só esta luta fratricida entre os partidos da Esquerda explica o mais recente desastre eleitoral.
fratricida?
ResponderEliminarfra ti sida?
fratrias? ou fatias?
"Maioria sociológica de desquerda" é bonito. Afinal, quem, dentro dessa potencial ou eventual "maioria", se afastou há muito da esqurda?
ResponderEliminar«fratricida?»
ResponderEliminarEra isso mesmo, foi uma gralha. Já fiz a alteração.
platao:
ResponderEliminar«E quem é o aliado objetivo da direita? A resposta é simples: o outro partido. É mais do que claro que o PS é aliado objetivo da direita»
Este texto foi escrito por um eurodeputado do BE, e está particularmente lúcido na capacidade de entender perspectivas alheias, na humildade de compreender que as alianças alargadas - necessários num contexto democrático para que as ideias da esquerda se traduzam em medidas concretas - exigem compromisso. Exigem aceitar as diferenças, exigem aceitar que as coisas não sejam da maneira que idealizaríamos.
Se o PS é um partido tão, tão, tão, tão de direita, então os portugueses claramente querem um governo de direita por terem votado 3/4 em partidos tão à direita. Desiste-se então de tentar governar, e espera-se por melhores dias, quando BE e CDU possam ter cerca de 50% dos votos ou deputados. Eu esperaria sentado.
E depois há o pequeno detalhe de BE e CDU nem sequer terem conseguido fazer uma coligação pré-eleitoral entre eles, que muito teria favorecido a esquerda nestas eleições.
divisões devem-se esbater
ResponderEliminaré necessário cortar nos previlégios do estado sem cortar nas pessoas
especialmente nas que ganham menos de 1000 por mês
agora há que racionalizar recursos
quando um procurador tem uma agenda e um oficial de justiça outra
quando um gadjo numa empresa pública e um sub-director na mesma recebem brindes de sítios diferentes
a duplicação de encomendas leva a problemas de excessos que vão desaparecendo via mão leve de funcionários mal pagos
entre os 1500 e os 2500 por mês
é nestes tostõezinhos que se vão os anéis e os contos de réis
a CP faz um trabalho de importância social tremenda
quem levava aquelas 3 velhotas e os 4 turistas e mais os 7 dos gangs do vale da amoreira até ao lavradio se nã houvesse comboio?
o revisor nem pediu bilhete
infelizmente pediu às velhotas gente mai necessitada
greve geral permanente...já faltou mais
e quando só houver escudos vai ser mais fácil
se nã houvesse
obviamente a Mota-Engil a SLN e outras também deviam levar por tabela
ResponderEliminarmas o $ anda desde N.Y. às islas Caimão e New Zeland
hacer o quê né
racionalizar com PCP e BE a gritarem por uma constituição copiada do século XIX e com mais acrescentos que a tornam ilegível
os ingleses perduraram 3 séculos in semi-democracia sem constituições e sem Blocos
o mundo muda há que saber adaptar-se
O que se passa com a dita esquerda tem a ver um pouco com a história do mundo, das corporações e ideologias.
ResponderEliminarDurante o seu início representava (ou reinvidicava) defender os mais desfavorecidos mas hoje quando vemos certas atitudes das centrais sindicais (como aquela de os funcionários públicos são quem paga a crise) há que reconhecer que alguns poderes instalados são defendidos também à esquerda.
Quanto ao BE, estou de acordo em muitas coisas que eles afirmam sobre remunerações em organismo públicos e trocas de influências.
Mas será que aqueles ataques desenfreados ao Capital iriam dar alguma coisa de bom?
João Moutinho:
ResponderEliminarEu pessoalmente não sou contra a economia de mercado ("capitalismo"?), e é verdade que muitas pessoas no BE são, e naturalmente discordarei delas.
Mas a deriva para a direita do nosso espectro partidário foi de tal forma completa, que quando olhamos para os programas eleitorais de BE e PCP nos últimos anos, vemos lá programas sociais democratas.
São partidos cheios de comunistas, sim, mas as propostas destes partidos já são sociais democratas.
O BE e o PCP são hoje aquilo que o PSD era nos anos 70, com a diferença que os restantes partidos com representação parlamentar estão todos à direita (ao contrário do que acontecia com o PSD).
Nesse sentido, não me parece que a maioria das propostas do BE fossem "ataques desenfreados ao Capitalismo". Aumentar um imposto sobre a grandes fortunas aqui, o IRC efectivo sobre os bancos ali, e a economia de mercado aguentava, como aguentou nesses anos em que a economia Portugal crescia bastante, mesmo com a GALP e outras tantas nacionalizadas.
Sobre os sindicatos, creio que ironicamente o nosso problema é uma taxa de sindicalização muito reduzida.
Isso tem duas consequências negativas: sindicatos fracos, e extremistas.
Extremistas, porque quando só 15% dos trabalhadores está sindicalizado, não são trabalhadores ao acaso. Com maior probabilidade são aqueles com uma posição de princípio contra a economia de mercado, menos abertura para o compromisso e negociação.
Assim, com uma taxa de sindicalização tão baixa Portugal tem o pior dos dois mundos: tem enormes desigualdades de rendimento (das maiores da Europa), pois os sindicatos são fracos.
Mas tem greves a torto e a direito, que incomodam muita gente e trazem poucos benefícios, pois os sindicatos estão pouco abertos à negociação.
Os sindicatos suecos, onde existe uma taxa de sindicalização de 70%, podem convocar muito poucas greves - preferem negociar - mas o medo de que o façam, sendo uma instituição poderosa, é suficiente para que as suas pretensões sejam levadas a sério pelo patronato, o que acaba por levar a um menor grau de desigualdades na Suécia, e por consequência a uma maior qualidade de vida.
"arrinconados" tb deve ser gralha. senão, é lindo, lindo
ResponderEliminarJoão Vasco
ResponderEliminarNão deixo de concordar consigo em muita coisa e de forma alguma regozijo com o que foram as "parcerias" na Saúde e outras - ou as passagens dos Hospitais SPA para SA - agora EPE.
Mas o imposto sobre as grandes fortunas parece-me uma brincadeira de mau gosto - vejo-a com impraticável.
Quanto à sua análise sobre o peso sindical, concordo consigo. Mas vejo-a também como um exemplo da cristalização da esquerda e da má distribuição do seu poder.
Segundo o meu singelo entendimento o peso sindical dever-se-ia sentir essencialemente no sector privado. privado