quarta-feira, 2 de outubro de 2013

A abstenção, agora sem percentagens

A maneira mais eficaz de comparar a participação eleitoral em anos diferentes é simplesmente contar quantos cidadãos votaram. A «taxa de abstenção» só baralha, porque é uma percentagem inflacionada pelos «eleitores-fantasma».

Os dados brutos da participação eleitoral são os do quadro seguinte (via Pordata).

     AnoInscritos      Votantes
     19766.460.5284.170.494
 19796.761.7514.987.734
 19827.185.2845.131.483
 19857.593.9684.852.563
 19898.121.0454.946.196
 19938.530.2975.408.119
 19978.922.1825.362.609
 20018.738.9065.254.180
 20058.840.2235.390.571
 20099.377.3435.533.824
 20139.497.3034.995.174

Note-se que houve efectivamente menos meio milhão de votantes entre 2009 e 2013, mas que 2009 também foi o ano em que mais cidadãos votaram nas autárquicas em toda a história da 2ª República. Mais: em 1985 e 1989 votaram ainda menos cidadãos do que domingo passado. A participação eleitoral, em dez autárquicas (1976 foi uma excepção), oscilou sempre «apenas» entre 4,85 milhões e 5,4 milhões de votantes. O que faz realmente «subir a abstenção taxa de abstenção» no longo prazo (ver o gráfico), é o aumento (quase) contínuo no número de inscritos, que só baixou em 1998 (revisão Guterres dos cadernos eleitorais). Entre 2005 e 2009, a abstenção fictícia (devida aos eleitores fantasma) subiu espectacularmente* (com a participação efectiva... a subir). O que me faz desconfiar que a grande «fábrica do abstencionismo» mais recente se chama... Cartão do Cidadão.


* Os cépticos que me digam que explicação têm para um crescimento do eleitorado de 540 mil pessoas em quatro anos, num país em que o «saldo natural» é quase nulo.

14 comentários:

  1. Como é que o cartão de cidadão faz aumentar o número de eleitores-fantasma?

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  2. Confesso que não entendo por que há tantos eleitores-fantasma. Quando morre algum cidadão, a família tem que o comunicar ao registo civil e às finanças, o que deveria desencadear de imediato que dele fosse dada baixa nos cadernos eleitorais. Restariam apenas como eleitores-fantasma os que emigram e não comunicaram ainda a mudança de residência. Por que razão têm os governos interesse em manter esta situação?

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    1. Respondo-lhe primeiro porque está a meter o dedo na ferida: porque não se corrigem os cadernos eleitorais? A resposta é simples: o número de vereadores, os salários autárquicos desde o PCM aos membros das juntas, os subsídios que as autarquias recebem, é tudo calculado com base no número de eleitores recenseados. Logo, as juntas de freguesia não têm interesse em eliminar os mortos e os que mudaram de freguesia dos seus cadernos eleitorais.

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    2. Seria fácil corrigir este problema.
      Decretava-se, por exemplo: a nível de todo o país, o número total de vereadores é 3000. Estes 3000 vereadores são repartidos por entre as diferentes câmaras municipais de acordo com o número de votos entrados em urna em cada eleição.
      Desta forma, o número de vereadores seria sempre o mesmo a nível nacional, os salários totais deles todos também, e seriam em cada eleição favorecidos com mais vereadores os concelhos em que mais gente votasse...

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    3. Ena, por uma vez concordamos a 100%!
      Esse sistema é aquele usado na Polónia, pelo menos nas eleiçöes europeias (eles näo têm como em Portugal um só círculo nacional): quantos deputados elege cada círculo depende do número de votos depositados.

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    4. Concordo com a distribuição de mandatos pelo número de votantes, e não pelo número de recenseados. Seria sem dúvida mais importante para as autarquias pelas razões mencionadas pelo Luís Lavoura, mas nas legislativas poderia corrigir as distorções à proporcionalidade...

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  3. «Os cépticos que me digam que explicação têm para um crescimento do eleitorado de 540 mil pessoas em quatro anos, num país em que o «saldo natural» é quase nulo.»

    A população está a envelhecer. Mesmo sem crescimento, a fracção de pessoas com menos de 18 anos vai diminuindo e a de pessoas com mais de 18 anos vai aumentando. Não sei se isso dá 500 mil em 4 anos, mas alguma coisa deve dar...

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    1. Ia dizer o mesmo. As % oficiais estão claramente exageradas, mas há que ver o envelhecimento demográfico.

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    2. Ludwig e Miguel:
      - entre 2001 e 2005, os inscritos aumentaram 100 mil;
      - entre 2009 e 2013, aumentaram 120 mil;
      - mas entre 2005 e 2009 aumentaram uns estrondosos 540 mil.

      Só estes três números chegam para evidenciar que qualquer coisa de muito anormal se passou nesse quadriénio: há uns 430 mil novos eleitores acima da média dos quadriénios adjacentes...

      Passo agora à vossa objecção.

      A minha resposta é:
      a) O nº de óbitos anual anda pelos 105 mil (+/-5 mil);
      b) A população por escalões etários quadrianuais anda pelos 570 mil (+/- 20 mil), e portanto devem fazer 18 anos umas 140 mil pessoas em cada ano.

      A diferença entre b) e a) é portanto positiva, mas apenas por uns 35 mil. Multiplicado por 4 (anos) dá uns 140 mil, que é consistente com as subidas dos anos 2001-2005 e 2009-2013. Mas não chega para a subida do quadriénio 2005-2009. De forma alguma...

      http://www.pordata.pt/Portugal/Populacao+residente+segundo+os+Censos+total+e+por+grupo+etario-2

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    3. qualquer coisa de muito anormal se passou nesse quadriénio

      Anormal em relação aos quadriénios imediatamente anterior e posterior, mas não em relação aos restantes quadriénios.
      Em todos os quadriénios desde 1976 até 1997, o número de votantes incritos aumentou um meio milhão.

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    4. Talvez o Luís Lavoura e o Ricardo Alves tenham os dois razão. Talvez nalguns quadriénios alguns cidadãos com idade legal não se tenham registado nos cadernos eleitorais e na altura da entrada em vigor do Cartão do Cidadão isso tenha sido rectificado.

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    5. Luís Lavoura,
      os que começaram a votar em 1997 tinham nascido em 1975-1979. Ou seja, em 2011 teriam 32-36 anos. O Pordata dá-me 734 mil pessoas no escalão etário 30-34 em 2011, e 825 mil no escalão 35-39. Os escalões etários mais jovens que são mais pequenos, da ordem das 550 mil pessoas. Não faz sentido que havendo menos pessoas a fazer 18 anos o número de eleitores continue a crescer na mesma proporção...

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  4. E säo 10% de abstencionistas à cabeça, dos fantasmas, mais os emigrados dos últimos anos que ainda näo o comunicaram na JF.

    Näo achindrarm que a subida da abstençäo foram PPDs desiludidos (ai tadinhos) que já näo querem votar no partido do Passos, mas que näo querem votar em mais ninguém porque para eles a política é como o futebol, logo näo se muda de partido?
    A gente dessa, de clubite partidária, que venha o verdugo que merecem!

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  5. Entre 2005 e 2009, as pessoas que faleceram não foram «abatidas» aos cadernos eleitorais pelas razões que o Ricardo Alves, já aqui evidenciou.

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