terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Os Donos de Portugal e a Mão no Poder

Paulo Morais escreve mais uma crónica certeira (destaques meus) com título «A Mão no Poder»:

«Até hoje, cativam uma parte significativa do orçamento de estado, à custa do qual se habituaram a enriquecer. Beneficiam de rendas das parcerias público-privadas da saúde, como acontece com o grupo Mello ou Espírito Santo. Recebem milhões pelo pagamento de juros da dívida pública. Obtêm concessões em monopólio, como acontece com a Brisa, detentora, por autorização governamental, das auto-estradas de Porto a Lisboa.

Os favores que recebem do estado têm revestido as mais diversas formas. No tempo do fascismo, obtinham licenças num regime de condicionamento industrial, em que só os amigos do regime podiam criar empresas. O seu domínio sobre a economia e a política vem dos tempos da monarquia, onde pontificava o conde do Cartaxo, antepassado da família Mello. Já os Espírito Santo descendem do poderoso conde de Rendufe.

Assim, estes grupos conseguiram trazer até ao século XXI, incólume, a lógica feudal, a tradição de atribuição de prebendas aos poderosos. Com uma diferença. Enquanto no tempo do feudalismo o rei atribuía privilégios que consistiam na doação de benefícios económicos (terras), a par de poder político (títulos), hoje apenas se concedem favores económicos. Assim, estes grupos mantêm o poder sem os incómodos do escrutínio democrático. Sabem que mais importante do que ter o poder na mão é ter a mão no poder. Até porque sempre influenciaram a política. Conseguiram-no no tempo de Salazar, através do fascínio que Ricardo Espírito Santo exercia sobre o ditador. Em democracia, contratam políticos de todas as tendências. Eanistas como Henrique Granadeiro, socialistas como Manuel Pinho ou social-democratas como Catroga.

Neste jogo democrático viciado, os cidadãos são hoje como os servos da gleba de outrora, mas agora sob a forma de contribuintes usurpados. E reféns do sistema vigente, que muitos chamam de neoliberalismo, mas que não é novo nem é liberal. É apenas a manutenção do velho feudalismo.»

O livro que leio neste momento é todo ele sobre este tema, que é aprofundado em detalhe. «Os Donos de Portugal - Cem anos de poder económico (1910-2010)» é assim descrito (destaques meus):

«Este livro apresenta os donos de Portugal e faz a história política da acumulação de capital ao longo dos anos que vão de 1910 a 2010. Descobre-se a fortuna nascida da protecção: pelas pautas alfandegárias contra a concorrência, pela ditadura contra as classes populares, pela liberalização contra a democracia na economia.
Esta burguesia é uma teia de relações próximas: os Champalimaud, Mello, Ulrich, entre outros, unem-se numa mesma família. Os principais interesses económicos conjugam-se na finança. Esta burguesia é estatista e autoritária: o seu mercado é o Estado e depende por isso da promiscuidade entre política e negócios.
"Os Donos de Portugal" retrata também um fracasso monumental: o de uma oligarquia financeira incapaz de se modernizar com democracia, beneficiária do atraso, atraída pela especulação e pelas rendas do Estado e que se afasta da produção e da modernização. Ameaçada pelo 25 de Abril, esta oligarquia restabeleceu-se através de um gigantesco processo de concentração de capital organizado pelas privatizações. Os escândalos do BCP, do BPN e do BPP revelaram as faces da ganância. Este livro demonstra como os donos de Portugal se instalam sobre o privilégio e favorecimento.»

Os autores são Jorge Costa, Luís Fazenda, Cecília Honório, Francisco Louçã e Fernando Rosas. A informação presente nesta obra fundamenta a justa denúncia feita por Paulo Morais. O que também tem o seu lado curioso.

Revista de blogues (31/1/2012)

  • «Um diplomata europeu citado por The Economist considerava há dias que o novo pacto orçamental que a Alemanha quer impor aos países do Eurogrupo consistia em assinar “um tratado que torna o keynesianismo ilegal".
    Já há muitos anos que os países mais ricos da União Europeia têm vindo a impor aos seus confrades (...) medidas que tornam uma política de esquerda ilegal ou impraticável, dificultando de todas as formas possíveis, em nome da defesa do mercado e da livre concorrência, intervenções dos Estados na economia que permitiriam regular determinados sectores e evitar o agravamento de desigualdades na sociedade. Pode-se dizer que todas estas medidas foram adoptadas devido a um consenso - que envolveu tanto Governos de direita como Governos auto-intitulados sociais-democratas - em torno do pensamento neoliberal, que prometeu o bem-estar como resultado mágico do mercado livre. Pode-se dizer que todas estas medidas foram adoptadas em Conselhos Europeus constituídos por Governos democraticamente eleitos. No entanto, o facto persiste que, para levar a cabo uma política minimamente de esquerda num qualquer país da UE, passou a ser necessário não só um Governo maioritário no país em questão como a determinação de combater milímetro a milímetro uma Comissão Europeia e um Conselho Europeu armados de toda a espécie de determinações neoliberais plasmadas em tratados e normas. (...)» (José Vítor Malheiros)

Uma gordura do Estado que quer engordar ainda mais

Num país que tem um general para cada 260 soldados (os EUA têm um general para cada 870), e no meio da maior crise das últimas décadas, os militares querem ser todos promovidos.

A estes não manda o Passos emigrar...

O ideólogo de Merkel ou o travão da Europa



Depois de mais uma cimeira europeia sem novidades para combater a crise, vale a pena relembrar esta entrevista de Wolfgang Franz (conselheiro de Merkel) à Euronews, onde este explica porque é contra a emissão de títulos de dívida em euros. Neste resumo da entrevista falta a passagem mais interessante. Quando pressionado pelo jornalista como justificava a sua oposição às euro-obrigações, Wolfgang Franz referiu que os restantes países da zona euro não sabiam o que é ter uma inflação alta. Acrescentou que na Alemanha ainda há quem se lembre dessa péssima experiência. O problema é que os motivos que levaram à hiper-inflação de 1923 (um pão chegou a custar dezenas de milhares de milhões de marcos) se devem exclusivamente à sucessão de castigos absurdos que os vencedores da primeira guerra infligiram à Alemanha. Em particular, quando a França passou a absorver nesse ano toda a produção de carvão alemã como represália ao atraso no pagamento das dívidas de guerra.

À primeira vista as motivações de Wolfgang Franz parecem enquadradas pelo típico ódio contra a inflação, tão típicos da ideologia Reagan-Thatcher. Como se uma inflação alta fosse pior do que o momento económico que estamos a viver. Mas numa segunda análise perguntamo-nos se não estamos perante uma vingança velada de muito mau gosto (que atinge a própria Alemanha). É nisto que anda a patinar a Europa. Resta a esperança de as próximas eleições alemãs apearem estes senhores definitivamente.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Não há pior derrota do que não ir à luta

Espanta-me o silêncio da «esquerda» perante o fim do feriado do 5 de Outubro. Eu sei, existe uma ofensiva em curso contra os direitos laborais e anuncia-se a privatização dos serviços públicos. Mas os feriados que um regime celebra são mais do que simbólicos. São a cor do regime. E tirando intervenções como as de Mário Soares e Manuel Alegre, ouço um silêncio estranho. De todos. Do PS, do BE e do PCP. E ainda mais absurdo (embora menos espantoso) é o silêncio perante a subserviência à ICAR.

A esquerda vive desde o 25 de Abril entre derrotas e intervalos entre derrotas. Com a direita no poder (AD, Cavaco, Passos), o regime vira sempre bastante à direita. Com o PS no governo, gere-se o centro sem reverter nada do que a direita fez. É assim porque nunca houve governos de esquerda desde 1976, só governos do PS. E não é a mesma coisa.

Seguro deveria comprometer-se desde já com o regresso do feriado do 5 de Outubro. Não o fazer, mostra que nem uma batalha por algo tão fundamental está disposto a travar.

O CDS é um partido monárquico e deveria assumi-lo

O CDS propôs hoje que o 1 de Dezembro continue a ser celebrado, agora mais institucionalmente, até envolvendo «as escolas públicas, as missões diplomáticas de Portugal no estrangeiro (...) os governos regionais e autarquias locais». A iniciativa só surpreenderá os mais distraídos ou ingénuos, que acreditarão que o fim do 5 de Outubro é uma medida meramente economicista. Não. O CDS é dirigido por um membro da Causa Real, outro dos seus ministros é dirigente da dita, e há muitas personalidades do CDS monárquicas, como ainda Lobo Xavier ou Telmo Correia. Fora os monárquicos explícitos, há católicos políticos (que também detestarão o 5 de Outubro por razões ligeiramente diferentes). Seria mais honesto que o CDS se assumisse como partido monárquico e assim se apresentasse a eleições.

Álvaro Santos Pereira será o primeiro a sair

O inquérito com a pergunta «qual será o primeiro ministro a cair em 2012?» teve um resultado claríssimo: Álvaro Santos Pereira foi o mais votado, com 200 votos num total de 322 (62%). Em segundo lugar ficou Passos Coelho com 29 votos (9%), e Vítor Gaspar com 25 (8%). No quarto lugar, ex-aequo, Assunção Cristas e Paula Teixeira da Cruz (14 votos cada, 4%). Nuno Crato teve 10 votos (3%), e todos os outros sete votos (Miguel Macedo) ou ainda menos.

É oficial: Alemanha quer tutelar a Grécia

É oficial: a Alemanha quer que a Grécia aceite um comissário da UE em Atenas, com direito de veto sobre as despesas correntes e outras «competências orçamentais». A proposta, ontem, era só um rumor. Hoje tem a cara de Philipp Roesler. Ou seja, o FDP confirma-se como o partido mais «imperialista» do actual governo da Europa (o real, o alemão). E Martin Schulz, presidente do Parlamento europeu, também alemão mas socialista, apoia a ideia.

Parece uma situação de «pegar ou largar». A brutalidade da proposta ou se destina a empurrar a Grécia para fora da UE e para a bancarrota, ou então esconde um plano B de bastidores, presumivelmente tão ou mais brutal. Em qualquer dos casos, a Grécia chegou ao dilema final da UE, que desde Maastricht se desenhava: ou democracia nacional ou Europa alemã.

Se isto é um líder da oposição

Seguro diz que “não é o momento” para conflitos "entre órgãos de soberania

domingo, 29 de janeiro de 2012

Pegar ou largar?

É isso que parece a proposta feita à Grécia.

Citações curiosas


«I have worked with investors for 60 years and I have yet to see anyone — not even when capital gains rates were 39.9 percent in 1976-77 — shy away from a sensible investment because of the tax rate on the potential gain.»

Quem o diz é Warren Buffet, o investidor melhor sucedido do mundo inteiro.
Soube disto a propósito das recentes declarações de Bill Gates, alegando que os impostos sobre os mais ricos deveriam aumentar. A esse respeito afirmou também o seguinte:


«"There is no strong correlation between job creation and what the tax environment has been at any point in time," gates said. "If something’s a profitable activity, you’re going to engage in it."»

Cavaco entra em contenção de danos

Basta ler os títulos dos jornais, como resume a Estrela Serrano.

sábado, 28 de janeiro de 2012

Revista de blogues (28/1/2012)

  • «(...) Ao contrário do que se passa por exemplo nos EUA, onde o poder legislativo pode impugnar o ocupante da presidência desde que considere haver motivos para tal, procedendo a um "julgamento" através de uma comissão presidida pelo presidente do Supremo Tribunal, no nosso país a Constituição trata o ocupante de Belém como entidade intocável e praticamente inimputável, que pode dizer e fazer quase tudo (...).

    Temos, pois, uma Constituição que não só exime o PR de sindicâncias como não prevê qualquer situação em que se declare uma incapacidade superveniente para o cargo, como a que adviesse do conhecimento de factos do seu passado que pudessem comprometer irremediavelmente a sua credibilidade e autoridade, uma enfermidade que lhe diminuísse o discernimento ou qualquer outra circunstância adequada a pôr em causa a permanência no lugar. Não: a Constituição portuguesa confia ao PR ajuizar da sua aptidão, mesmo se for precisamente o seu juízo que se questiona.

    Porque será que a figura do Presidente tem este desenho, tão pouco democrático e até tão pouco racional? É lícito, é desejável, é sustentável que se confira a alguém um estatuto tão blindado como este, comparável em tudo ao dos monarcas? Recorde-se que o direito (entre aspas) conferido a reis para o serem advém de uma distinção de sangue ungido, ou seja, do domínio do sagrado e, portanto, do inquestionável. Um presidente é um político eleito - com tudo o que isso implica de distinção mas também de humildade: está ali só e apenas porque se candidatou e foi escolhido; tem sempre de responder perante quem o elegeu. (...)» (Fernanda Câncio)

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

O que é um governo clerical?

É um governo que tem um ministro que toma uma decisão destas: «o Governo aceitou a condição que a própria Igreja [Católica] nos disse». E a justifica desta forma: «para a Igreja [Católica] era muito importante haver simetria, e nós concordámos que fazia sentido haver simetria [na eliminação] de feriados civis e religiosos». Chama-se Álvaro Santos Pereira. E do mesmo passo acabou com o 5 de Outubro. Só faltou explicar se a tal «condição» da ICAR incluía o fim do feriado do 5 de Outubro.

O ministro Mota Soares pertence a uma Ordem monárquica «secreta»?

escrevi, e mantenho, que os cidadãos têm o direito de pertencer a organizações discretas, e que não devem ser obrigados a revelar a sua pertença. No entanto, demonstra uma incrível duplicidade de critérios que poucas semanas depois de uma inusitada «caça às bruxas», em que os jornalistas andaram de microfone na mão a perguntar aos deputados se eram maçons, ninguém pergunte aos membros do governo se pertencem, por exemplo, à Ordem de S. Miguel da Ala. É que esta organização tem por objectivo «a defesa da Fé Católica, Apostólica Romana, a defesa do Rei e do Património Tradicional Português». E o governo acaba de anunciar que o 5 de Outubro, data da implantação da República, deixará de ser feriado. E o ministro Mota Soares é dado num blogue como membro dessa «Ordem» (não sei se do ramo Duarte Bragança se do ramo Câmara Pereira, mas isso a mim pouco me importa).

Ele disse «orgulho»?

Santos Pereira não anunciou apenas que o 5 de Outubro deixará de ser feriado. Anunciou também que o 10 de Junho é mantido «para que se reforce o orgulho de ser português». O conceito é absurdo. Faz sentido ter orgulho em trabalhar, em cumprir deveres, em esforçar-se e em ter resultados. Mas não há mérito algum em ser português por nascimento, como também não há mérito em ser alto, de olhos verdes ou filho de pais ricos. Ter «orgulho» em ser português é ter orgulho em algo para que não se trabalhou.
O 10 de Junho é o mais artificial dos feriados nacionais: é principalmente uma criação do Estado Novo, que em tempos serviu para exaltar a «raça» e até (a partir de 1963) a guerra colonial. Mantê-lo quando se elimina o 5 de Outubro e aumentar a sua importância é introduzir uma deriva salazarista na cultura política do Estado português.

Os monárquicos no governo da República

A Causa Real está «francamente contente» com o fim do feriado do 5 de Outubro. Entende-se. O respectivo presidente esqueceu-se apenas de agradecer publicamente aos dois monárquicos publicamente assumidos do governo: o «destacado» dirigente da Causa Real Mota Soares e o «convicto» quotizante Paulo Portas. Entre outros? Em qualquer caso, é uma ingratidão.

O 5 de Outubro está na Constituição

Só há duas datas com a dignidade de feriado mencionadas na Constituição. Uma é o 25 de Abril.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Já se pode adjectivar Domingos Névoa de corrupto?

O Supremo Tribunal de Justiça revogou a absolvição de Domingos Névoa da Bragaparques, condenando-o a 5 meses de prisão que serão de pena suspensa caso Domingos Névoa indemnize o Estado em 200 mil euros (a pena inicial era de apenas 5 mil euros). Relembro que Ricardo Sá Fernandes tinha sido condenado por difamação e ao pagamento de 10 mil euros, por ter apelidado Domingos Névoa de agente corruptor e vigarista. Só recentemente Sá Fernandes foi absolvido de uma decisão que tinha escandalizado o país.

Convém também relembrar quem é que nos blogues defendeu com afinco a causa de Domingos Névoa. Por exemplo, vale a pena recordar este texto da autoria de João Miranda, escrito no dia seguinte à acusação de Domingos Névoa, no seu habitual estilo troca-tintas onde desculpabiliza e vitimiza Domingos Névoa (o corrupto ilegal, claro o corrupto legal é Sá Fernandes). Outras postas menos trapalhonas mas puramente gratuitas vão no mesmo sentido, aqui e aqui, escritas por André Azevedo Alves, um dos autores do blogue Anacleto, um blogue com muito nível onde não se faziam ataques pessoais nenhuns (ad hominem, não é isso?).

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Autismo

Na maior crise financeira das últimas décadas, e ainda antes do máximo impacto social das medidas troiquistas, o protesto está nas ruas mas quase ausente das instituições.

Grande parte da responsabilidade pelo autismo institucional cabe ao PS. Liderado por um Seguro que não cortou com o passado socrático, a abstenção no Orçamento e a solidão dos deputados que o pretendem fiscalizar no Tribunal Constitucional mostram um alheamento inquietante.

Quanto ao Presidente, contribuiu esta semana para cavar o fosso entre os cidadãos e a República com declarações do mais completo autismo social. Todos sabemos que Cavaco Silva ganha dez vezes mais que a média nacional. As suas poupanças, ontem publicadas, devem ultrapassar as de muitos jogadores de futebol de topo. Escusadas eram portanto palavras que o aparentam a um rei indiferente ao sofrimento e às privações do comum dos portugueses.

Acrescente-se porém que Cavaco chegou onde se encontra furtando-se a explicações quando qualquer outro se teria sentido forçado a dá-las. Entre os episódios mais recentes nunca cabalmente explicados há uma célebre excursão do seu assessor de sempre à Avenida de Roma e o papel dos seus amigos num banco falido. Por alguma razão o bolo-rei será o seu símbolo.

Quando nada se espera do Presidente ou do maior partido da oposição, resta aos cidadãos procurar outras formas de fazer ouvir a sua voz.

O mal de uns e o bem dos outros

  • «(...) as taxas de juro a dez anos [de Portugal] bateram hoje um novo recorde desde a entrada no euro – 14,8%. O mesmo aconteceu com os custos que os investidores pedem para comprar títulos a cinco anos, que está já em 19,1%. As taxas de juro da dívida a dois anos também estão a subir, rondando os 15,3% (...)» (Público, 25/1/2012)
  • «O Tesouro alemão financiou-se hoje em 2.458 milhões de euros, optando por não vender o montante máximo previsto (3.000 milhões de euros). O leilão contou com uma forte procura de 5.040 milhões de euros. Ou seja, com um rácio de 2,05, o dobro face à emissão anterior comparável, realizada a 12 de Outubro do ano passado. A maior economia da zona euro pagou ainda uma taxa média ponderada de 2,62%, o valor mais baixo na história em emissões de dívida a 30 anos (...)» (Económico, 25/1/2012)
Foi você quem pediu uma moeda única?

Olha que três


Vindo daqui.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Em defesa de Cavaco Silva

Não quis que Cavaco Silva fosse eleito, e apelei a que se votasse contra ele. Mas não vou assinar a petição que apela à sua demissão, nem considero que a mesma faz grande sentido.

Quando soube das notícias relativas às suas afirmações infelizes, também me indignou a desonestidade da omissão, e o alheamento da realidade do país. E por isso achei muito engraçadas as primeiras rábulas apelando à «solidariedade social» com a «situação de miséria» do presidente. Achei menos piada às segundas, e terceiras, mas compreendi que a situação estava «a pedir» tal sátira, e que era normal que a mesma ideia ocorresse a diferentes humoristas. Mas as rábulas continuaram... e continuaram... e continuaram... A piada sempre a mesma.

Depois soube da petição, e pouco depois da iniciativa de ir ao Palácio de Belém. E nesse momento, a obsessão com este momento menos feliz do Presidente já me começou a incomodar.

Incomodou-me porque está em risco a construção de uma nova PIDE e ninguém parece notar. Incomodou-me porque se delapidam os recursos do estado de forma pouco transparente ou assumidamente desonesta a uma velocidade avassaladora, e ninguém parece notar. Incomodou-me porque conhecemos mentiras bem mais sérias e substanciais que esta do presidente, e ninguém parece notar.

Faz mesmo sentido apelar à demissão de alguém por causa de umas declarações infelizes aos jornalistas, que nem sequer ocorreram no exercício das suas funções? Com tantos milhares de boas razões para apelar à demissão de tantos líderes políticos - é esta petição que faz notícia pela sua popularidade? Pode ser um indício de um protesto que começa a ultrapassar as instituições, como escreve o Ricardo Alves, mas é também um indício de como precisamos de um eleitorado mais atento e vigilante, que consiga separar o que é importante de fait divers acessórios.

Fico com vontade de dizer, e desta vez não é sátira nem ironia: tenham dó de Cavaco Silva.

Petição pela «demissão» do Presidente

A «Petição Pedido de Demissão do Presidente da República» certamente não será admissível a debate no Parlamento, ao contrário do que pretendem os seus promotores: só a renúncia ao mandato está prevista na Constituição. É no entanto um poderoso sinal político que, desde que foi lançada no sábado, tenha crescido até atingir, há poucos minutos, as vinte mil assinaturas (com BI). Há um protesto que começa a ultrapassar as instituições. (Em parte por culpa do PS, que não quer ser oposição.)

Ao serviço de Luanda?

Isto é preocupante: RDP acaba com espaço de opinião que serviu de palco a críticas duras a Angola.
Eis aqui o programa que alegadamente terá suscitado esta reacção.

Mais preocupante se torna este episódio se nos lembrarmos disto.

Será que estão a seguir uma estratégia baseada nas magníficas sugestões do João Duque?

A importância de uma cidadania atenta - II

Em resposta a apelos como os que fiz no texto anterior sobre este tema, muitas pessoas justificam o seu desinteresse por política com base na sua impotência. Não é apenas sentir que «os políticos são todos iguais», é sentir que o esforço todo de descobrir quais os mais honestos e competentes, quais as políticas que têm melhores e piores consequências, não justifica face à pequena diferença que um voto faz. E por um lado têm razão, mas por outro não têm nenhuma. Para que se compreenda o que estou a dizer, convido o leitor a fazer um exercício de imaginação.

Guimarães cidade quê?

Não existe documentação que demonstre a residência de Afonso Henriques em Guimarães. Pela documentação que nos chega até hoje o nascimento do nosso primeiro rei ocorreu muito provavelmente em Viseu ou nas suas imediações ("D. Afonso Henriques" de José Mattoso, Temas & Debates, pag. 25-27). Dona Teresa datou e assinou em Viseu vários documento antes e depois do nascimento de Afonso I. É pouco credível que uma mulher grávida na Idade Média se deslocasse 150 km a partir de Viseu para dar à luz em Guimarães e regressasse imediatamente a Viseu. A sede do poder do Condado de Portucalense foi transferida para Coimbra já durante a época do Conde D. Henrique, o pai do primeiro rei. Todos os actos de Afonso Henriques que estão na origem da transformação do Condado em Reino ocorrem tendo o Fundador já residência indubitável em Coimbra. Ler "D. Afonso Henriques" de José Mattoso, cap. VI pag. 105-111, sobre a importância histórica (palavras de José Mattoso) da localização da corte de Afonso I em Coimbra.

Perante factos e dúvidas, irrita as certezas que continuam a ser propagadas de que Guimarães é a "cidade berço". Certezas que não só contrariam a documentação analisada, como cada vez mais são difíceis de casar com os territórios de dúvida da biografia de Afonso Henriques. Este fim-de-semana por ocasião das comemorações de Guimarães Capital da Cultura, mais uma vez foi dado um péssimo exemplo a nível institucional ao continuar a alimentar-se a lenda da Guimarães Cidade Berço. É lamentável numa sociedade baseada no conhecimento que se continue a substituir o trabalho resultante da investigação cuidada da nossa história por lendas sentimentais.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

O próximo vice-governador europeu?

A acreditar nas sondagens que dão François Hollande 14% acima de Sarkozy numa segunda volta, o reinado de «Merkozy» termina em Maio.

Por inerência, o presidente da República francesa tornou-se, nos últimos anos, o vice-governador europeu. Sendo que, também por inerência e por sufrágio dos eleitores alemães, a real governadora europeia é a chanceler Merkel. Prevejo que dificilmente falaremos em «Merkollande» daqui por quatro meses. Porque o programa de Hollande parece pouco compatível com a orientação actual da UE. Vejamos: declara que o seu adversário principal é a finança, quer proibir «pura e simplesmente» produtos financeiros «sem ligação com a economia real», separar a banca de crédito e de especulação, propor uma taxa europeia sobre as transacções financeiras e ainda «re-industralizar a França». É tudo ao contrário da prática actual. Falta também saber que tipo de euro e de União Europeia existirá ainda em Maio...

Federação só para alguns

A União Europeia tem os defeitos de uma federação sem ter as suas virtudes, e o caso da Jerónimo Martins evidencia isso mesmo: numa federação normal como os EUA, há competição fiscal entre os Estados, mas também há agências federais que apoiam o desenvolvimento dos Estados mais pobres. A UE consegue ter impostos nacionais diferenciados sem um orçamento federal digno desse nome. Tudo o que se faça para tentar inverter esta situação será pouco.

Revista de imprensa (23/1/2012)

  • «O homem que inúmeras vezes apareceu perante os portugueses exigindo que se falasse verdade não falou verdade. O homem que afirmou solenemente que quem o acusava de condutas menos próprias na condução de alguns negócios particulares teria de nascer dez vezes para ser mais sério do que ele não foi sério. (...)
    O homem frontal, que faz gala de que a sua vida seja um livro aberto, omitiu. Omitiu ou disse uma meia-verdade, que como toda a gente sabe é sempre uma redonda mentira, quando, sem um pingo de vergonha, fingiu ter de livre e espontânea vontade prescindido do seu salário como Presidente da República. Todos nós sabemos que lhe estava vedado por lei acumular as suas pensões com esse salário. Decidiu omitir que a escolha que fez foi entre receber cerca de dez mil euros mensais das reformas ou aproximadamente sete mil de salário.

domingo, 22 de janeiro de 2012

Cavaco vaiado


Na abertura da «Guimarães Capital Europeia da Cultura», o presidente da República portuguesa foi vaiado (vídeo via João José Cardoso). O presidente da Comissão Europeia (e putativo candidato a presidente da República) também. Há uma certa ruptura entre os «de cima» e os «de baixo». Esperemos que alguém o compreenda.

O que o Álvaro escreveu

O livro "Portugal na Hora da Verdade - Como Vencer a Crise Nacional", escrito por Álvaro Santos Pereira, actual Ministro da Economia e do Emprego, tem uma página que merece especial destaque.

É a página número 511:


É engraçado como o discurso é diferente antes e depois de chegar ao poder...

sábado, 21 de janeiro de 2012

Crítica Injusta

Agora ninguém mais pode acusar o PS de ser «de direita quando está no governo, e de esquerda quando está na oposição».
Neste momento, em particular na resposta à mais recente desgraça concertação social, é difícil identificá-lo como um partido de esquerda. E consta que está na oposição (poucos diriam).

Também no Imprensa Falsa

A propósito da referência feita pelo Ricardo Alves, não resisto a colocar aqui também o cartoon no mesmo blogue a propósito da recente concertação social:


Revista de blogues (21/1/2012)

  • «A Presidência da República emitiu esta sexta-feira à noite uma nota a agradecer ao indivíduo que pagou um bolo de arroz e um sumo ao Presidente, depois de o encontrar em Santo Tirso, à porta de uma pastelaria.

    Cavaco estava apenas de passagem para uma inauguração, mas o indivíduo tinha acabado de ver nas notícias as declarações do Presidente, onde lamentou que o que ganha não chega para fazer face às despesas.

    «Tinha acabado de ver nas notícias e quando saio à rua, dou de caras com ele. Disse-lhe logo que dinheiro não dava, porque depois ele gastava tudo no BPN, mas aceitei pagar-lhe um bolo e um sumo», relata o indivíduo: «Os olhos do Presidente arregalaram e só me perguntou se o sumo podia ser néctar.»

    Na nota da Presidência da República pode ler-se que «o Presidente da República ficou muito comovido com a oferta daquele cidadão e com o tamanho do bolo de arroz, que chegou para a Primeira Dama».» (Imprensa Falsa)

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

A importância de uma cidadania atenta - I

Olhemos para o panorama político dos Estados Unidos da América. O que é que pensaria um eleitor de esquerda e de direita do facto do estado dar vários milhões em subsídios à indústria petrolífera?

O eleitor de esquerda seria claramente contra: afinal de contas, quando faltam recursos para as escolas, para os serviços públicos mais elementares, quando existem pessoas na miséria, estar a usar esses recursos para favorecer um conjunto de indústrias cuja actividade contribui para a degradação do meio ambiente é «juntar o insulto à injúria».

O eleitor de direita também seria claramente contra: com o país a endividar-se mais em cada ano, e sendo os impostos sobre os pequenos e grandes negócios a seu ver excessivos, seria ainda mais grave uma intervenção do estado na economia que inevitavelmente distorce o funcionamento do mercado livre.

Havendo uma posição comum por grande parte do eleitorado que ultrapassa o posicionamento ideológico, é expectável que num sistema democrático nem um tostão seja usado pelo estado para subsidiar as empresas petrolíferas, certo?
Errado: entre 78 e 150 mil milhões de dólares todos os anos são gastos em subsídios a esta indústria. Para dar uma ideia da dimensão do gasto, posso dizer que se poderiam construir todos os anos 15-30 aeroportos como o que tem dado tanta polémica cá em Portugal. Ou que o maior projecto científico internacional (que inclui aos EUA, a Europa, o Japão, a Coreia do Sul, a Rússia, a China e a Índia), também na área da energia, custará ao longo dos 30 anos estipulados (incluindo construção e operação) cerca de 15-7% desse valor, e existem dificuldades políticas fortes para manter o seu financiamento.

Por um lado, existe um consenso entre os eleitores que ultrapassa o posicionamento ideológico, e por outro lado um conjunto de políticas efectivamente seguidas que vai no sentido diametralmente oposto. Como explicar esta discrepância?

O que acontece é o seguinte: nos EUA uma empresa pode, legalmente, dar contribuições de campanha para as eleições individuais dos diferentes candidatos a membros da Câmara dos Representantes do Senado. Tomemos um congressista em particular, com vontade de ser reeleito: ele sabe que terá acesso a mais fundos para a sua campanha caso vote favoravelmente à criação/aumento de subsídios para estas empresas. Por outro lado, sabe que os eleitores atentos vão penalizá-lo nas urnas por tomar uma decisão que não os agrada. Se a sua preocupação exclusiva é a reeleição, ele terá de reflectir sobre o que é que lhe custa mais votos: abdicar de fundos de campanha que podem ser usados para comprar anúncios, cartazes, telefonemas, e outras ferramentas de persuasão que tais; ou abdicar directamente dos votos de eleitores atentos e informados que deixarão de votar nele por causa desta decisão.

Quanto maior for a proporção de eleitores atentos e informados, menos peso têm anúncios e cartazes, mais peso têm as decisões efectivas dos congressistas naquilo que são os seus resultados eleitorais. Mas esta proporção é tão baixa, que grande parte dos votos dos congressistas são contrários à vontade do seu eleitorado.

Seja nos EUA ou em Portugal, os grupos de interesse conseguem lucrar à custa do desinteresse dos cidadãos, prejudicando-os.

Por outro lado, se um político honesto defender o interesse comum dando menos importância às contribuições de campanha ou outro tipo de «ajudas» que os interesses privados podem propiciar, é num ambiente de eleitores informados e atentos que triunfa, e num ambiente de eleitores indiferentes e desinteressados que fracassa. Todos nós que criticamos os políticos profissionais temos de ter bem presente que se são desonestos e incompetentes a culpa é da falta de informação e interesse do eleitorado - é nossa.

O preço que um cidadão paga pelo seu desinteresse em política é elevado. Manifesta-se nestas questões concretas, e o seu alcance ultrapassa os aspectos financeiros: desde a economia, o emprego, a educação, a saúde até às liberdades fundamentais, se os cidadãos não se interessam acabam por sair derrotados.

Platão dizia «O preço que os homens bons pagam pela sua indiferença à política é serem governados por homens maus». Em diferentes sociedades no espaço e no tempo, se existe um sistema democrático, esta frase é verdadeira.

Não havia necessidade

De o PS votar a favor no voto de pesar pela morte de Fraga Iribarne.

Bendit vs Viktor Orban

Grande Bendit.


Dia 21 às 15h, no Marquês



É por estas mentiras e por muitas outras razões que estarei com os manifestantes este Sábado a partir das 15h no Marquês de Pombal.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

É evidente que a culpa é do senhor da esquerda


À esquerda na fotografia: não à esquerda em política. O dito senhor parece apostado em tudo para entrar num governo de coligação alargada com o seu amigo de juventude, parceiro de jantaradas e homólogo jotinha (o da direita), e arrastar para lá o partido que tristemente lidera. A sua "oposição" é a coisa mais patética que temos visto em Portugal: se queremos oposição vinda do PS, temos que contar com deputadas independentes. E agora temos este triste "acordo" de concertação social, que consagra a mais grave recessão social em décadas. Como bem nota o Pedro Viana, "é óbvio que João Proença, militante do PS, e a UGT, só se atreveriam a assinar este acordo se os dirigentes do PS lhes tivessem previamente assegurado que iriam efectivamente ficar calados perante a maior desregulação das relações laborais desde o 25 de Abril." Será que o PS quer ser mesmo oposição? Para onde vais, PS?

A UGT no seu labirinto ou o "mea culpa" dos dirigentes da CGTP

CGTP pondera processo-crime contra a UGT

«Levou o aceno para a modernidade»

Uma interessante sátira da Onion em relação ao «importante» papel dos monarcas nas democracias modernas:

            

A CGTP no seu labirinto

Segundo declarações de João Proença à Antena 1 - reproduzidas pelo Público - houve vários dirigentes comunistas de topo da CGTP que o incentivaram a permanecer nas negociações. Sendo que dificilmente o acordo poderia ter sido pior para os trabalhadores caso a CGTP não tivesse abandonado a concertação social, é difícil perceber como se pode achar que se ajuda os trabalhadores batendo com a porta reunião atrás de reunião, sem excepção. Aparentemente, há muita gente na CGTP a concordar comigo.
É um bom sinal e um mea culpa dos dirigentes, que talvez augure algo de bom para a renovação da direcção que se aproxima.

Olha, uma instituição que funciona

  • «A Comissão Nacional de Protecção de Dados notificou nesta quarta-feira a Optimus de uma multa elevada, que poderá ir até aos 7,5 milhões de euros, na sequência do caso do jornalista espiado pelos serviços secretos, noticia a edição online do “Expresso”.» (Público; também no Expresso)
E a Procuradoria Geral da República? Faz o quê?

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

O ministro do pastel

Num discurso memorável, Álvaro Santos Pereira apontou o pastel de nata como desígnio nacional. Estou com ele: a pastelaria lusitana é exportável e merece a internacionalização, dos ovos-moles de Aveiro aos fofos de Belas, passando pelos pastéis de Tentúgal e pelas pinhoadas de Grândola, sem esquecer os mil-folhas e ainda aqueles bolinhos algarvios com formas e cores engraçadas. Todavia, e fazendo um esforço para não ser injustamente satírico, tenho duas coisas a dizer ao ministro.

Primeiro, que a ideia geral é boa mas o exemplo é péssimo: a cadeia de frangos Nando’s, citada por ele como modelo de empreendedorismo português (emigrado), já comercializa o dito pastel, que aliás é bem vendido (por portugueses) nas maiores capitais europeias e gozou de várias campanhas promocionais.

Segundo, e embora nada me mova contra a nobre profissão de pasteleiro, que tantas pequenas alegrias gustativas me tem proporcionado na vida, a verdade é que a um país europeu se pede mais ambição. Vejamos: a Índia e a China, beneficiando de enormes mercados internos em expansão e de recursos naturais, apostam em software, energias renováveis e inovação científica e tecnológica. Álvaro, apoiado pelo próprio primeiro-ministro, propõe-nos a aposta no pastel de nata. E o crescimento de uma economia baseada essencialmente em pastéis de nata será, previsivelmente, um grande pastel.

Revista de imprensa (18-01-12)

O antigo secretário-geral da UGT Torres Couto considera que o acordo de Concertação Social que esta central sindical vai assinar hoje poderá ser a sua “certidão de óbito”, caso não haja contrapartidas para os trabalhadores para além das conhecidas.

Por seu lado, a antiga ministra do Trabalho Helena André lamenta que com este acordo se ponha fim à ideia de flexissegurança, que tinha sido uma das bandeiras dos governos PS de José Sócrates, enquanto Carvalho da Silva realça que o documento mostra que o Estado está apenas ao serviço dos empresários.

“Custa-me a aceitar que uma central sindical avalize um conjunto de medidas, todas elas viradas contra aqueles que representa”, disse Torres Couto ontem à tarde na TVI24. “Sempre tive a concepção de um acordo como um exercício de contrapartidas para todos os lados sentados numa mesa, anotou.

“Se efectivamente nas 50 páginas do acordo não houver contrapartidas específicas àquilo que foi noticiado como grandes consensos obtidos, penso estar mais perto da posição da CGTP do que da posição da central sindical que ajudei a fundar, disse ainda.

Para Torres Couto, a UGT ficará numa “situação extremamente delicada” caso haja “manchas alargadas de contestação nos locais de trabalho a este acordo”. “Poderá ser uma certidão de óbito para a central sindical”, avisou
.

Viva a República. Ou não?

O documento final da concertação social fala em «reduzir em três a quatro feriados». Como é matematicamente impossível que «três a quatro» seja entre três e quatro, deve ser «três ou quatro». Entretanto, os media diziam hoje de manhã que o 5 de Outubro se manteria como feriado. Logo, seriam três. Mas a ICAR reagiu com «ameaças» (sic): na perspectiva dos clericais, os feriados «religiosos» são deles e não da República (e parece que o 5 de Outubro lhes causa especial irritação...). Enfim, hoje à tarde o governo já mandou dizer que o número é par. Não se sabe é se é dois ou quatro. Sendo que dois não é incluído no acordo e quatro eliminaria também o 5 de Outubro. Ou não?

Fraga Iribarne

  1. Em 19 de Abril de 1963, ministro da informação, integrou o conselho de ministros que poderia ter perdoado a condenação à morte do comunista Julián Grimau. Votou a favor da morte e Grimau foi executado no dia seguinte.
  2. Em 1975, ministro do interior, declarou que as ruas eram dele («La calle es mía!»). No ano seguinte, a polícia carregou sobre grevistas em Vitória matando cinco e ferindo centenas, e olhou sem nada fazer durante o ataque terrorista à manifestação carlista de Montejurra.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Patriotismo é pedir recibo

Um país como o nosso que exporta tantos produtos interessantes (da cortiça ao vinho) e com qualidade, confesso que me dá asco essa conversa do "compre nacional". Se os outros países fizessem o mesmo íamos lavar os pés com vinho e deixar o CDS cortar rente os sobreiros que Nobre Guedes e Assunção Cristas pouparam. Separo esta questão do debate muito válido de taxar produtos em função da distância onde foram produzidos, por razões ecológicas.

Se quisermos ser uns grandes patriotas o melhor serviço que temos a fazer pelo país é pedir SEMPRE o recibo. Mas aí o patriota que há em nós perde logo a mesma garganta que se inflamou com o slogan "compre nacional". Em publicação recente, o Observatório de Economia e Gestão de Fraude estima em cerca de 42,7 mil milhões, ou 24,8% do PIB, o volume da economia paralela em 2010. A média estimada da economia paralela entre os países da OCDE é de 16,4 % do PIB. Se estas transações pagassem um imposto médio de 20% no nosso país, o défice em 2010 teria sido de 2,8% em vez de 8,6%. É esta a dimensão do roubo.

Como perder o combate contra o terrorismo

Na década desde o 11 de Setembro, muitos foram os que abandonaram a defesa dos Direitos do Homem para encontrarem desculpas para a invasão de privacidade, as detenções ilegais e a tortura. Moralmente, deram razão a Bin Laden e legitimaram-no. E a «eficácia» que alegavam para os seus métodos expeditos também impossibilitou que o combate às redes terroristas islamistas fosse, autenticamente, eficaz.

Demonstrou-se hoje, mais uma vez, que os que defendem a tortura e a ilegalidade são uns cretinos que, na realidade, ajudam e protegem os terroristas. E demonstrou-se porque o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem negou a extradição de Abu Qatada do Reino Unido para a Jordânia, com o límpido fundamento de que  o julgamento não seria justo pois utilizaria testemunhos obtidos sob tortura. Abu Qatada, palestino nascido na Jordânia, é considerado o «líder espiritual» da Al-Qaeda na Europa. Uma «espiritualidade» que inclui entusiasmar e recrutar jovens para o terrorismo. E continua sem ser julgado em tribunal, graças à «inteligência» daqueles que entenderam que para apanhar quem viola os Direitos do Homem era necessário... violar os Direitos do Homem.

O "Cinco Dias" já tem o seu Soares dos Santos

O grupo Jerónimo Martins, de Soares dos Santos, foge a pagar os impostos em Portugal. No Cinco Dias, pelos vistos, há quem concorde. É que não há diferença nenhuma entre a atitude de Soares dos Santos e a que Ricardo Santos Pinto propõe: só a escala de dinheiro envolvido. Mas o princípio é exatamente o mesmo. Depois de ter exportado um dos seus fundadores para o gabinete de Miguel Relvas, o Cinco Dias tem agora alguém que comunga as ideias sobre fiscalidade da direita mais liberal.
Tudo isto seria plausível se o Ricardo nos explicasse que modelo de sociedade defende sem o pagamento de impostos. Há quem o defenda, mas não trabalha para o estado como o Ricardo que, recorde-se, é professor do ensino público. Não sei de que disciplina, mas esperemos que não ensine aos seus alunos matérias como fiscalidade.
É claro que também gostaria que os meus impostos fossem melhor aplicados, por este e por todos os governos, e não me agradam nem um pouco as razões que o Ricardo invoca para boicotar o pagamento de IVA. Também não quero que o estado seja delapidado desta forma. Mas fugir aos impostos é justamente o que fazem (porque conseguem) muitos dos mais ricos. Se os mais pobres os imitarem, como sugere o Ricardo, o estado ficará de vez sem dinheiro nenhum. Nessa altura, os primeiros a serem prejudicados serão precisamente os mais pobres. Mas nada disto parece afetar o Ricardo, desde que ele receba sempre o seu salariozinho de professor. A única solução/proposta apresentada é "aprendam a ser justos. Aprendam a governar" (seja o que for que isto quer dizer). Enquanto não "aprenderem a governar", no entender do Ricardo, este professor do ensino público não paga IVA. Tudo isto seria cómico se não fosse tão português.

Que instituição escreveu isto?

«As such, we believe that a reform process based on a pillar of fiscal austerity alone risks becoming self-defeating, as domestic demand falls in line with consumers' rising concerns about job security and disposable incomes, eroding national tax revenues.»


segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

«Faz parte da vossa religião permitir que um homem e uma mulher se sentem juntos num café, por exemplo?»

Resposta: «não». Quem assim responde é porta-voz do partido Al-Nour - que teve uns 25% dos votos nas eleições parlamentares egípcias. Temia-se que a Irmandade Muçulmana ganhasse estas eleições. E ganhou-as, com uns 48% dos votos. Mas o Al-Nour foi a surpresa: com quase um em cada quatro dos votos expressos, surgiu como o segundo maior partido. Trata-se de um partido salafista, que pretende aplicar a chária à moda da Arábia Saudita. Ainda mais integrista, portanto, do que a Irmandade Muçulmana.

Este resultado não é mau, é péssimo. Se na Tunísia os islamistas venceram sem maioria absoluta, no Egipto terão dois terços dos deputados. E em Marrocos, o novo Primeiro Ministro é também um islamista. Num ano, passámos portanto da Primavera árabe ao Inverno islamista. Como diz o porta-voz que «tenta olhar para a cara [da jornalista] o menos possível» e promete mandar as mulheres para casa e os cristãos para o gueto: «chegou o tempo da verdade, e de mostrar aos outros o verdadeiro islão». Alá que os carregue.

[Esquerda Republicana/Diário Ateísta]

Sobre os mitos da Europa Social

Uma das críticas lançadas às políticas de austeridade em vigor por esta Europa fora é a de que estas representam um ataque à “Europa social” e ao “modelo social europeu”. Mas, a Europa social existiu alguma vez, ou trata-se dum mito?
Um livrinho recente de François Denord e Antoine Schwartz intitulado, L’Europe Social N’Aura Pas Lieu, responde a esta pergunta. Segundo os autores, os pais fundadores do projecto europeu – Richard Coudenhove-Kalergi, Jean Monnet, Paul-Henri Spaak, Robert Schuman, Robert Marjolin, Ludwig Erhard, etc - nunca tiveram a intenção de criar uma Europa social. Todos sem excepção eram liberais, e alguns deles eram discípulos da Sociedade de St Pèlerin, que congregava Ludwig von Mises e Friedrich von Hayek e que se concentrava em combater o avanço das doutrinas keynesianas. Todos tinham ligações fortes a Washington e a Wall Street. O seu projecto era o de criar um espaco de comércio-livre onde o mercado e os burocratas pudessem dominar, e sem empecilhos democráticos desnecessários. Sobre a Europa social pouco ou nada disseram.
Em 1943, Jean Monnet, que teve uma carreira de banqueiro de Wall Street muito bem sucedida antes de se tornar no “Pai da Europa”, tinha poucas dúvidas sobre as prioridades do projecto : « il est essentiel que soit empêchée dès l’origine la reconstitution des souverainetés économiques ». Em suma, o que importava era o bom funcionamento da mão invisível do mercado.
De resto, Monnet respondeu com algum mau-humor às acusações de que as novas comunidades europeias eram dirigistas: “Lisez le texte du traité et montrez-moi où se trouve le dirigisme dont on l’accuse (...). Le marché sera libre et les industriels seront ce qu’ils ne sont pas en ce moment: libres”.
Os « pais fundadores » podem não ter desejado a Europa social, mas não se pode dizer que não tenham pensado nos eventuais problemas que uma união monetária poderia trazer. Também em 1943, Hervé Alphand, um diplomata francês que foi conselheiro de De Gaulle no exílio (e amigo de Jean Monnet) concebeu um plano de união monetária da Europa. O dito não passava duns três ou quatro parágrafos mal-alinhavados, mas nestes vislumbra-se a filosofia que informa o Pacto de Estabilidade e os últimos « diktats » da dupla Merkozy. Hervé Alphond defendia a adopção duma política comum de finanças públicas e de crédito. Quanto a défices Alphond mostrou bem o que pensava do despesismo de Estado: « il n’est pas concevable qu’une expansion de crédit ou un déficit budgétaire dans l’un des États lui permette de prélever abusivement des richesses à l’intérier des autres États membres ». A Sra Merkel não o diria melhor.

O Estado Social e a Crise

Não, não é o estado social a causa da crise, relembra Krugman:


Pelo contrário, foi a desregulamentação das instituições financeiras que veio a provocar a crise de 2008, cujos efeitos incluem mas não se limitam a esta crise das dívidas soberanas. Por exemplo, o Canadá, com uma legislação de regulamentação das instituições financeiras saudável, resistiu muito melhor ao embate da crise.


domingo, 15 de janeiro de 2012

Uma lei que é um desastre

Muitas pessoas têm mostrado indignação face à proposta de lei que visa instituir taxas no equipamento electrónico para compensar os autores face às cópias privadas.

Ludwig Krippahl escreve:

«O Partido Socialista adiou por 15 dias a votação deste seu Projecto de Lei para a cópia privada. É uma boa oportunidade para pressionar os vários grupos parlamentares para que abortem este absurdo. Mais sobre isto: no blog do Rui Seabra, o texto do PL e algumas opiniões; da Paula Simões, o email aos grupos parlamentares e um post sobre estas taxas. Aqui podem ver como tem aumentado a capacidade dos discos rígidos, e extrapolar o custo desta lei para os próximos anos. E, da Jonasnuts, Para onde vai o dinheiro da Lei da Cópia Privada.

Aqui fica o email que eu enviei, e os endereços para quem quiser dar-lhes uma palavrinha também:

Grupo Parlamentar do Partido Socialista - gp_ps@ps.parlamento.pt
Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata – gp_psd@psd.parlamento.pt
Grupo Parlamentar do Partido Popular – gp_pp@pp.parlamento.pt
Grupo Parlamentar do Partido do Bloco de Esquerda – bloco.esquerda@be.parlamento.pt
Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português – gp_pcp@pcp.parlamento.pt
Grupo Parlamentar do Partido Ecologista “Os Verdes” – PEV.correio@pev.parlamento.pt


Exmos(as) Srs(as) Deputados(as) [do grupo parlamentar],

Venho por este meio pedir-vos que votem contra o Projecto de Lei 118/XII do Partido Socialista, que “Aprova o regime jurídico da Cópia Privada e altera o artigo 47.º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos Sétima alteração ao Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de Março.”

Este Projecto de Lei visa aplicar aos suportes digitais taxas de compensação pelo exercício do direito à cópia privada, tal como se faz com os suportes analógicos. No entanto, mantém a protecção legal dos sistemas de restrição de cópia (Digital Rights Management, DRM). Assim, seremos todos obrigados a pagar pelo direito à cópia privada de conteúdos digitais pela mesma lei que nos proíbe de os copiar sempre que as editoras assim entendam.

Este Projecto de Lei pretende “acompanhar a realidade e as incessantes inovações do mercado tecnológico”. No entanto, as taxas impostas são calculadas em função das capacidades do equipamento. Por exemplo, dois cêntimos por Gigabyte para um disco rígido. Esta formulação é precisamente o contrário do objectivo alegado. Na última década, a capacidade destes suportes aumentou cem vezes, para os mesmos preços. Se “a realidade e as incessantes inovações do mercado tecnológico” continuarem como até agora, daqui a dez anos o mesmo disco comprado em Portugal custará dezenas de vezes mais do que no resto da Europa, só por causa desta taxa. Como a compra online é outra inovação significativa do mercado tecnológico, o maior efeito deste Projecto de Lei será a destruição do mercado português destas tecnologias.

Este Projecto de Lei alega “reforçar o legítimo interesse dos diversos titulares de direitos”. No entanto, declara que “A compensação equitativa de autores, e de artistas, intérpretes ou executantes, é inalienável e irrenunciável”. Mas eu, enquanto autor deste texto, não quero cobrar nada pelo seu armazenamento. Não quero taxas pelas fotografias que tiro nas férias ou por guardar os filmes dos meus filhos. Não quero que a Associação para a Gestão da Cópia Privada cobre a quem armazene os textos que publico no meu blog, o software que escrevo ou o material de apoio às minhas aulas, que preparo e que disponibilizo aos meus alunos. Sinto que, ao contrário de reforçar os meus legítimos interesses enquanto autor, este Projecto de Lei está a violá-los em benefício de associações de cobrança com as quais nem tenho nem quero ter qualquer relação.

A crise que vivemos não é só económica. É também política, com os eleitores suspeitando cada vez mais que as leis são feitas segundo interesses de grupos bem posicionados e em detrimento dos cidadãos. O Projecto de Lei 118/XII do Partido Socialista é um exemplo claro deste problema. Ignora que esta tecnologia nos torna todos autores, em cada opinião que escrevemos, em cada comentário que fazemos, em cada fotografia que tiramos. E atropela direitos de todos nós só para fazer o jeito às organizações que o elaboraram. Não peço que votem contra este Projecto de Lei apenas pela taxa que me tentarão cobrar se o aprovarem, até porque, no máximo, só pagarei a mais a diferença nos portes de correio por comprar o equipamento a outro país. Preocupa-me o efeito que esta lei terá na nossa economia, mas nem sequer é a crise económica o que mais me motiva a escrever-vos. Pior ainda é a crise política. Por isso, peço que votem contra este Projecto de Lei, principalmente, para mostrar que as leis ainda são feitas no interesse de todos e não apenas para favorecer alguns.

Com os meus melhores cumprimentos,
Ludwig»

Naturalmente creio que esta indignação é mais do que justificada. A aprovação desta proposta de lei será um desastre: haverá menos receitas fiscais e menos negócio no que diz respeito à compra deste equipamento em Portugal, será um prejuízo acrescido para as empresas, pois agravará os custos de colocar informação na internet - não se pretende mais inovação?
E para quê? Para criar uma renda a um grupo de interesse (sim, o dinheiro não vai para os autores, mas sim para a estrutura que alega defender seus interesses), de uma forma exagerada que alia o disparate à ignorância - as taxas fixas, a existirem, deveriam estar indexadas ao custo e não ao espaço de memória, porque a variação do mesmo tem sido exponencial.
Esta lei é um perfeito desastre, e tanto quanto se sabe nenhum partido se opõe à sua aprovação.

sábado, 14 de janeiro de 2012

Mais sobre as 20h

Recentemente critiquei neste espaço uma notícia na Guardian que dava escassas informações sobre uma proposta - que me pareceu perniciosa porque exagerada - de reduzir a semana de trabalho para 20h.
Expliquei também porque considerava que a redução (moderada) das horas de trabalho me parecia uma medida no sentido correcto.

A mesma notícia é relatada pela revista i, mas de forma muito diferente:

«21 horas de trabalho pago por semana? Enquanto Portugal discute que se trabalhe meia hora a mais e por toda a Europa se fala em mudar as leis laborais, um think-tank chamado “The New Economics Foundation” organizou na London School of Economics uma conferência em defesa de uma ideia totalmente revolucionária: em nome do bem-estar da população, da diminuição da pobreza, da redução do consumo, da diminuição das emissões de dióxido de carbono ninguém deveria trabalhar mais de 21 horas por semana.

A conferência teve como base um estudo da “New Economics”. O relatório chama-se “21 horas”, mas os seus autores defendem que este número seja uma referência para “um banco de horas”.[...]

Robert Skidelski, um economista keynesiano que participou na conferência de ontem no Centro de Análise da Exclusão Social da London School of Economics, considera que o desenvolvimento da tecnologia vai diminuir o número de empregos a breve trecho. “A resposta civilizada é dividir o trabalho”, defende. Citada pelo “Guardian”, uma responsável do “New Economics”, Anna Coote, afirma que “não há prova de que com menos horas de trabalho as economias são menos bem sucedidas”. Os exemplos que dá são a Alemanha, a mais forte da economia da zona euro (cuja média semanal de horas de trabalho é das menores da zona euro) e a Holanda (outra economia forte, a que não corresponde um maior número de horas de trabalho).
[...]
Os autores do estudo assumem que “21 horas” não é uma receita, mas “uma provocação”: querem mudar os conceitos sobre tempo e trabalho e alterar o que é considerado “normal”. Têm consciência que uma semana de trabalho mais curta não é instituída de um dia para o outro (aconteceu na Inglaterra em 1974 porque não havia combustível), mas que é um bom princípio para a discussão de um modelo económico alternativo.»

A diferença entre os relatos começa logo no número de horas: 20h ou 21h? Enfim, pouco importa.

O que importa, e bastante, é o parágrafo final da notícia: os autores da proposta reconhecem o carácter excessivo da mesma. A proposta é feita como uma «provocação», uma forma de pôr as pessoas a pensar nos benefícios sociais da redução do número de horas de trabalho. É pena que a notícia na Guardian tenha omitido esta informação fundamental.

Creio que é uma provocação positiva, e este é mesmo um tema a debater. Face às recentes asneiras a este respeito, já tenho feito a minha parte.

Até a família usam

Segundo o Público, a pessoa da Optimus que passou a lista de chamadas do jornalista Nuno Simas para a quadrilha do SIED liderada por Silva Carvalho foi a mulher de um dos espiões. É com gente desta que estamos a lidar: capaz de instrumentalizar a própria família.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Nepotismo? O caso Braga de Macedo

No Arrastão o Daniel Oliveira denuncia:

«Sabemos que Braga de Macedo [...] é Presidente do Conselho Diretivo do Instituto de Investigação Científica Tropical (IICT). Não sabemos, nem em princípio teríamos nada que saber, que tem uma filha, Ana Macedo, que é artista plástica.

Ana Macedo fez, em Julho do ano passado (só agora tive acesso a essa informação) uma exposição em Maputo.[...]

Além do Instituto Camões, outra instituição do Estado apoiou o acontecimento. Sim, já adivinharam: o Instituto de Investigação Científica Tropical. O mesmíssimo que o pai da artista plástica dirige. Garante um português que vive em Maputo há quinze anos e que conhece bem a vida cultural da cidade que nunca o IICT patrocinou algum acontecimento cultural em Maputo.

Alertado por este post, fui investigar a coisa. Bataram uns telelefonemas e umas buscas na Net. Tudo é feito às claras, como se se tratasse da coisa mais natural do mundo. [...]

É natural que Braga de Macedo goste da sua filha e a tente ajudar na sua carreira. Assim fazem todos os pais. Não é natural que use os nossos recursos para o fazer. O IICT não lhe pertence nem é uma fundação ou empresa privada.É-me desconfortável falar da vida familiar de qualquer pessoa. Até porque odeio que falem da minha. Mas é quem usa o que é de todos para ajudar os seus que expõe a sua família ao escrutínio público. Faz mal duas vezes: a nós e a quem quer ajudar.

Caberá a Braga de Macedo explicar este comportamento eticamente inaceitável. Com que critérios usou dinheiros do Estado (pouco ou quase nada, tanto faz) para apoiar a carreira da sua própria filha? Como explica o mais despudorado dos nepotismo na gestão da coisa pública? E mais não digo, que começo a ficar cansado de tanto desplante.»

Não sei se esta história parece familiar ao leitor. A mim lembra-me um escândalo, no tempo do governo de Durão Barroso, que levou à demissão de dois ministros.
O pior é que hoje os escândalos se sucedem a uma velocidade tão vertiginosa, que nem parece ser possível a um cidadão crítico dar a este a importância que merece.

(Profundo bocejo)

Há coisas que nunca mudam. Por exemplo, a Madeira gastar demais e depois ameaçar com a independência.
Algum jornalista devia ir contar o número de vezes que os dirigentes do PSD-Madeira já ameaçaram com a independência. Ainda era puto quando começaram com esta treta. Hei-de chegar a avô e eles na mesma.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Revista de blogues (12/1/2012)

  • «Na La-La-land, os maus primeiro-ministros são tão maus, mas tão maus, que criam recessões mundiais.

    Na La-La-land, os bons primeiro-ministros são tão bons, mas tão bons, que mandam os seus cidadãos emigrar
    .

    Na La-La-land, os neo-liberais vendem propriedade do estado a estados comunistas e chamam ao resultado "privatização"
    .

    (...)

Ideias preliminares sobre a nova lei das rendas

aqui exprimi (e também noutros blogues) as minhas ideias sobre o mercado de arrendamento. É por isso com naturalidade que eu declaro que estou preocupado com a aplicação da nova lei prevista e as suas consequências sociais. De qualquer maneira, é totalmente distinto alguém aplaudir a nova lei por acreditar que esta trará rendas mais baratas para os jovens que queiram arrendar casa (uma questão de grande importância), como faz o Daniel Oliveira, de defender assanhada e militantemente o interesse dos senhorios, tornando-os uma nova "causa", como faz a Fernanda Câncio (sendo subscrita nessa defesa assanhada e militante, pelos vistos, pelo Ricardo Alves). Depois desta lei, que tão bem serve os interesses dos senhorios (que, desde que discuto este tema com a Fernanda, noto que são a principal preocupação dela) e da que se anuncia sobre a proibição total de fumar em espaços fechados, receio mesmo que a Fernanda, outrora vista como uma apoiante incondicional do governo de José Sócrates, se torne afinal numa apoiante... deste governo. Mas adiante. O que quero deixar claro é que quem acha que, para baixar as rendas para os jovens, é inevitável uma lei destas que defenda os senhorios, também deve achar que são inevitáveis o FMI e a troika. Quem acha que os interesses dos novos inquilinos são os mesmos interesses dos senhorios também só pode, na linha de Soares dos Santos e outros, achar que os interesses dos empresários são os interesses dos trabalhadores, e devem ser os patrões (e não os sindicatos) a falar por eles, como recentemente fez o grupo Jerónimo Martins. Voltarei a este assunto.

O aniversário da infâmia

Cumpriram-se ontem dez anos desde a abertura de Guantánamo. Dez anos em que uma democracia manteve fechados num campo de detenção, por vezes em condições de tortura, quase oitocentos indivíduos sobre os quais não há provas de terem cometido qualquer crime. Restam 171. E parece cada vez mais improvável que Obama encerre o campo da vergonha.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

A República e o secretismo

Liberdade inclui privacidade: o direito ao recato das nossas convicções, opiniões, paixões e desânimos, amizades e relações. Só somos realmente livres quando, podendo fazê-lo se quisermos, não somos forçados a dizer o que pensamos, o que somos, quem conhecemos e o que fazemos. Infelizmente, muitos parecem não entender assim: assiste-se a uma estranha caça às bruxas que já chegou à sugestão de que deveriam revelar a sua filiação maçónica os magistrados, e depois os políticos, e até os jornalistas. Ou mesmo todos.

Acontece que existem sempre segredos: dos indivíduos, das famílias, de associações mais ou menos formais e dos partidos políticos. E uma democracia decente não espreita pela fechadura da porta, não faz listas de quem frequenta o quê ou de quem pensa deste ou daquele modo. Essas são práticas mais próprias das ditaduras e das suas polícias secretas cuja sobrevivência em democracia é absurda. Porque uma sociedade civil forte tem necessariamente os seus fóruns de debate ou de aprendizagem, os seus clubes e sociedades (das quais as iniciáticas têm, redundância, segredos), mas não necessita que departamentos estatais, pagos pelos cidadãos e supostamente ao seu serviço, violem a sua privacidade ou lancem manobras mediáticas de contra-informação.

São serviços do Estado secretos e não fiscalizados que constituem um perigo para a liberdade.

Os fundos de pensões dos bancos

No seu blogue, Pedro Lains escreve:

«...os bancos transferiram o fundo de pensões para o Estado. O dinheiro entrou em 2011 e o défice com isso foi menor do que o "previsto". Mas agora é preciso pagar as pensões e isso não está no Orçamento de 2012, promulgado pelo Presidente da República. São 500 e tal milhões de euros a mais ou zero vírgula qualquer coisa do PIB. É preciso corrigir. Caro Vítor, no problem, dispõe, eu cá posso dar o ordenado das férias, que a gente cá em casa "ajusta-se" e, afinal, para quê receber num mês em que não se trabalha? Toda a gente se engana nestas coisas e percebemos. Se calhar estás com trabalho a mais. Mas tem vantagens, já que com a contracção expansionista quanto mais se contrair mais se expande, não é?
[...]
Entretanto, segundo os peritos, há uns dias, no "Jornal de Negócios", a operação de transferência de fundos é negativa para o Estado. Dois exemplos do que retive: presume uma capitalização da sua aplicação de 4%, em termos reais, em vez dos normais 2%; e a esperança de vida dos pensionistas é dada por uma tabela dos anos 1970, o que significa que o fundo "espera" que os pensionistas vivam menos do que agora as pessoas vivem em média. Para além disso, o montante de juros que se deixam de pagar pela amortização da dívida pública é inferior ao montante das transferências anuais para os pensionistas (o que ainda é mais extraordinário, atendendo ao custo médio a que a dívida portuguesa está), levando a um aumento do défice público. Genial.»

Mais tarde, Pedro Lains reforça:

«É preciso repetir várias vezes,  senão ninguém acredita mesmo: a transferência do fundo de pensões dos bancos para o Estado implica um aumento do défice público de 0,3% do PIB (aos níveis de 2012), cada ano, durante um prazo que não é conhecido. Por causa disso, todos os anos, o Estado gastará mais do que recebe um montante equivalente a 0,3% do PIB. Isso já tem em conta o desconto dos juros que não paga por ter entregado 6 mil milhões para amortizar parte da dívida pública e pagar dívidas correntes. Mas, entende-se bem? É que agora, a repetir isto, fico outra vez na dúvida se está certo. Sendo assim, se os fundos não tivessem sido transferidos ou tivessem sido transferidos em melhores condições, quantos cortes poderiam ter sido poupados, das pensões às taxas moderadoras, dos subsídios de emprego ao rendimento social? Fácil, o equivalente a 0,3% do PIB.»

Isto caracteriza perfeitamente as acções deste governo: agrava-se o problema estrutural para satisfazer necessidades políticas conjunturais (ou interesses privados inconfessáveis).
Em relação ao programa de privatizações, ainda estou para ver algum documento que compare as receitas de que o estado abdica com aquilo que é poupado em juros devido à amortização (isto sem sequer entrar em conta com a estimativa de perda de activos por efectuar as vendas num mau momento).
Mas, em relação a esta operação com os fundos de pensões, pelos vistos as contas estão feitas. E mesmo sendo feitas sob pressupostos irrealistas de tão favoráveis à decisão, a conclusão é clara: esta operação traz acrescidas dificuldades às situações orçamentais dos próximos anos. Corta-se na ciência, na saúde, nas apostas de futuro, para poder gastar desalmadamente nestes actos de má gestão.
Isto lembra-me a Manuela Ferreira Leite e os milhões que a sua decisão relativa ao Citygroup custou ao país.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Ed Miliband, e o capitalismo responsável

Como os gatos, Ed Miliband mostrou hoje ter várias vidas. Os media e a ala direita do Partido Trabalhista já lhe tinham escrito o seu obituário político, mas hoje “Red Ed” mostrou que sabe fazer ondas políticas e, que ainda tem, pelo menos, mais cinco vidas para gastar. Num discurso à organização London Citizens. Os media dizem que Miliband anunciou uma “nova direcção para o partido”, mas a verdade é que este discurso não é novo. Desde que foi eleito lider do partido em Setembro de 2010, a sua mensagem tem sido sempre a mesma (se bem que dita no seu tom nasalado que tem o condão de adormecer audiências). Em discurso após discurso, Miliband tem falado na necessidade de aprender as lições da recessão de 2007-08, de abandonar a ortodoxia neo-liberal que cegou o "New Labour" de Blair e de promover um “capitalismo responsável”, quer dizer, uma economia de mercado que promove a inovação, que cria emprego bem-pago e que se preocupa com as desigualdades sociais. Este "capitalismo responsável" passa ainda pelo combate ao "capitalismo predador", pela regulamentação dos serviços financeiros, e por uma política neo-Keynesiana de redução do défice (através de medidas que estimulem o crescimento económico, como investimentos em infra-estruturas, cortes no IVA, etc).
Mas então porque e que os "opinion-makers" que ditam a metereologia política falam numa "nova direcção"? É simples. O discurso de Miliband está finalmente a tornar-se "mainstream". Tão "mainstream" que até David Cameron – um dos afilhados de Thatcher que por agora governa o país – se juntou à cruzada de combate aos excessos da City e do "crony capitalism".

Sobre os cortes na ciência


Esta semana foram anunciados cortes de 39% no orçamento para 2012 da Fundação para a Ciência e a Tecnologia - instituição que tem a seu cargo a atribuição de bolsas individuais e de projetos científicos. Ao contrário do que foi anunciado estamos claramente perante um orçamento desadequado à continuidade de uma investigação de qualidade e em quantidade para responder às exigências das nossas empresas e da indústria nacional. Um orçamento tão reduzido limitar-se-á a financiar algumas ilhas que perderão a ligação aos restantes grupos de investigação perdendo-se massa crítica para concorrer a projetos internacionais e para manter a participação em instituições internacionais como o ESO, o CERN, a ESA ou o Acelerador Europeu de Sincrotrão. Desta forma, as consequências deste corte contrariam o apelo do governo a concorrer a projetos europeus para compensar a escassez de financiamento.

Os projetos europeus têm taxas de aprovação inferiores a 10%, onde primam centros de investigação dos países europeus de maior dimensão onde existem autênticas agências apenas dedicadas à redação dos extensos e herméticos formulários europeus de candidatura. Se esta é a via escolhida, então no mínimo o ministério deveria promover a criação de gabinetes dedicados à redação de projetos europeus. Com o amadorismo que reina na máquina burocrática da maior parte das nossas instituições muita investigação de qualidade ficará logo pelo caminho na altura do preenchimento do formulário.

O mais perturbador é a absoluta falta de estratégia do ministério num momento de profunda crise, momento em que a ciência poderia ser um dos principais motores para sair da crise. Enuncia-se como estratégia ministerial a promoção da excelência. Promover a excelência não é estratégia nenhuma em si, qualquer ministério da ciência sério procurará promover a excelência. Para onde vai a ciência nacional? Como a investigação realizada nas universidades poderá ser mais eficaz na sua ligação à sociedade e ao tecido empresarial? Qual a importância a dar à investigação fundamental e à inovação? Como promover a investigação nas empresas privadas? São questões que ficam sem resposta. Há uma abstração total do potencial científico do país, fica-se com a sensação que a investigação é um fardo para este governo e só não se desiste por completo de financiar a ciência porque isso teria repercussões internacionais sérias, inclusivamente no seio da comissão tripartida que nos está a emprestar dinheiro.
A governação do país vai numa direção e no meio científico cada um segue para seu lado, em passeio aleatório.