quinta-feira, 7 de junho de 2007

Os media e a “violência” dos “anarquistas”

Talvez por viver nos EUA num período particularmente infeliz da sua história – já se fala deste presidente como o pior de sempre: poluição, inflação, desemprego, concentração escandalosa da riqueza, aumento do número de pobres, atropelos à constituição, mentiras, invasões ilegais, tortura, incompetência, etc. – eu me tenha tornado tão cínico.

Mas acho que basta dar uma vista de olhos pelo site Media Matters” para se ter uma ideia sobre o que são os media hoje: uma máquina de propaganda das empresas que mandam no mundo.

Há muito que os políticos deixaram de contar. As pessoas sabem que o Belmiro manda muito mais que o Sócrates e não são as lamúrias ocasionais dos políticos que nos vão convencer a levá-los a sério. (ver, por exemplo o artigo de 1992 "Jihad vs. McWorld").

As polícias? Trabalham para os ministros, que trabalham para quem lhes paga as eleições e as férias, e lhes emprega os filhos e as noras: as empresas.

Neste contexto não compreendo que as pessoas embarquem na história da conspiração nihilista para destruir a ordem democrática, cada vez que os representantes dos 0,1% mais ricos do planeta se reunem para conspirar a sério contra nós, planear como é que nos vão roubar as pensões de reforma, a educação dos nossos filhos, o ambiente e a paz.

Claro que há-de haver sempre idiotas que aproveitam para vandalizar paredes e partir uma montra ou duas, mas idiotas há em todos os movimentos, políticos e apolíticos.

A história dos “anarquistas” é uma invenção. Como a história dos bébés no chão das enfermarias, no Koweit, ou a história das WMDs no Iraque, ou a história do salvamento da menina Jessica Lynch, ou da morte heróica do cabo Pat Tillman no Afeganistão, ou a crise da segurança social numa Europa 5 vezes mais rica do que era no tempo em a segurança social foi criada...

Acreditar que os 0.1% mais ricos do mundo não estão organizados para defender o que possuem com os meios que têm é quase infantil.

Em 2005 escrevi isto no meu blog sobre o memorando de Lewis Powell (1970):

Há muitos anos – nos anos 80 – ouvi Gore Vidal referir pela primeira vez este memorando e as consequências que ele trouxe para a ordem económica e política mundial.

Perante a revolta geral contra o capitalismo selvagem da Guerra Fria e os crimes perpetrados pelo governo americano em defesa dos interesses das grandes empresas na América Latina, a guerra do Vietnam, etc., a direita percebeu que a guerra ideológica podia estar perdida. Lewis Powell escreveu isto em 1970:

“The most disquieting voices joining the chorus of criticism come from perfectly respectable elements of society: from the college campus, the pulpit, the media, the intellectual and literary journals, the arts and sciences, and from politicians.”

Perante esta situação de descrédito geral da direita e do sistema capitalista o Juiz do Supremo Lewis Powell avançou propostas muito concretas no célebre memorando:

“Business pays hundreds of millions of dollars to the media for advertisements. Most of this supports specific products; much of it supports institutional image making; and some fraction of it does support the system. But the latter has been more or less tangential, and rarely part of a sustained, major effort to inform and enlighten the American people.”

ou

“Under our constitutional system, especially with an activist-minded Supreme Court, the judiciary may be the most important instrument for social, economic and political change.”

Vale a pena ler. E vale a pena ler o balanço feito 35 anos depois por George Lakoff da Universidade de Berkeley.

A resposta da direita foi incrivelmente eficaz: criaram-se fundações para financiar posições específicas para professores de direita nas melhores universidades, para financiar “think tanks” e especialistas de marketing, para financiar campanhas publicitárias, editoras, rádios, jornais e televisões. Pouco a pouco, utilizando técnicas de propaganda milenárias (repetição, “framing”, etc.), a direita foi acusando os campus universitários, as editoras, os jornalistas e os políticos de simpatias esquerdistas inaceitáveis e conquistando posições, uma após outra. Enquanto que o número de professores universitários de esquerda se mantem firme fora das escolas de economia e gestão, o número de jornalistas com cursos superiores diminuiu constantemete desde os anos setenta até hoje. Hoje seria impensável um escândalo como o de Watergate. Em vez disso, entre 1996 e 2000, assistimos ao escândalo inaudito da perseguição dos media ao presidente Clinton.

3 comentários:

  1. Isso pode ser tudo verdade, mas protestos como o de Seattle em 1999 só prejudicam quem se opõe a essas coisas.

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  2. OK, mas... :-) ...como dizia o camarada Mao, nao se deve acusar o rio de ser violento sem considerar as margens que o apertam!

    Vivemos num mundo muito violento, eles vendem-nos violencia no cinema, no telejornal, nos jogos de computador, nas lojas de armas, etc., e depois nao devem esperar que toda a gente se comporte como um grupo de meninas do Mira Rio na missa.

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  3. já venho um pouco tarde mas queria deixar a minha opinião.

    que os poderes se preocupem mais com o criticismo dos pares do que com as anarquistas compreende-se perfeitamente, esses senhores só devem ouvir falar em anarquistas nestas cimeiras do g8 e do wto.

    mas já não se pode dizer que o criticismo dos pares seja significativamente perturbador para o regime. juntando os dois ficamos com um "invadimos só o afeganistão ou invadimos o iraque também"? deve ser perturbador ter de tomar uma opção destas, mas só até à hora do jantar porque os prazeres da vida fazem esquecer os pequenos incómodos de um dia duro de trabalho.

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